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Contratos de infraestrutura terão metas claras no país, diz Banco Mundial

A aprovação do marco regulatório do saneamento básico e a votação da nova lei do gás, prevista para este mês, deverão impulsionar o setor

Obra de saneamento da empresa BRK na Grande Recife: aprovação do marco legal do setor deve atrair investimentos (Leo Caldas/Exame)
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Carla Aranha

Publicado em 17 de agosto de 2020 às 17h34.

Última atualização em 17 de agosto de 2020 às 18h01.

Há pelo menos 18 anos, o engenheiro ambiental Paul Procee se dedica a estudos mundiais sobre infraestrutura. No Banco Mundial desde 1999, onde atualmente exerce a função de gerente de operações para a Argentina, Procee liderou diversos projetos sobre saneamento básico , transporte e resíduos sólidos.

O executivo também é um dos autores do estudo “De volta ao planejamento: como reduzir as deficiências de infraestrutura no Brasil em tempos de austeridade”, do Banco Mundial, divulgado em 2017. Em entrevista à EXAME, Procee fala sobre os desafios e as oportunidades do desenvolvimento do setor de infraestrutura no Brasil, como mostra uma reportagem da última edição de EXAME.

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Existe uma relação direta entre investimentos em infraestrutura feitos de forma adequada, com governança, e geração de emprego? Por quê?

Certamente. Uma infraestrutura bem planejada inclui a avaliação e priorização de investimentos com base em seu impacto econômico, potencial de geração de emprego e melhoria na qualidade de vida. Não é uma simples questão de investir mais e sim de investir melhor. Via de regra, os impactos são maiores onde a população é maior e mais vulnerável e há carência de habitação e saneamento em áreas urbanas.

Mas há importantes investimentos em energia e transportes que podem ajudar a economia como um todo. Importante também é pensar além do investimento em infraestrutura, em sua manutenção e operação. Por isso, é tão importante pensar além do custo de investimento.

O que deu errado no Brasil em relação aos investimentos em infraestrutura, que não se revelaram muito produtivos?

Infelizmente, muitos dos investimentos no passado não tiveram o impacto previsto, por falta de recursos e capacidade para manutenção e operação que vem de uma governança adequada. No documento “De volta ao planejamento”, fazemos um apelo para que o Brasil volte a planejar todas as etapas do ciclo de vida da infraestrutura (avaliação e priorização, estruturação e construção, operação e manutenção) e assegure que tenha a capacidade humana e recursos financeiros necessários para cada etapa, sejam do setor público ou com participação do setor privado.

Países que conquistaram um expressivo crescimento econômico na última década, como a Coreia do Sul, optaram por criar programas de infraestrutura baseados na atração de investimentos privados? Como esses programas foram estruturados?

O crescimento na Coreia e em outros países asiáticos se deve a vários fatores. O mais importante foi o investimento em capital humano: educação. Quanto à infraestrutura, desde os anos 70 a Coréia desenvolve planos de longo prazo para melhorar a qualidade de vida dos seus cidadãos.

Também são importantes objetivos reduzir gargalos de desenvolvimento e investir em setores importantes da economia. Essa previsibilidade atraiu grandes investimentos privados e importantes regulamentos foram introduzidos para dar maior transparência e facilitar as parcerias público-privadas (PPPs) e concessões.

E como é o planejamento na Coreia?

Todo ano, o ministério da economia apresenta o plano diretor de PPPs que, para 2020, inclui 14,7 bilhões de dólares em projetos de infraestrutura com participação privada. Enquanto diferentes ministérios preparam e estruturam seus projetos, existe um comitê central que revisa os documentos e assegura qualidade e coerência nas propostas.

A Coreia, como basicamente todos os países desenvolvidos, não tem os recursos necessários para suprir toda a demanda em investimentos, operação e manutenção da infraestrutura do país. Mas o governo tem um papel fundamental no processo de priorização, contratação e supervisão de obras, sejam públicas ou com apoio privado.

Qual é a avaliação do Banco Mundial sobre a abertura do mercado de saneamento básico no Brasil e da produção e fornecimento de gás? Esses setores têm capacidade de atrair investimento internacional neste momento de maior liquidez global?

Não há como negar que a nova lei no de saneamento representa um avanço para a política pública brasileira, com relevantes impactos na saúde, no meio ambiente e em investimentos. Foram consolidados os instrumentos de concessão, de regulação, de compartilhamento dos serviços em bloco (por meio de consórcio, instituição de regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas), de incentivo a concessões e de estruturação de parcerias público-privadas – com remuneração garantida por tarifa.

A nova lei preserva aspectos importantes do modelo Planasa, da década de 70, baseados nos serviços regionais, que ganham em escala e equidade, e busca corrigir as falhas regulatórias e as lacunas de cobertura e investimentos, com atração do capital privado.

É importante frisar que os contratos com empresas públicas ou privadas deverão ter metas claras e regras de prestação dos serviços, tarifas e subsídios. Isso deve dar maior incentivo para melhora a qualidade dos serviços para o usuário.

Mas o mais importante continua sendo a capacidade de estruturação de projetos e de assegurar que não se privatize somente os blocos mais atrativos, nos centros urbanos com usuários mas afluentes, deixando de lado os mais problemáticos, como as áreas rurais para a gestão pública. Por isso, o planejamento estratégico é crítico. Em geral, o setor já apresenta um bom fluxo financeiro, estável a longo prazo, com baixos riscos de demanda.

Quais são as oportunidades para o setor de gás natural?

O potencial de ampliação do uso do gás natural como fonte energética mais limpa é enorme, para uso industrial, urbano e no setor de transportes. O Brasil reinjeta ou queima o gás não utilizado. Isso decorre de dois fatores associados: falta de infra de beneficiamento e transporte do gás, para que ele chegue aos centros de distribuição, e lacunas regulatórias importantes entre produção e distribuição.

Resolvido esse problema, haverá possibilidade de explorar a grande demanda energética associada ao gás, que permitirá redução dos custos de energia ao consumidor final e redução de custos e aumento de produtividade da economia. Há, assim, possibilidade de atrair investidores e operadores internacionais para expandir esse mercado, diversificando a matriz energética.

Quais são as maiores incertezas jurídicas das agências regulatórias no Brasil?

Como mencionamos no nosso relatório, as incertezas regulatórias podem aumentar significativamente a percepção de riscos e minar a viabilidade econômica de muitos projetos. Embora formalmente independentes, há evidências consideráveis de que as agências reguladoras vêm se politizando ao longo do tempo com nomeações de técnicos e diretores que carecem de qualificação para o cargo.

As nomeações para as agências atrasam vários anos, o que as impede de agir. Entre 2003 e 2010, as vagas superaram a marca de 55%. Como resultado, muitas agências passaram a operar rotineiramente sem uma diretoria completa, o que acabou por se tornar padrão no setor.

Houve interferência políticas nas agências reguladoras?

Sim. Isso afetou negativamente as percepções de risco do setor privado e elevou os custos dos projetos. Um exemplo disso foi verificado no setor elétrico em 2013, quando os operadores foram forçados a aceitar mudanças contratuais com o objetivo de reduzir tarifas e conter a inflação.

Os efeitos de tais decisões minam não somente o setor no qual elas são implementadas, mas também todos os outros setores, pois a confiança em arcabouços pré-estabelecidos é abalada. No setor de transportes, agências reguladoras diversas são responsáveis por diferentes modalidades, e a política regulatória carece de coerência intermodal.

 

 

 

 

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