Com estratégia de alto risco, PT mantém a candidatura de Lula
Favorito nas pesquisas presidenciais, o PT tem três meses até o início da campanha oficial para tentar tirar Lula da cadeia
AFP
Publicado em 13 de abril de 2018 às 09h34.
Lula está preso, mas o Partido dos Trabalhadores (PT) mantém sua candidatura à Presidência apesar de tudo, uma estratégia de alto risco que evidencia sua falta de opções reais.
Se este tema é debatido no âmbito do maior partido da esquerda latino-americana, só se sabe internamente.
Por enquanto, Luiz Inácio Lula da Silva continua sendo o favorito para vencer as eleições de outubro com 37% das intenções de voto, segundo a última pesquisa da Datafolha. E o PT multiplicou o apoio incondicional ao seu líder histórico.
O partido transferiu simbolicamente sua sede de São Paulo para Curitiba, onde o ex-presidente está preso desde 7 de abril, e todos os seus deputados adicionaram "Lula" aos seus nomes políticos para que apareçam nos painéis do Parlamento.
"Não temos plano B", admitiu esta semana a ex-presidente Dilma Rousseff, assegurando que se "lutará em todas as instâncias jurídicas para que Lula seja candidato".
O sociólogo Alberto Almeida, do Instituto Análise de São Paulo antecipa uma pré-campanha muito incomum.
"O partido tem três meses até a campanha oficial para tentar tirar Lula da cadeia. Acho que esse será o objetivo", disse.
Apesar da ameaça concreta de que Lula seja invalidado como candidato, "é muito difícil para o partido abrir mão de tamanha liderança. Nos últimos 20 anos, Lula foi o norte", avaliou Debora Messenberg, socióloga e cientista política da Universidade de Brasília.
Lincoln Secco, historiador da Universidade de São Paulo e autor do livro "História do PT", acrescenta: "Lula e o PT são inseparáveis".
"O partido usa uma estratégia correta: manter Lula candidato, mesmo preso. Como o partido não poderia afirmar que ele é um preso político?", questiona-se Secco. "Lula não teve um processo justo".
"Refém"
O PT escolheu capitalizar a ideia de um processo político e sobre a comoção em torno da sequência movimentada da entrega de Lula, que deixou o poder em 2010 com uma popularidade de 87% após oito anos de governo, mas que também fez muitos inimigos.
"Em certa forma, o PT é refém do Lula", avaliou o cientista político Paulo Moura.
"A mobilização do PT em torno de Lula é muito mais uma estratégia para tentar manter sua tropa ativa para sobreviver", disse. "Sem a expectativa de Lula candidato a base do PT se esfarela. É um beco sem saída porque preso Lula não poderá fazer campanha".
O ex-líder sindical de 72 anos continua sendo a personalidade proeminente da esquerda e longe de ungir um sucessor, teve o cuidado de não sugerir herdeiros.
Em seu último discurso em liberdade, em São Bernardo do Campo, "não deu atenção especial a nenhum possível candidato petista", mas "apontou Manuela D'Ávila [pré-candidata presidencial pelo PCdoB) e [Guilherme] Boulos [pré-candidato presidencial pelo PSOL] como candidatos para o futuro da esquerda", lembrou Secco.
"Com isso, ele mantém o partido unido na sua defesa e amplia a solidariedade a ele para o conjunto da esquerda", completou.
Apesar da derrota nas eleições municipais de 2016, após o impeachment de Dilma Rousseff, o partido cofundado por Lula ainda tem peso. Governa seis estados, incluindo Bahia e Minas Gerais, e conta com 2,2 milhões de afiliados.
No entanto, perdeu grande parte do brilho com o escândalo de compra de votos do "mensalão" (2005) e com as denúncias da Operação 'Lava Jato' (2014), que revelou um esquema de propinas envolvendo empresários e políticos de vários partidos.
Seu reduto é o nordeste e seu eleitorado inclui milhões de brasileiros que saíram da pobreza durante os dois mandatos de Lula, e um representativo grupo de intelectuais.
Um nome
"Não nenhum partido de esquerda que tenha a força eleitoral do PT, nem o tamanho da sua bancada", destaca a socióloga Messenberg.
Com 60 deputados, o partido deixa para trás inclusive os 56 do MDB do presidente Michel Temer.
Mas assim como a maioria dos analistas, Messenberg não acredita que Lula seja candidato. "O PT vai ter que ter algum outro nome nesse caldeirão até outubro".
O ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad não é uma unanimidade e a eventual candidatura do ex-ministro Jaques Wagner foi ofuscada por denúncias de corrupção.
E o que acontecerá quando a Justiça declarar Lula inelegível por ter uma condenação confirmada em segunda instância, como prevê a Lei da Ficha Limpa?
"Aí, sim, o PT terá um problema, que é a questão da transferência dos votos de Lula para outro candidato. Nada indica que isso dará certo", disse Secco.
Paulo Moura é ainda mais pessimista: "O PT está entrando em rota de decadência".