Azevedo admitiu que deixou cargo por pressão política sobre Forças Armadas
Fernando Azevedo e Silva admitiu a interlocutores que se sentia desconfortável no governo e havia uma pressão para maior envolvimento político das Forças Armadas
Reuters
Publicado em 30 de março de 2021 às 13h34.
Última atualização em 30 de março de 2021 às 16h28.
Demitido repentinamente pelo presidente Jair Bolsonaro , o agora ex-ministro da Defesa Fernando Azevedo e Silva admitiu a interlocutores que se sentia desconfortável no governo e havia uma pressão para maior envolvimento político das Forças Armadas, o que ele não permitiu e terminou por levar a seu afastamento, disseram à Reuters fontes que acompanharam as conversas.
Demitido no início da tarde de segunda-feira por Bolsonaro, Azevedo recebeu diversos telefonemas. Entre eles, do presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, e de pelo menos três outros ministros do STF, além de vários parlamentares. Em todos, a preocupação com possíveis riscos institucionais que poderiam vir das mudanças planejadas por Bolsonaro nas Forças Armadas.
De acordo com as fontes ouvidas pela Reuters, a avaliação do ex-ministro passada em suas conversas é que não há risco de instabilidade institucional e nem desejo do comando das forças em se envolver politicamente no governo. Para um dos interlocutores, considerando a conversa com o general, as forças "estão comprometidas com o estado democrático de direito".
Depois da conversa com o ex-ministro, segundo uma das fontes, Fux disse a interlocutores que "ficou mais tranquilo" e avaliou que há um "realinhamento político" do governo e não algo que crie preocupação sobre instabilidade institucional.
A pressão política, no entanto, existe e foi o que levou à saída de Azevedo. O próprio general revelou em suas conversas que se recusou a politizar as forças.
Os pedidos foram muitos e incluíram o pedido de Bolsonaro para trocar o comandante do Exército, general Edson Pujol, o que Azevedo sempre impediu. O presidente se irritava com a resistência do general em demonstrar apoio ao governo e, por mais de uma vez, reagiu mal a falas do comandante, que deixava claro não ver o Exército como parte da política.
A última delas, em novembro, foi uma das mais contundentes. Em uma fala durante uma live, Pujol deixou claro que o Exército não faria parte da política.
"Não queremos fazer parte da política governamental ou política do Congresso Nacional e muito menos queremos que a política entre no nosso quartel, dentro dos nossos quartéis. O fato de, eventualmente, militares serem chamados a assumir cargos no governo, é decisão exclusiva da administração do Executivo", afirmou.
O general acrescentou ainda que as Forças não são instituição de governo, mas de Estado, e não tem partido. "Não mudamos a cada quatro anos a nossa maneira de pensar e como cumprir nossas missões", disse.
Por mais de uma vez, Bolsonaro declarou que é "comandante supremo" das Forças Armadas, o que é um fato constitucional, mas várias vezes as chamou de suas, o que não é o caso. As Forças Armadas não são de um presidente ou governo, mas do Estado brasileiro, independentemente de quem seja o governante.
Mais recentemente, disse que não iria usar o que chamou de "meu Exército" para, por exemplo, reforçar políticas de lockdown nos Estados.
"O meu Exército não vai para a rua para cumprir decreto de governadores. Não vai. Se o povo começar a sair de casa, entrar na desobediência civil, não adianta pedir o Exército, porque meu Exército não vai. Nem por ordem do papa. Não vai", disse a apoiadores há cerca de 10 dias.
Na manhã desta terça, Azevedo se reuniu com os comandantes das três forças --além de Pujol, o comandantes da Marinha, Ilques Barbosa, e da Aeronáutica, Moretti Bermudez. Segundo uma das fontes, a tendência é que os três coloquem os cargos à disposição, mas não é certo que Bermudez e Barbosa saiam de fato. Já Pujol, sua saída é dada como certa.
Walter Braga Netto, que deixa a Casa Civil e assume a Defesa é, como Azevedo, um general de quatro estrelas da reserva, é respeitado nas tropas e um homem fiel aos princípios do Exército. No entanto, depois de ter ocupado um cargo político como a Casa Civil, é visto como mais alinhado ao bolsonarismo e bastante próximo ao presidente.
Ainda assim, de acordo com uma das fontes, a análise, inclusive no STF, é que o novo ministro não deve abrir caminho para "riscos institucionais".