Notebooks: o ponto sensível das compras públicas
Não são poucos os órgãos que fazem licitações para a compra de poucas unidades do computador móvel e os preços incrivelmente baixos geram dúvidas sobre a importação legal
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 12h35.
Entre os produtos mais vulneráveis à brecha da Lei nº 8.666 ( Clique aqui e veja a matéria na íntegra ), que rege as licitações no país, estão os importados de pequeno porte, como os notebooks.
Não são poucos os órgãos que fazem licitações para a compra de poucas unidades do computador móvel, e os preços incrivelmente baixos geram dúvidas sobre a importação legal. Como são produtos pequenos, fáceis de transportar e geram boa margem de lucro, tendem a entrar no país sem pagar impostos. Certas empresas entram na concorrência do governo, vencem com o menor preço e acabam repassando o equipamento que não teve a origem legal.
Alguns dos equipamentos que mais geram controvérsias nos pregões são os notebooks da marca Acer, que não tem operações no Brasil e atua exclusivamente por meio de distribuidores e revendas. Só no último trimestre de 2007 foram 92 000 equipamentos da marca comercializados no país, sendo que apenas 20% entraram por importação legal, segundo fontes de mercado. A prova disso, afirmam, está no preço das vendas, inclusive para o setor público.
Os tributos que incidem sobre as máquinas importadas são 23% de imposto de importação, frete e seguro, 9,25% de PIS/Cofins, 15% de IPI e mais o ICMS, que varia a cada estado. O modelo 3680 de notebook da Acer importado legalmente não deveria ter preço abaixo de 2200 reais, segundo consultores de tecnologia, mas algumas licitações absorvem o equipamento por cerca de 1500 reais.
Esse foi o caso da licitação realizada em novembro do ano passado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), que elegeu como vencedora a empresa que ofereceu 200 desses notebooks ao preço de 1490 reais. A Icompar Informática, que venceu a licitação, informou a EXAME, que naquele momento foi possível chegar ao preço inferior em virtude da cotação do dólar - na casa de 1,75 reais - e da taxa de ICMS de 7% que paga no estado do Paraná, onde está sediada. Um executivo do ramo de PCs que prefere não se identificar contesta a versão: "esse preço seria impossível de praticar naquela época para esse equipamento com fabricação local, quanto mais importando".
Segundo Flávio Zanette, pró-reitor de administração da UFPR, a universidade segue estritamente as determinações da lei e concede a vitória na licitação ao fornecedor de menor preço. "Eventuais reclamações de irregularidade devem ir a Brasília para avaliação rigorosa. Aqui seguimos a lei ao pé da letra", relata.
A Lei nº 8.666 tem caráter nacional e alguns itens são padronizados para estados e municípios, o que significa que o problema não é exclusividade federal. No entanto, cada cidade ou estado também pode estabelecer critérios adicionais para suas compras. O estado de São Paulo, por exemplo, exige um selo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) dos fornecedores de madeira, como forma de certificar a origem do material procedente da Amazônia.
Segundo Daniel Engel, especialista em direito público do escritório Felsberg e Associados, existem algumas alternativas para resolver o problema de brecha na lei de licitações. Um deles seria o redator do edital exigir algum certificado de origem - como comprovante do recolhimento dos tributos, quando ocorrer a fabricação local, ou a guia de importação - de todos as empresas que pretendem participar da licitação, ou exigir que a vencedora apresente o documento após o término do pregão.
O Banco do Brasil é um exemplo disso. Em todas as licitações para equipamentos que exijam garantia, a instituição solicita uma carta do fabricante atestando que a empresa vencedora vá cumprir a entrega dos equipamentos e os serviços de pós-venda. Na semana passada, durante o pregão 8073 - que licitou 314 projetores de imagens, entre outros produtos -, a primeira colocada na tomada de preços, a gaúcha Daycomp Informática, desistiu da licitação por não conseguir o documento da fabricante Epson. Segundo João Valenti, gerente de licitações, a empresa chegou a procurar outros fabricantes que poderiam fornecer a carta, mas eles não chegaram ao preço de 1370 reais que a Daycomp havia registrado. A Epson explica que se recusou a fornecer o equipamento porque não reconhece a empresa como revenda oficial.
O mercado de notebooks no Brasil atingiu a marca de 664 mil unidades vendidas nos primeiros três meses do ano, crescimento de 165% sobre o ano passado, segundo dados da consultoria IT Data. Desse total, 34% pertenceram ao mercado ilegal.