Exame Logo

"Jobs é um maestro", diz jornalista especializado em Apple

Há mais de uma década, o jornalista inglês Leander Kahney cobre as atividades da Apple para revistas de tecnologia. Já escreveu um livro sobre iPod, outro sobre o Mac e o mais recente é um misto de biografia e manual de liderança sobre Steve Jobs. Em entrevista a EXAME, Kahney falou sobre a identificação de […]

EXAME.com (EXAME.com)
DR

Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 12h22.

Há mais de uma década, o jornalista inglês Leander Kahney cobre as atividades da Apple para revistas de tecnologia. Já escreveu um livro sobre iPod, outro sobre o Mac e o mais recente é um misto de biografia e manual de liderança sobre Steve Jobs. Em entrevista a EXAME, Kahney falou sobre a identificação de Jobs com a companhia, os bastidores das invenções da Apple e possíveis sucessores. Ele diz que Jobs é fundamental para a empresa, para conduzir as inovações, mas as criações não dependem exclusivamente dele. Veja abaixo alguns trechos da entrevista.

Como as pessoas receberam as reportagens sobre a saúde de Jobs no Vale do Silício?

Todo mundo fala sobre isso, mas as pessoas basearam suas observações no fato de Jobs não ter participado de uma conference call com analistas no final de julho. A questão é que Jobs não costuma participar. Talvez tenha participado três vezes nos últimos 11 anos. Ele só vai quando há más notícias. A preocupação com Jobs também se dá pelo fato de que ele aparece pouco em público. Então, se há uma mudança em sua aparência, todo mundo percebe e é dramática. Além disso, a imagem de Jobs está muito ligada à empresa. Não há nenhuma outra empresa tão alinhada com seu CEO.

Veja também

A imagem de Steve Jobs está muito ligada à da Apple, mas quanto das decisões da empresa são feitas por ele?

Jobs se envolve em tudo. Coloca a mão na massa mesmo. Ele está interessado em desenvolver produtos novos. Envolve-se muito com isso e com questões de design e usabilidade. Mas é claro que ele não pode fazer tudo, nem consegue ver tudo que a empresa faz. Isso fica claro quando se vê as mudanças na Apple. A empresa costumava ter um número pequeno de produtos. Quando Jobs voltou, em 1997, ele cortou o portfólio para quatro produtos, depois veio o iPod, com diferentes modelos, o iPhone e agora a AppleTv. Eles estão com uma linha de modelos mais complexa do que costumavam ter, com mais produtos. Jobs não pode dar a mesma atenção que dava. Ele agora usa seu tempo para novos produtos. A Apple vai lançar produtos no final do ano e é nisso que Jobs deve trabalhar agora.

A idéia de criar um produto novo é sempre de Jobs?

Essas idéias vêm de processos que eles têm na empresa. Eles estão sempre fazendo experimentações de novas tecnologias, estão sempre construindo coisas novas nos laboratórios. O caso do iPhone é um deles. Era óbvio que o iPod ia se tornar o iPhone. Então, a equipe de desenvolvimento construiu dezenas de celulares que fossem como iPods até que um pessoa viu que um dos projetos de tela sensível a toque para um PC de bolso seria ótimo para um telefone. Para descobrir um produto, eles constroem centenas de protótipos. Não chegam com a idéia num guardanapo. Eles descobrem essas coisas enquanto trabalham em cima delas. É um grupo de pessoas, de mais ou menos 100 pessoas. Os designers trabalham com as pessoas de software e com os responsáveis pelo marketing e Steve Jobs, claro.

Mas a decisão final sobre o que é escolhido é de Steve Jobs, não?

Sim, mas é também uma decisão de grupo. Ele é como um maestro de uma orquestra. Então, mesmo que ele tenha a palavra final, e seja a pessoa principal nas salas de reunião, eles discutem e debatem sobre tudo. Eles debatem sobre os anúncios, os produtos e até sobre o número de parafusos de um equipamento.

Esses grupos trabalham juntos?

A maior parte do trabalho deles é compartimentada. As pessoas de software não sabem o que as pessoas de hardware estão fazendo e vice-versa. É assim que eles mantêm segredo sobre o que a empresa faz. Só o pequeno grupo de 100 pessoas, os chefes das equipes, sabe o que está acontecendo. Eles são os únicos que conseguem ter uma espécie de panorama das atividades da empresa.

Se Steve Jobs precisar se afastar do trabalho diário na Apple, por algum problema de saúde, a empresa vai continuar a andar bem?

Acredito que sim, mas essa é uma pergunta difícil de responder. A empresa só teve sucesso depois que Jobs voltou [Steve Jobs saiu em 1985, por desavenças com o então CEO, e voltou em 1997, quando a Apple estava combalida]. Mas ele conseguiu transformar traços pessoais em processos de negócios na Apple. Quando ele foi submetido à cirurgia para retirar o câncer em 2004, ficou afastado do trabalho por dois meses, mas a empresa continuou a funcionar numa boa, ninguém percebeu que ele estava fora. Se ele sair da companhia, a Apple vai continuar bem por um tempo. O problema é que eles vão ter um novo CEO, com novas idéias e ele pode estragar tudo que já foi feito. Eles têm boas pessoas na empresa, vão ficar bem, mas com um novo presidente, o rumo pode mudar.

Quem poderia ser o novo CEO?

Tim Cook (o COO) é um dos nomes. Ele está muito ligado ao sucesso da empresa e está lá há alguns anos, trabalhando silenciosamente nos bastidores. Ele ajudou a criar uma operação de produção muito eficiente e, mesmo com a recente falta de iPhones, o processo de produção é muito bom. Ele cuida do dia-a-dia da operação de fornecimento. Ele é um candidato, mas não tem destaque tão grande quanto Jobs, nem é tão conhecido. Também se fala de Jonathan Ive (responsável por design), mas ele é muito calado e está prestes a se aposentar. Não se sabe se ele ficaria. Um outro possível candidato era Jon Rubinstein, que agora está na Palm. Ele é uma espécie de gênio, responsável pelo iPod, pelo iMac e várias outras coisas.

Eles têm personalidades muito diferentes de Jobs?

Sim, muito diferentes. Steve Jobs tem uma reputação de gritar muito, de berrar, e não acredito que Jonathan Ive tenha gritado com alguém alguma vez em sua vida. Ele é muito calado, muito tímido. Mas claramente ele é capaz de trabalhar numa organização do porte da Apple. A verdade é que a reputação de Jobs como o cara que sempre grita é exagerada. Ele não faz isso sempre. A paixão dele pelo trabalho é mais importante do que a intimidação. Ele é tão apaixonado pelo que faz que as pessoas ficam muito entusiasmadas em trabalhar para ele, da melhor forma que podem.

Há vários nomes sendo cogitados, mas Jobs fez algum plano de sucessão depois da cirurgia de 2004?

Jobs disse que a Apple pensa sempre sobre isso e que tem alguns candidatos, mas é algo que não convence ninguém. Ele nunca anunciou oficialmente um plano de sucessão, e eles ainda não nomearam alguém publicamente. Também não ouvi nada de fontes na empresa.

A cultura de segredo da Apple é uma característica de Jobs ou já era comum enquanto ele estava fora?

Da forma que é hoje, é uma cultura de Steve Jobs. Claro que o Vale do Silício é um lugar de muitos segredos, isso não é exclusividade da Apple. Várias empresas mantêm silêncio sobre seu trabalho e fazem acordos para que informações não sejam divulgadas. Afinal, há espionagem industrial no Vale. Mas a Apple levou essa cultura a um nível diferente. A operação em células, em que se separa a área de desenvolvimento de hardware, da área de software, é uma forma muito rigorosa de manter segredo. E isso tem resultado. Com o tamanho que a empresa tem, com o número de produtos que faz e o tempo que eles levam para chegar ao mercado, é incrível que vaze tão pouca informação.

Steve Jobs vai precisar agora de um plano de sucessão mais aberto?

Tudo na Apple é tão bem planejado e Steve Jobs está sempre tão antecipado, que ele já deve ter pensado no plano de sucessão. A não ser que ele esteja muito confiante de que está saudável. Acredito que o fato de que não há um plano conhecido pode ser uma dica de que ele está bem. Não sei se isso é convincente, até porque ele mantém muitas informações em sigilo.

Acompanhe tudo sobre:[]

Mais lidas

exame no whatsapp

Receba as noticias da Exame no seu WhatsApp

Inscreva-se

Mais de Tecnologia

Mais na Exame