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Barco robô já é uma realidade

John Markoff © 2016 New York Times News Service Alameda, Califórnia – Dois veleiros robóticos traçam caminhos como se fossem cortadores de grama pela superfície violenta do Mar de Bering, na costa do Alasca. Os barcos estão contando peixes – badejos do Alasca, para ser mais específico – com uma versão sofisticada de um sonar localizador […]

RICHARD JENKINS: CEO da Saildrone, empresa que criou barcos autônomos nos EUA / Jason Henry/ The New York Times
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Da Redação

Publicado em 21 de setembro de 2016 às 16h30.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h37.

John Markoff © 2016 New York Times News Service

Alameda, Califórnia – Dois veleiros robóticos traçam caminhos como se fossem cortadores de grama pela superfície violenta do Mar de Bering, na costa do Alasca. Os barcos estão contando peixes – badejos do Alasca, para ser mais específico – com uma versão sofisticada de um sonar localizador de cardumes que poderia ser encontrado em um barco de pesca.

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A cerca de quatro mil quilômetros de distância, o engenheiro mecânico e aventureiro Richard Jenkins acompanha os barcos robôs em uma grande tela de projeção instalada em um velho hangar que fez parte da Estação Aérea Naval Alameda. Agora, o hangar é o centro de comando de uma pequena empresa chamada Saildrone.

Pelo menos 20 companhias estão atrás do sonho possivelmente quixotesco de produzir um carro que funcione sem motorista no Vale do Silício. Mas barcos autopilotados já estão funcionando.

Enquanto contam os peixes, os barcos da Saildrone também monitoram as focas que se alimentam deles, acompanhando transmissores que os cientistas colocaram em suas cabeças.

“Podemos dizer que tamanho de peixe estão comendo e por que estão indo para lá”, afirma Jenkins, executivo-chefe e um dos fundadores da empresa.

No verão passado, trabalhando com cientistas e engenheiros da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA), os barcos navegaram ao longo das bordas da capota polar que está diminuindo no Ártico, dando aos pesquisadores um relato detalhado sobre a temperatura, a salinidade e o ecossistema, informações que teriam sido difíceis e caras de conseguir enviando pessoas ao local.

Os barcos autônomos da Saildrone parecem versões menores dos iates de corrida da America’s Cup – pequenos trimarãs com velas duras de fibra de carbono.

As velas de fibra de carbono do Saildrone agem como uma asa de avião. Quando o ar passa sobre elas, cria impulso. A vela é estabilizada por um contrapeso colocado na sua frente e por uma alça na parte de trás que pode fazer pequenas correções automaticamente para garantir que se mantenha em um ângulo eficiente em relação ao vento. Sob o barco, há um leme, para ajudar na direção, e uma quilha, que endireita o veleiro se ele virar.

A grande diferença, claro, é que não há marinheiros a bordo. Os barcos são controlados por meio de satélites de comunicação a partir da central de operação em Alameda, enquanto coletam dados oceanográficos e monitoram cardumes e o meio ambiente.

Um dia, poderão ser usados para a previsão do tempo, operações da indústria de petróleo e gás no oceano ou mesmo para fiscalização da pesca ilegal.

Jenkins tem uma visão muito mais ampla. Ele acredita que as informações científicas são a peça que falta no quebra-cabeça para compreender definitivamente as consequências do aquecimento global. Ele imagina uma frota de milhares ou mesmo dezenas de milhares de seus barcos de sete metros criando uma rede de sensores por todos os oceanos do mundo.

Grandes quantidades de informações coletadas por seus robôs tem o poder de relevar com mais detalhes a extensão e a velocidade em que o aquecimento global pode se tornar uma ameaça à humanidade e se isso vai acontecer em décadas e não em séculos.

Isso, se alguém estiver disposto a pagar por todas essas informações. Cientistas, pescadores comerciais e meteorologistas pagam uma taxa de US$ 2.500 por dia/barco pelos dados que produzem.

A Saildrone começou com US$ 2,5 milhões de financiamento de Eric Schmidt, presidente executivo do Google, e sua mulher, Wendy Schmidt. E a empresa de Jenkins recentemente recebeu US$ 14 milhões extras de três companhias de capital de risco socialmente conscientes: a Social Capital, a Lux e a Capricorn.

“Meu interesse na Saildrone é muito prático”, afirma Chamath Palihapitiya, ex-executivo do Facebook e fundador da Social Capital. “Vamos parar de discutir sobre o que está acontecendo e vamos medir. Assim que você tiver dados e eles forem estatisticamente significativos e válidos, poderemos dar o próximo passo, que é descobrir quais as reformas estruturais que precisam acontecer.”

Cada barco possui um arsenal de sensores científicos que transferem dados para o centro de controle.

“Não é exatamente tirar a temperatura da Terra, mas sim checar a sua pulsação”, compara Jenkins, de 39 anos, engenheiro mecânico de cabelo despenteado que estudou no Imperial College London.

Ele encontrou seus ávidos clientes entre oceanógrafos e engenheiros que antes possuíam meios limitados de coletar informações específicas e precisas sobre a superfície do oceano.

“O Richard tinha um grande barco, mas não havia sensores científicos nele, e nós tínhamos os sensores, mas não possuíamos o barco”, explica Christian Meinig, diretor de engenharia do NOAA Pacific Marine Environmental Laboratory. Os cientistas do laboratório começaram a usar os barcos para melhorar seus estudos sobre o padrão de águas quentes do El Ninõ no Oceano Pacífico.

A inovação que deu origem aos robôs foi um barco que Jenkins começou a imaginar quando passou a perseguir o recorde mundial de velocidade de land-sailing (uma espécie de veleiro com rodas para andar na terra) em 1999. Ele alcançou o sucesso em 2009 com um “iate terrestre” chamado Greenbird, que chegou à velocidade de 203,1 quilômetros por hora no leito seco de um lago no sul da Califórnia.

Para chegar a uma velocidade tão alta e permanecer estável, Jenkins substituiu a vela tradicional do barco por uma asa rígida, de fibra de carbono vertical, com um estabilizador único acoplado na parte de trás que ajusta a asa de modo automático, mais rapidamente do que um navegador humano conseguiria puxando cordas.

Ele redefiniu a asa para navegar a velocidades mais baixas e para viajar de modo autônomo para qualquer lugar do mundo. No ano passado, em uma experiência, um dos barcos da Saildrone fez o caminho entre Alameda e o Equador em 42 dias, coletando uma grande quantidade de dados sobre a superfície do oceano no percurso. Um navio de investigação científica com uma grande tripulação humana a bordo seria mais rápido, mas custaria cerca de US$ 80 mil por dia.

O fato de os pesquisadores poderem mover os barcos autônomos – ao contrário das boias estáticas que são tipicamente usadas nos oceanos – é significativo porque permite que alterem o padrão de recolhimento de dados em resposta às condições do oceano e a descobertas interessantes.

“Um modelo que se autocorrige é realmente uma maneira muito poderosa de fazer essas coisas”, afirma o oceanógrafo Christopher Sabine, diretor do Pacific Marine Environmental Laboratory. “Os modelos climáticos exigem que saibamos o que está acontecendo durante o ano todo e, para ser muito honesto, não gostamos de sair no meio do inverno.”

A Saildrone não é a única empresa com veículos autônomos no mar. A Liquid Robotics, de Sunnyvale, na Califórnia, faz um barco chamado Wave Glider, que usa a ação das ondas ao invés do vento para se mover a mais de dois nós e carregar até 45 quilos de instrumentos.

A carga útil do Saildrone é mais do que o dobro disso, e seus barcos são potencialmente duas vezes mais rápidos. O conjunto de sensores é feito com mais de uma dúzia de instrumentos que capturam a velocidade dos ventos, a radiação, imagens paradas e vídeos, a temperatura, a química das águas e outras informações.

Jenkins acredita que uma frota de robôs com sensores espalhados por um oceano como o Pacífico vai mudar muito a previsão do tempo e do clima. Um entendimento mais aprofundado de um fenômeno como o El Ninõ, por exemplo, poderia fazer a diferença que vale centenas de milhões de dólares.

“Eles falharam completamente na hora de prever o último”, diz, afirmando que os cientistas do clima reconheceram que não possuem a resolução espacial necessária para fazer previsões precisas. “Eles têm uma necessidade premente de mais dados.”

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