Tenda: acionistas não tiveram direito ao tag along (.)
Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h34.
Manhã de terça-feira, 20 de janeiro de 2009. Após muitas idas e vindas, a VCP (Votorantim Celulose e Papel) confirma a compra das ações da Aracruz pertencentes às famílias Lorentzen, Moreira Salles e Almeida Braga e passa a deter 56% da maior produtora de celulose de eucalipto do mundo. Em minutos, a notícia se espalha e faz dobrar o valor da ação ordinária da Aracruz (ARCZ3) logo na abertura do pregão.
A cena não é inédita no mercado acionário. Com diferentes protagonistas, o roteiro volta e meia se repete. Fusões e aquisições costumam ser motivo de alvoroço na bolsa, não só pela mudança nos negócios das empresas, mas principalmente pelo potencial de ganhos que geram. Apenas nos últimos 12 meses, ao menos sete grandes operações foram fechadas (veja abaixo) e, em cinco delas, as ações das companhias envolvidas dispararam. A corrida, na maior parte das vezes, é justificada pela expectativa de tag along, direito que os minoritários têm de vender suas ações ordinárias por, no mínimo, 80% do valor pago aos acionistas controladores quando há troca de controle da companhia. Geralmente, isso garante aos investidores bons lucros em pouco tempo, mas nem sempre é sinônimo de alto retorno.
Quem aplica em ações com a perspectiva de lucrar no curto prazo em decorrência de uma fusão ou aquisição também está sujeito a perdas. Há casos em que a operação leva meses para sair ou nem chega a se concretizar - como aconteceu recentemente com Agra e Cyrela.
Quando o mercado passou a suspeitar que a Cyrela poderia comprar a concorrente, as ações da Agra deram um pinote, saltando 44% em apenas quatro dias. A aquisição foi anunciada e, pelos termos acordados, os acionistas da Agra teriam um ganho de 48% com a operação, que seria realizada por meio de troca de ações. Três meses depois, porém, a Cyrela desistiu do negócio. Os papéis da Agra, que chegaram a ser negociados acima de 9 reais, perderam quase 90% de seu valor, caindo para a casa de 1 real.
"Especular é sempre um grande risco. Não dá para prever se o negócio dará certo ou errado", diz o professor de finanças corporativas da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-Eaesp), Oscar Malvessi. Mesmo quando a operação é finalizada, há a possibilidade de algo não sair como planejado pelos acionistas.
Na incorporação da construtora Tenda pela Gafisa, em setembro do ano passado, por exemplo, os investidores não puderam usufruir do tag along, apesar de a Tenda estar listada no Novo Mercado, o segmento da Bovespa mais exigente em termos de governança corporativa. Analistas e investidores ficaram ressabiados com o modelo de negócio utilizado pela Gafisa, que poderia indicar o caminho para driblar os direitos dos minoritários. Com isso, as ações da Tenda, que já tinham perdido 65% de seu valor no último mês devido ao agravamento da crise global, caíram mais 16% em uma semana.
A questão só não causou mais polêmica - e processos na Justiça - porque, com a crise, não compensou para os minoritários entrar nessa briga. "As empresas sempre buscam formas de reduzir seus custos nessas operações. Esse é um fato que deve ser ponderado pelos investidores", ressalta o professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), Keyler Carvalho Rocha.
Casos como os de Agra e Tenda não são maioria no mercado, mas ilustram os riscos que o investidor corre toda vez que entra numa operação pensando apenas em aproveitar a chance de ganhar com o tag along. Hoje, são os minoritários da Globex, controladora do Ponto Frio, que encaram uma disputa com o Pão de Açúcar pelo tag along. Com a venda do Ponto Frio para a rede de supermercados, os investidores esperavam receber por suas ações o mesmo valor pago aos acionistas majoritários. Mas o Pão de Açúcar afirma que tem o dever de pagar apenas 80% do montante.
Diante de tantas variáveis, a recomendação dos especialistas para quem sente uma comichão toda vez que escuta um rumor de fusão ou aquisição é: controle seus impulsos e estude o negócio antes. "Muitas vezes, as empresas alvo de fusões e aquisições estão em situação delicada. Se o negócio não sai, o investidor perde dinheiro", explica Wagner Faccini Salaverry, diretor do banco Geração Futuro. O ideal para os pequenos investidores, dizem os especialistas, é focar nos investimentos de médio e longo prazo.
Futuro promissor
Quando uma fusão ou aquisição é feita por meio de troca de ações, os investidores têm a opção de manter os papéis em carteira, ao invés de vendê-los e embolsar o prêmio pago na operação. A estratégia é válida sempre que as perspectivas para a nova empresa compensam o risco de manter os papéis em mãos.
Mas, para se chegar a uma conclusão, o investidor terá de avaliar diversos fatores, como o endividamento da nova empresa e sua capacidade de elevar lucros. A corretora Santander, que atua de modo independente do banco, ao analisar a união de Itaú e Unibanco em novembro do ano passado encontrou bons motivos para os investidores terem em suas carteiras ações do novo banco.
Os analistas Boris Molina e Henrique Navarro destacaram que os investidores seriam bem recompensados por se tornarem acionistas do maior banco do país. Os ganhos de sinergia e de escala logo seriam percebidos em números, considerando ainda a expectativa de redução de até 12,5% nos custos do novo banco nos próximos cinco anos. Na ocasião, o Santander projetou um potencial de valorização de 28,6% para as ações preferenciais do Itaú até o final de 2009. Com a união das duas instituições, as ações do Unibanco seriam substituídas pelas do Itaú e, futuramente, os papéis ganhariam um novo código na bolsa (ITUB3 e ITUB4), representando a fusão dos bancos.
Nos cinco meses que transcorreram entre o anúncio da fusão e a troca das ações do Unibanco pelas do Itaú, os papéis ordinários do Unibanco (UBBR3) dispararam 147,6%, enquanto as units (UBBR11) subiram 10,1%. Após a substituição, as ações ordinárias do Itaú Unibanco subiram 18,5% na Bovespa, enquanto a valorização das preferenciais foi de 20,2%.
Veja o desempenho das ações de empresas que passaram por fusões e aquisições.