Pagamentos digitais: hábitos econômicos coletados via censos podem validar investidas em novas tecnologias. (MoMo Productions/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 12 de dezembro de 2022 às 06h00.
Última atualização em 12 de dezembro de 2022 às 12h49.
A era digital vem ensinando empresas a ver pessoas como indivíduos em vez de simplesmente membros de determinados grupos demográficos. Nas mídias sociais, recebemos anúncios personalizados com base em nossas respostas aos anúncios anteriores, nossa posição atual e nossos hábitos de consumo. Nossa imensa pegada digital permite às empresas saber precisamente quão eficazes suas campanhas publicitárias são individualmente e derivar imenso valor desse conhecimento.
Infelizmente, parece que essa onda tecnológica ainda tem de chegar aos legisladores. Apesar das vantagens do big data, os governos ainda tendem a usar uma mesma abordagem para todos os públicos ao planejar investimentos ou projetar políticas econômicas. Para ajudar a melhorar os serviços públicos por meio de um melhor uso dos dados, nós desenvolvemos uma nova estrutura, a que batizamos de Gestão Quantum (“Quantum Governance”, no original em inglês).
Cada empresa de sucesso é construída em três fundações: uma meta compartilhada, que serve como sua razão de ser; as ferramentas e os métodos para conseguir atingir essa meta; e os clientes, motivados por seus próprios interesses, ambições e crenças. Embora esteja se tornando comum no debate público dizer que os governos deveriam funcionar como empresas, isso é impossível, porque esses dois tipos de organização social foram criados com propósitos diferentes. O que eles têm em comum, contudo, é o fator humano. E esse deveria ser o foco das parcerias público-privadas na era digital.
Para terem um bom desempenho, governos e empresas têm de medir, avaliar e entender informações sobre pessoas. Enquanto impedir abusos exige uma gestão de dados sensata, o establishment oferece poucas razões para ficar otimista. Corporações grandes e poderosas acumulam bancos de dados valiosos, perdem confiança pública e fazem lobby com legisladores para impedir fiscalização, ao mesmo tempo que governos recorrem a regulamentações de baixo para cima que afastam eleitores. Além disso, como as grandes empresas têm recursos muito maiores para gastar em compliance e em advogados do que seus rivais menores, essas regulamentações em geral beneficiam as próprias empresas que deveriam conter.
No entanto, os dados são simplesmente importantes demais para serem confiados tanto a governos quanto a grandes corporações que os tratam como sua propriedade privada. Em vez disso, os governos deveriam colaborar com as empresas em estruturas de governança conjunta que reconhecessem as oportunidades e os riscos do big data.
As empresas — que são mais bem posicionadas para entender o verdadeiro valor do big data — devem ir além dos esforços pouco ambiciosos para impedir regulamentações. Em vez disso, elas precisam dar início a um diálogo com legisladores sobre como desenvolver soluções viáveis que possam alavancar a moeda da nossa era para beneficiar o bem público. Fazê-lo as ajudaria a reconquistar a confiança do público.
Os governos, por sua vez, têm de evitar estratégias de regulamentação impostas de cima para baixo. Para ganhar o apoio de que necessitam das empresas, eles precisam criar incentivos para o compartilhamento de dados e a proteção da privacidade, além de ajudar a desenvolver novas ferramentas analíticas por meio de modelagem avançada. Os governos também deveriam repensar e renovar estruturas com raízes profundas herdadas da era industrial, como as de tributação e bem-estar social.
Na era digital, os governos deveriam reconhecer a centralidade dos dados para o desenvolvimento de políticas e criar ferramentas para recompensar as empresas que contribuíssem para o bem público compartilhando tais políticas. É verdade que os governos exigem impostos para aumentar as receitas, mas eles precisam reconhecer que uma compreensão melhor dos indivíduos permite políticas mais eficientes. Ao reconhecer a habilidade das empresas de economizar dinheiro público e criar valor social, os governos poderiam encorajar as empresas a compartilhar dados como uma questão de responsabilidade social.
Mas colaboração não é tão crucial quanto compartilhamento de dados. Nem governos nem empresas respondem de modo apropriado pelo fator humano em seus processos de tomada de decisão. Adaptar-se à era do big data significaria se distanciar de métricas datadas, como o PIB, em direção a métricas que focassem as pessoas.
Com essa finalidade, nossa abordagem de Gestão Quantum introduz uma estrutura de responsabilização a que chamamos de Equilíbrio de Políticas Públicas (“Balance of Public Policy”), que trata como iguais os aspectos tangíveis e intangíveis das tomadas de decisão políticas. Ao bolar políticas, os legisladores em geral se debruçam com intangíveis como adoção de políticas individuais, legitimidade pública, narrativas populares e opiniões da comunidade.
De modo semelhante, os parâmetros de responsabilização que as empresas usam oferecem poucas instruções sobre como valorizar determinados ativos — por exemplo, em geral eles consideram os trabalhadores um custo dispensável. Só que os talentos dos trabalhadores são um fator enorme no sucesso ou no fracasso de qualquer empresa. As estruturas de responsabilização deveriam passar por revisões para quantificar e registrar tais ativos nos relatórios de desempenho das empresas.
Embora seja amplamente sabido que os ativos intangíveis guiam nossas economias e sociedades, nós ainda não temos as ferramentas apropriadas para medir e valorizá-los. Governos e empresas têm de trabalhar juntos para revisar as métricas predominantes pelas quais nós valorizamos tais ativos. Ambos se beneficiariam de desenvolver as ferramentas necessárias para alavancar melhor o big data, e fazê-lo serviria ao bem público.