Jeremy Lin, jogador de basquete: o filho de taiwaneses que migraram para os Estados Unidos virou febre também na China (Layne Murdoch/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 12 de março de 2012 às 06h00.
São Paulo - Até poucas semanas atrás, jeremy lin, o americano na foto acima, era apenas mais um jovem graduado em economia pela Universidade Harvard, considerada por muitos a melhor do mundo. Não que o fato, por si só, deixe de ser notável. Mas era pouco diante do sonho do garoto, de origem asiática, de se tornar uma estrela da NBA, a liga profissional de basquete americana.
Até ser aceito pelo New York Knicks, Lin foi rejeitado por algumas das maiores equipes do mundo. Quando finalmente teve a chance de jogar, alcançou o que parecia improvável: atuações impecáveis, dezenas de pontos em sequência e o assédio de fãs no mundo inteiro, fenômeno que vem sendo chamado de “Linsanidade”.
Para seus adversários em quadra, Lin é um jogador temível, por suas infiltrações agudas e pontuações de longa distância. A milhares de quilômetros de Nova York, em Pequim, Lin também é tido hoje como ameaça — embora isso nada tenha a ver com arremessos de 3 pontos.
Na China, ao contrário do resto do mundo, os feitos de Lin, um cristão filho de taiwaneses, não receberam quase nenhuma atenção da imprensa oficial. Mas isso não impediu que ele se tornasse um dos maiores ídolos do país.
Isso porque Lin, ao lado de milhões de chineses, é hoje um dos usuários do Sina Weibo, rede de microblogs semelhante ao Twitter, que se tornou a grande febre da internet na China. Em poucos dias, a arrancada de Lin rendeu mais de 1 milhão de seguidores. E colocou uma pulga atrás da orelha da censura chinesa.
Com mais de meio bilhão de usuários de internet, a China é um mercado cobiçado por todas as grandes redes sociais do Ocidente, como Twitter e Facebook. Nenhuma, no entanto, conseguiu se estabelecer no país até hoje. O bloqueio deu origem a alguns êxitos locais.
Lançado em 2009, o Sina Weibo, uma mistura de várias redes sociais que permite tanto o envio de vídeos quanto de mensagens de até 140 caracteres, é o maior deles. Mais da metade dos usuários de internet do país mantém hoje uma conta no Sina Weibo.
O site pertence ao grupo Sina, que tem valor de mercado estimado em 4,6 bilhões de dólares e é tido como uma companhia com olhos para o mercado ocidental. A empresa possui ações negociadas na Nasdaq, a bolsa de tecnologia americana, e tem como presidente o chinês Charles Chao, graduado em contabilidade pela Universidade do Texas.
O crescimento do Sina Weibo é um fenômeno até mesmo quando comparado aos ritmos mais explosivos já registrados no Ocidente. O Twitter, que acaba de ultrapassar a marca de 500 milhões de usuários, levou 58 meses para chegar a 250 milhões de perfis. O Sina Weibo fez o mesmo em 27 meses.
Estima-se que 10 milhões de usuários ingressem no sistema a cada 30 dias. Em grande medida, seu êxito é atribuído à popularidade que alcançou entre celebridades. Como Lin, fazem parte da rede alguns dos atores e esportistas mais famosos do país.
O volume de informações também impressiona. Durante o Ano-Novo chinês, o Sina Weibo quebrou o recorde de envio de mensagens do próprio Twitter (foram mais de 32 000 por segundo).
Mas a relevância do Sina Weibo, claro, não tem a ver apenas com ser a rede social da moda. O que preocupa as autoridades chinesas é o potencial subversivo de um sistema em que, pela primeira vez, todos os usuários podem ter voz — sejam eles seguidores fiéis do partido, taiwaneses ou cristãos.
Apesar de estar sempre sob os olhos atentos do PC chinês, o site é tido por parte dos chineses como o símbolo de uma nova era de liberdade. “Há um desejo crescente em torno da expressão individual”, diz Duncan Clark, presidente da BDA, consultoria especializada em internet na China. “O Sina Weibo atende muito bem a essas expectativas.”
A maior demonstração do poder do Weibo ocorreu em julho, na ocasião de um grave acidente com um trem-bala que provocou 40 mortes na província de Zheijang. Desde os primeiros minutos do acidente, o site foi usado para enviar pedidos de ajuda, repassados adiante milhares de vezes.
Fosse para resgates ou para doação de sangue às vítimas, o Weibo se tornou o principal canal de comunicação para sobreviventes, testemunhas e outros envolvidos. Mas, como era de esperar, não demorou para que o site servisse também para fazer circular mensagens de usuários raivosos, que faziam críticas e cobravam do governo responsabilidade pelo acidente. Dias depois, o assunto foi proibido na imprensa oficial. No Weibo, a conversa foi longe.
Como qualquer serviço de internet na China, porém, os conteúdos da rede estão sujeitos a censura. O próprio software do Weibo impede que certas palavras sejam enviadas. Há ainda casos de bloqueio manual de mensagens. “A censura é levada muito a sério pelo Sina Weibo”, diz Daniel Yu, analista da Pyramid Research.
“Por proteção, eles fazem de tudo para que apenas conteúdo apropriado chegue ao sistema.” Apesar disso, é difícil acompanhar a criatividade dos usuários, que alteram palavras para escapar do bloqueio.
Receoso, o governo anunciou recentemente que nomes reais de usuários serão exigidos a partir de 16 de março. Para observadores, o site corre pouco risco de ser fechado. O próprio governo mantém mais de 20 000 contas oficiais, de departamentos do governo a polícias locais.
Mas a nova exigência de Pequim poderá frear o ritmo de crescimento da rede e até mudar o tom das conversas no site. A represália ocorre no momento em que o Weibo começa a ganhar fama internacional. Bill Gates, Tom Cruise e a diretora do FMI, Christine Lagarde, são algumas das personalidades que abriram contas.
Entre outras coisas, o Twitter, criado em 2006, é celebrado por amplificar o diálogo global. O Weibo, até aqui, conseguiu fazer algo semelhante na China. Resta saber se o diálogo, no futuro, não vai virar monólogo.