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Filhos tornam a vida de seus pais melhor?

Angus Deaton, professor de economia da Universidade de Princeton, procura a resposta para a pergunta que muitos recém-casados fazem: os filhos tornam mesmo a vida melhor?

Parque de diversões na Flórida: a vida seria melhor sem aquela pressão para ir à Disney? (Ali Nasser/Divulgação)

Parque de diversões na Flórida: a vida seria melhor sem aquela pressão para ir à Disney? (Ali Nasser/Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 16 de julho de 2014 às 20h00.

São Paulo - "Ter filhos nos deixará felizes? Essa é uma pergunta que jovens casais com frequência se fazem. ‘Por que mesmo tivemos filhos?’ é uma pergunta comum entre casais com adolescentes em casa.

Apesar desses questionamentos, a vasta maioria das pessoas tem filhos — e mesmo quem precisa lidar com adolescentes problemáticos acha difícil imaginar um mundo em que eles não existissem.

Essas reflexões estão cada vez mais recebendo a atenção de pesquisadores. Especialistas de diferentes áreas vêm tentando chegar a uma resposta científica sobre se os filhos tornam a vida de seus pais melhor. 

Boa parte dos estudos concluiu que os casais sem filhos são mais felizes. Uma análise feita no Reino Unido de 1991 a 2005 sugere que o número de crianças em casa tem um efeito negativo na felicidade dos adultos.

Uma pesquisa mais recente realizada em 94 países, onde vivem 90% da população mundial, chegou a conclusões semelhantes. Surpreso com o resultado? Pode mesmo parecer surpreendente. Afinal, as pessoas sabem de onde vêm as crianças e, na maioria das vezes, têm filhos porque querem.

Será então que vivemos inicialmente a ilusão de que os filhos nos farão felizes, mas depois somos decepcionados pela realidade? As pessoas­ que decidem ter filhos entram mesmo numa fria? Ou são as pesquisas que estão um tanto equivocadas? 

Essa pergunta é mais do que retórica. Toca num ponto crucial para as ciências sociais. À medida que buscamos respostas objetivas para questões do dia a dia esbarramos em problemas metodológicos complexos. Um exemplo: é comum compararmos o desempenho de alunos de diferentes escolas.

No Brasil, por exemplo, os alunos de escolas públicas vão pior nos exames do que os de escolas privadas. Podemos concluir que as escolas públicas são piores? Ou será que o resultado reflete fatores fora da sala de aula? É como parte desse debate que voltamos à pergunta sobre felicidade e filhos.

Uma análise desse questionamento serve para explicitar as limitações de algumas pesquisas em busca de verdades científicas. Pelo menos foi isso o que o psicólogo americano Arthur Stone e eu tentamos demonstrar num trabalho publicado no começo deste ano. 

Nossa principal fonte de informação foi uma sondagem feita pelo instituto de pesquisa de opinião Gallup, que telefona para 1 000 americanos a cada noite. As perguntas são sobre como vai a vida e as emoções que sentiram no dia que passou, incluindo raiva, tristeza, felicidade, preocupação e estresse.

Em nossa pesquisa, usamos as respostas de cerca de 1,8 milhão de americanos. À primeira vista, os resultados são consistentes com as pesquisas que mostram um quadro negativo entre os pais. Em média, adultos que vivem com crianças ou adolescentes são menos satisfeitos com a vida do que os que não vivem. 

Para ter uma ideia melhor do todo, começamos indagando se o problema dos pais infelizes são mesmo os filhos. À primeira vista, sim: americanos mais velhos com um filho em casa reportam vida pior do que americanos mais velhos sem filhos. Mas, na verdade, isso não tem nada a ver com ser pai.

Algumas pessoas idosas não podem viver sozinhas e têm de se mudar para viver com seus filhos — agora adultos — e com os filhos deles. Avós adoram seus netos, mas não gostam de viver com eles, e certamente não gostam das incapacidades ou da saúde precária que os obrigam a fazê-lo.

Por isso, devemos excluir os idosos de nossa contabilidade. Há um problema similar com adultos jovens, para quem a criança em casa pode ser um irmão ou irmã, com frequência uma fonte de irritação. 

Consideramos, portanto, somente adultos de 34 a 46 anos. Para esses, quase todas as crianças que vivem em casa são os próprios filhos. E, entre eles, o quadro é positivo. Os que têm uma criança qualificam sua vida como melhor do que os que não têm.

Pais experimentam mais preocupação, tristeza e raiva do que não pais, embora também sintam mais felicidade, deem mais sorrisos e tenham mais diversão ao longo de um dia. Se considerarmos as pessoas­ certas e excluirmos as irrelevantes, as que têm filhos levam vida melhor. Certo? Infelizmente, essa conclusão também não é totalmente convincente. 

O problema é que os adultos que têm filhos são diferentes não só por serem pais mas também por muitas outras razões. Comparados aos não pais, os pais americanos são mais saudáveis, mais ricos, mais bem-educados, mais propensos a ser religiosos e a não fumar. Todas essas circunstâncias os tornam mais satisfeitos com a vida — quer tenham filhos, quer não.

Talvez o mais importante é que as pessoas com filhos têm probabilidade muito maior de ser casadas, e pessoas casadas são mais felizes do que pessoas não casadas, mesmo quando não têm filhos. São os filhos que as deixam mais felizes? Ou são outras coisas que predispõem as pessoas a querer filhos que, na verdade, as fazem felizes?

Para chegar a uma conclusão definitiva, uma possibilidade é comparar pais e não pais entre os que já estão casados. O problema é que, para muitas pessoas, a decisão de casar é parte da decisão de ter filhos. Nesses casos, casais sem filhos que queriam tê-los serão infelizes.

As pessoas que não são casadas mas têm filhos também podem ser infelizes se tiverem tido um bebê que não queriam. Há ainda outras questões a ser consideradas. Casais com filhos podem trabalhar com mais afinco e ter uma renda maior ou não fumar justamente porque têm crianças em casa. 

O que fazer, então?

Há uma moda atual nas ciências sociais de responder a perguntas difíceis como essa por meio de um teste em que dois grupos são selecionados alea­toriamente. Um recebe o que está sendo testado — remédios ou escolas —, o outro não e, no fim, os dois são comparados.

Parece bastante óbvio que esse tipo de experiência é impossível no caso que estamos discutindo neste artigo. Imagine acordar um dia de manhã ao lado de um filho inesperado. De qualquer forma, medir quanto isso afetaria a felicidade das pessoas não nos diria muito sobre o que ocorre a pais que têm um filho da maneira tradicional. Como ficamos, então? Os filhos trazem ou não felicidade? 

Talvez a melhor resposta seja que, na média, não há de fato nenhuma diferença na avaliação sobre a vida entre os que têm e os que não têm filhos. Não existe uma lei que determine um vazio existencial para quem não os tem nem um poço de felicidade para quem os tem.

A verdade mais geral é que pais são diferentes de não pais e a diferença mais importante é que pais querem ter filhos, enquanto não pais não querem. Dito isso, tampouco há razão para supor que as pessoas serão mais ou menos felizes só porque obtêm aquilo que desejam.

Algumas pessoas gostam de tirar suas férias na praia e outras na montanha. Mas não há nenhuma literatura científica sobre se esquiadores são mais felizes do que surfistas e, é bom que se diga, nem deveria haver. Essa é nossa principal conclusão. Ou seja, se você quer ter filhos, tenha. Se não quer, não tenha. E deixe que o futuro da raça humana resolva os próprios problemas.”

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