Ilustração de técnico (Maurício Pierro / EXAME)
Da Redação
Publicado em 5 de outubro de 2016 às 20h20.
São Paulo – O especialista em gestão Vicente Falconi responde a dúvidas dos leitores de EXAME sobre a relação de um líder com seu time e crescimento profissional.
1. Gostaria de trazer para o lado corporativo o que acontece com os técnicos de futebol no Brasil. Invariavelmente eles são demitidos quando o time não vai bem. Em sua opinião, onde está o problema? Nos técnicos ou nos jogadores?
Zeferino Scalabrini Neto, de Minas Gerais
Existe uma máxima na teoria geral dos sistemas que diz o seguinte: “Se você colocar um líder excepcional num sistema ruim, o sistema sempre vencerá”. Em meu último livro, O Verdadeiro Poder, cito o caso de um excelente diretor de vendas de certa empresa que conheci de perto. Ele sempre batia suas metas e tinha seu time, também excepcional, nas mãos.
Eis que um concorrente lhe ofereceu uma “proposta irrecusável” na esperança de que ele pudesse reproduzir o mesmo desempenho lá. Ele aceitou a proposta e fracassou. Não chegou a completar um ano na outra empresa. Nunca mais ouvi falar dessa pessoa. Se ele soubesse que o sistema sempre vence, teria aceitado a proposta sob a condição de formar a própria equipe. E também teria dito, de largada, que isso iria durar, pelo menos, de cinco a dez anos.
É preciso dar uma atenção muito grande a uma mudança cultural para que ela aconteça na prática. Para formar um time campeão que não dependa de uma liderança muito forte, é preciso ter antes de mais nada as pessoas certas. No caminho, será preciso fazer escolhas e trocar parte da equipe. Além de um bom ponto de partida, será necessário investir num treinamento excepcional e constante.
Muita gente pensa que treinar é dar um curso e o objetivo está completo. Vã ilusão. Num treinamento formal são dadas as informações explícitas. Na analogia de como se ensina alguém a andar de bicicleta, não basta dizer que ela precisa sentar no banco e pedalar. Essa é a teoria. O aprendizado de andar de bicicleta só se adquire efetivamente ao tentar, cair e começar de novo. E é algo que só se desenvolve ao longo do tempo. Eis o que se chama de conhecimento tácito.
O conhecimento tácito e o explícito reforçam-se um ao outro ao longo do tempo e, portanto, deve haver muito treinamento, inclusive repetido. Não se muda a cultura de uma empresa da noite para o dia.
Para concluir, uma das tarefas de um líder é formar seu time porque quem bate metas é o time — e não o líder. É óbvio que, à medida que você desenvolve seu time, os resultados começam a aparecer. Se houver perseverança, o desempenho gradualmente vai melhorar até que você atinja o patamar desejado depois de uns cinco a dez anos.
2. Trabalho numa multinacional em crescimento, apesar da crise. Sou consultor na área de vendas e estou nessa função há quase seis anos, dois deles na empresa atual. Nesses dias tivemos modificações, mas todas “casadas”, em que os gestores já tinham candidatos de sua preferência. Sempre sou elogiado, mas por enquanto só tive promessas. Diante desse cenário, qual é a melhor decisão a ser tomada?
Anônimo
Difícil analisar seu caso sem mais informações sobre a empresa ou sobre você. Dessa maneira vou falar de forma geral. Primeiro quero dizer que você tem toda razão ao querer mudar de tarefa. Não é bom ficar na mesma cadeira e na mesma mesa por muito tempo. O ideal é manter a mesma atividade entre três e cinco anos. A explicação para isso é simples: temos de aprender continuamente em nosso dia a dia.
O ser humano não aprende aos saltos, mas um pouco a cada dia. Para que isso continue a acontecer, temos de ser desafiados com metas ou mudanças de posição na empresa, mesmo que seja um movimento lateral — ou seja, sem promoção —, mas que proporcione novas situações e novos problemas.
As metas e as mudanças nos desafiam para o aprendizado e para o crescimento profissional. Existem empresas que se preocupam com o aprendizado de seus funcionários e tentam mantê-los em movimento com o objetivo de formá-los melhor. Outras nem tanto. Sua carreira vai depender muito da empresa que você escolheu.
Por exemplo, pelo menos em tese, todas as empresas concordam com os princípios básicos da meritocracia. Mas impor uma meritocracia viva na qual as promoções sejam feitas por puro mérito é coisa para poucas companhias. Isso acontece porque, em certos casos, será preciso deixar para trás um amigo, parente ou conterrâneo — e promover outro que seja simplesmente a melhor pessoa para aquela posição.
Um sistema de avaliação de desempenho deve ser muito bom e independente de opiniões pessoais. Isso é raro de encontrar. Quando há meritocracia de verdade, ao longo dos anos as pessoas acostumam-se com o fato de que as promoções são feitas de forma isenta e sob o julgamento de todos. E quem fica para trás também sabe por que isso aconteceu.