Rodrigo Abreu, futuro presidente da Oi: ele deve assumir no fim do ano (Omar Paixão/Exame)
Denyse Godoy
Publicado em 12 de setembro de 2019 às 05h44.
Última atualização em 16 de setembro de 2019 às 19h10.
A lua de mel da Oi com os investidores durou pouco. No primeiro trimestre do ano, a operadora de telecomunicações com sede no Rio de Janeiro chegou a ganhar 2,4 bilhões de reais em valor de mercado — o equivalente a 41% de alta — depois de receber em janeiro um aporte de 4 bilhões de reais dos acionistas. O dinheiro seria usado para levar a cabo a última e decisiva etapa do plano de recuperação judicial aprovado em junho de 2018: acelerar a substituição de sua rede de internet de banda larga fixa de fios de cobre pela de fibra óptica, mais rápida. O otimismo de que a empresa ameaçada de quebrar desde 2016 estaria fora de perigo deu lugar ao desânimo na divulgação dos resultados do segundo trimestre, no dia 15 de agosto.
A Oi já havia gastado metade do aporte recebido, mas continuava a perder clientes, e seu diretor financeiro, Carlos Brandão, tinha dito que uma nova injeção de recursos poderia ser necessária porque a venda de ativos, também prevista no plano de recuperação judicial, estava demorando mais do que o previsto. Naquela semana fatídica, o valor de mercado da companhia caiu 30% na bolsa B3, para 4,7 bilhões de reais, enquanto os investidores pulavam do barco. Até então incensado como o salvador da Oi, o presidente Eurico Teles, líder da reestruturação, começou a sofrer forte pressão para deixar o cargo. Ainda existe solução para aquela que num passado não tão longínquo foi chamada de “supertele brasileira”?
O caso da Oi é um exemplo acabado das dificuldades de um processo para evitar a falência de uma grande empresa. No Brasil, 58% das empresas que pedem proteção à Justiça contra os credores não conseguem se reerguer, segundo um estudo feito em 2018 pela Associação Brasileira de Jurimetria em parceria com a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Neste ano, até julho, 794 empresas pediram recuperação judicial e 369 tiveram a solicitação atendida pela Justiça, de acordo com dados da consultoria de crédito Serasa Experian, 5% mais do que em 2018. A demora para reagir da economia brasileira explica em boa medida essa elevação. Nesse cenário, fica ainda mais difícil recolocar uma operação nos trilhos. “A lei de recuperação judicial, de 2005, substituiu a da concordata, que apenas queria garantir o pagamento aos credores. A nova legislação busca um acordo para que a empresa consiga sair viva”, diz Luiz Rabi, economista da Serasa Experian.
Os investidores da Oi esperavam que o progresso fosse mais célere. Velocidade é crucial no setor de telecomunicações porque as tecnologias vêm mudando num ritmo frenético. No período em que a Oi está lutando pela sobrevivência, suas concorrentes estão ampliando a vantagem. Do final do ano passado até junho, o número de clientes de telefonia fixa da Oi caiu 5,4%, para 14 milhões, enquanto o da telefonia celular recuou 0,9%, para 34,7 milhões.
As receitas da Oi no segundo trimestre diminuíram 8% ante o segundo trimestre de 2018, para 5 bilhões de reais, e o prejuízo cresceu 24%, para 1,6 bilhão. De 2014 a 2018, a Oi investiu 25 bilhões de reais, enquanto a subsidiária local da espanhola Telefônica, dona da marca Vivo, investiu 35 bilhões. A participação da Vivo em telefonia móvel passou de 28,5% para quase 32%, enquanto a da Oi diminuiu de 18% para 16,4% em cinco anos.
Desde o choque de realidade em meados de agosto, a Oi tem novidades a caminho. Depois que o fundo de investimentos americano GreenTree, dono de 15% da operadora, mandou uma carta ao conselho de administração pedindo a substituição de Eurico Teles, o juiz Fernando Viana, da 7a Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio e supervisor do processo, autorizou a mudança. Em 2017, Viana havia nomeado Teles como interventor e responsável pelo processo de recuperação judicial até seu término. Teles planejava deixar a presidência da Oi em fevereiro de 2020, no prazo legal para a conclusão do plano.
Originalmente diretor jurídico da companhia, Teles assumiu a liderança da Oi no susto, quando o então presidente Marco Schroeder renunciou. Teles conseguiu superar um agressivo levante de acionistas liderado pelo empresário Nelson Tanure, experiente em tomar empresas em dificuldade. Obteve quase 100% de apoio dos credores ao plano de recuperação judicial e ainda convenceu os investidores a fazer o aporte bilionário no início de 2019.
No entanto, para apressar as mudanças operacionais vitais para manter a Oi no páreo, os investidores agora preferem um executivo mais técnico. É um dilema comum em empresas em dificuldades: sem resolver a crise financeira, não há futuro; sem futuro, qual é a lógica de resolver a crise? Rodrigo Abreu, ex-presidente da concorrente TIM que há um ano vem atuando como membro do conselho de administração da Oi, foi o nome aprovado por Viana no início de setembro. O processo de escolha e troca corre em segredo de Justiça, mas EXAME apurou que a transição já começou e Viana deverá assumir no fim do ano. A Oi não comenta. “Abreu é quem mais teria condições de reverter o declínio. A Oi enfrenta uma situação difícil, mas tem condições de se recuperar”, diz Glauco Legat, analista-chefe da corretora Necton.
Uma mudança regulatória a caminho pode dar um importante impulso à reestruturação. O Senado deve votar neste mês o Projeto de Lei Complementar no 79, que estabelece o novo marco legal para o setor de telecomunicações. O projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados em 2016. Com as novas regras, as empresas vão ganhar liberdade para decidir como investir. Em vez de gastar um percentual determinado por lei em telefonia fixa, poderiam colocar todos os recursos em banda larga, por exemplo. No ano passado, uma grande amarra foi eliminada com o fim da obrigatoriedade de manutenção dos orelhões em áreas do país com mais de 300 habitantes.
A Oi, que tinha cerca de 640.000 desses aparelhos, gastava 300 milhões de reais por ano com o serviço. Conseguiu eliminar 200.000 até agora. A flexibilização facilita a consolidação do setor, com fusões ou aquisições. No final de agosto, o presidente da companhia telefônica americana AT&T, Randal Stepherson, veio ao Brasil e sinalizou ao presidente Jair Bolsonaro interesse na Oi. O valor de mercado da companhia, que já superou os 21 bilhões de reais no auge, em 2012, agora está na casa dos 7 bilhões.
Removido o obstáculo das regras anacrônicas, ainda falta a Oi conseguir vender ativos para reforçar o caixa. A empresa contratou a consultoria de estratégia Boston Consulting Group e o banco de investimentos Bank of America Merrill Lynch para avaliar quais bens e negócios vender. Entre as possibilidades estão torres de transmissão, imóveis e data centers. A divisão de telefonia móvel está na lista. É a unidade mais rentável da companhia e a mais fácil de separar.
Vale 15 bilhões de reais, nas contas de Legat, da Necton. Uma participação de 25% na telefônica Unitel, em Angola, vale outros 4 bilhões de reais, fora os dividendos que a operadora não tem pagado aos acionistas. Neste ano, a Oi conseguiu maior acesso às informações financeiras da Unitel, que antes lhe eram negados, e passou a ter poder para indicar executivos. As melhorias na governança devem ajudar a atrair um comprador de fora, porém o mais provável é que a petroleira angolana Sonangol, que já detém participação de 25% na Unitel, fique com a fatia da empresa brasileira. Entre os demais sócios está ainda a bilionária Isabel dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos, ex-presidente de Angola de 1979 a 2017.