Revista Exame

Contagem regressiva para Eleições 2022 já começou. O que esperar?

Do engajamento nas redes sociais à vigilância do TSE sobre as fake news, dos acordos locais às alianças nacionais, tudo conta para o resultado final nas urnas

A dez meses das eleições, o ex-presidente Lula e o presidente Bolsonaro lideram os cenários eleitorais (Paulo Fridman/Bloomberg/Getty Images, Dado Galdieri/Bloomberg/Getty Images, Sergio Lins/AFP/Getty Images, Alan Santos/PR/Agencia BrasilL, Jesus Hellin/Europa Press/Getty Images, Nelson Almeida/AFP/Getty Images, Rafael Henrique/SOPA Images/LightRocket/Getty Images)

A dez meses das eleições, o ex-presidente Lula e o presidente Bolsonaro lideram os cenários eleitorais (Paulo Fridman/Bloomberg/Getty Images, Dado Galdieri/Bloomberg/Getty Images, Sergio Lins/AFP/Getty Images, Alan Santos/PR/Agencia BrasilL, Jesus Hellin/Europa Press/Getty Images, Nelson Almeida/AFP/Getty Images, Rafael Henrique/SOPA Images/LightRocket/Getty Images)

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Alessandra Azevedo

Publicado em 16 de dezembro de 2021 às 05h38.

Última atualização em 4 de janeiro de 2022 às 12h22.

Redes vs. televisão

Engajamento nas redes segue vital, mas a TV volta a ter relevância

Não foi por acaso que o presidente Jair Bolsonaro mudou de estratégia e resolveu se filiar a um partido grande, o PL, em novembro deste ano, depois de dois anos sem legenda e a dez meses das eleições. O fenômeno que permitiu a ele ser eleito em 2018 pelo PSL — uma sigla, até então, nanica — não deve se repetir em 2022. Em 2018, o candidato com mais tempo de televisão era Geraldo ­Alckmin (PSDB), com 5 minutos e 32 segundos em cada bloco de propaganda eleitoral.

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Mesmo assim, sem grande projeção na internet, o tucano teve apenas 5% dos votos válidos. Já Bolsonaro, com 8 segundos de televisão, chegou a 46% dos votos válidos no primeiro turno. Os fatores que levaram à vitória atípica do presidente, com campanha feita basicamente em redes sociais, não estão mais presentes, afirma o especialista em marketing político Marcelo Vitorino. “Naquela época, Bolsonaro foi muito bem porque as pessoas queriam uma ruptura política”, diz.

“Não é suficiente ter seguidores e não ter estratégias eficientes para engajar nas redes”, afirma Vitorino. “O desafio é perder a lógica da comunicação política tradicional, como ‘fui a tal cidade hoje e visitei o prefeito’. É preciso contar uma história.” Segundo ele, o conteúdo político em rede social, para ter engajamento maior, deve estar travestido de entretenimento.

A estratégia de embates frequentes nas redes que levou Bolsonaro ao poder em 2018 não se enfraqueceu durante o mandato — pelo contrário. O presidente é, disparado, o candidato com maior presença online, com 40 milhões de seguidores nas principais plataformas, quase quatro vezes mais do que Lula (veja quadro abaixo). Bolsonaro também é o que tem mais capacidade de movimentar as redes com declarações e decisões políticas, aponta André Eler, diretor adjunto da consultoria Bites, que monitora de perto a movimentação dos candidatos.

Mas os opositores também deverão estar mais atentos. Sergio Moro, que pouco havia aparecido nas redes sociais desde que deixou o governo, voltou a ganhar seguidores. Lula, por sua vez, teve picos de interações e menções em momentos como sua viagem à Europa e a participação no videocast Podpah — o episódio gerou 7,5 milhões de visualizações em três dias e fez o petista ganhar mais de 130.000 seguidores na sequência.

“Lula pode ter boa capacidade de mobilizar as redes quando a campanha começar”, diz Eler. “Em 2018, Bolsonaro quase não era questionado. Isso possivelmente não acontecerá de novo em 2022.” Filiado agora a um partido grande, o presidente contará com mais recursos para investir em uma campanha tradicional e competir com Lula num terreno que o petista já dominou.

(Arte/Exame)


O combate à desinformação 

Entendimento do TSE de que difusão de fake news é crime pode acarretar perda de mandato

Ministros Luís Roberto Barroso, atual presidente do TSE (à esquerda), e Alexandre de Moraes, que irá presidir a Corte em 2022: caça às fake news (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Se as redes sociais serão imprescindíveis na estratégia dos candidatos, assim também será o trabalho nos bastidores para monitorar a enxurrada de conteúdo online. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) está na linha de frente desse debate. Um destaque recente foi o julgamento da chapa Bolsonaro-Mourão, por disparos em massa de notícias falsas no WhatsApp em 2018. Os ministros absolveram a chapa ao entenderem que, embora tenha acontecido o disparo, não há provas suficientes da gravidade dos atos.

Mas, na mesma ocasião, a Corte deixou claro que a tolerância em 2022 será menor ao decretar a inelegibilidade por oito anos do deputado estadual Fernando Francischini (PSL-PR) pela divulgação de informações falsas sobre a urna eletrônica. O ministro Alexandre de Moraes, que será presidente do tribunal a partir de agosto, também discursou afirmando que não vai permitir que grupos organizados tentem “novamente desestabilizar as eleições”.

“Temos hoje não somente um precedente mas um entendimento majoritário do TSE de que a difusão de fake news do candidato gera perda de mandato”, diz Antonio Carlos de Freitas Júnior, doutor em direito constitucional e eleitoral pela Universidade de São Paulo (USP). 

Sociedade civil e empresas também se prepararam para o cenário de guerra pré-eleitoral. Procurados pela EXAME, o grupo Meta e o Google, donos das maiores redes sociais do Brasil, afirmaram estar trabalhando de perto com o TSE. O app de mensagens WhatsApp, destaque negativo em 2018, afirma que o número de mensagens “frequentemente encaminhadas” caiu 70% depois da implementação de restrições ao compartilhamento.

A companhia diz também que, nas eleições de 2020, encorajou políticos a não usarem mecanismos ilícitos de disparos em massa, e tem uma dezena de processos abertos contra empresas que vendem esse serviço. “Foi fundamental ter tido pela primeira vez uma proibição expressa de disparo automatizado de mensagens na legislação eleitoral”, disse o WhatsApp em nota. Facebook e Instagram, do mesmo grupo, lançaram um rótulo nas postagens de políticos para que eleitores acessem informações oficiais.

Na eleição municipal, o grupo Meta calcula ter removido mais de 140.000 peças que violavam termos de uso e rejeitado 250.000 impulsionamentos de posts que não deixavam claro serem anúncios eleitorais. O Google, dono do YouTube, passou a bloquear ou desmonetizar conteúdos sobre tratamento da covid-19 que fogem do consenso científico, como incentivo ao uso da hidroxicloroquina, e diz que tem ampliado o monitoramento para as eleições e destacado fontes confiáveis nas buscas. 

Apesar dos aperfeiçoamentos, a prática em ano eleitoral será mais complexa, com novas formas de espalhar conteúdos e outras plataformas entrando no radar, do Telegram ao TikTok. “Jogo sujo sempre haverá, os grupos sempre vão achar uma brecha”, diz Caio Machado, cofundador do Instituto Vero, de combate à desinformação, e pesquisador da Universidade de Oxford.

“As principais empresas mudaram bastante a postura nos últimos anos, o que é positivo. Agora precisam seguir trabalhando para melhorar os processos e a transparência.” Outro fator que pode aparecer como novidade é o chamado “PL das Fake News” (2.630/2020), que imporia novas medidas de regulação e transparência na moderação de conteúdo online — indo além do que aponta hoje o Marco Civil da Internet, de 2013.

Criticado no início por ameaças à privacidade dos usuários, o texto sofreu alterações e hoje é visto como mais maduro, diz Machado. Mas, para passar a valer antes das eleições, o projeto de lei precisaria ser aprovado até julho. Ainda não há acordo para que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), paute o texto em plenário. 


O peso da economia

Bolsonaro será cobrado a prestar contas da gestão econômica do país. A baixa popularidade no terceiro ano de mandato é sinal de que ele terá dificuldades em se explicar

É consenso entre especialistas que a economia é um dos principais fatores que determinam o futuro de um presidente que busca a reeleição. Diante dessa premissa, o cenário atual, com inflação corroendo o poder de compra das famílias e desemprego em alta, não é o ideal para o presidente Jair Bolsonaro.

Já para os outros pré-candidatos, a situação é perfeita para embasar promessas eleitorais e apontar erros do governo atual. Na corrida eleitoral de 2022, os indicadores econômicos serão munição dos adversários contra Bolsonaro.

“Quando a geladeira está vazia, as pessoas votam na oposição; quando está cheia, no governo”, resume o cientista político Creomar de Souza, presidente da consultoria Dharma.

Em boa parte por causa da situação econômica desfavorável, Bolsonaro chega ao último ano antes da eleição em um cenário desafiador. Dos presidentes que conseguiram a reeleição, o atual mandatário tem a pior avaliação a essa altura do mandato, com cerca de 25% de pessoas que dizem que o governo é ótimo ou bom (veja o quadro abaixo). 

Além disso, todos os presidentes que conseguiram se reeleger estavam liderando as pesquisas nesse momento, o que não acontece com Bolsonaro. “É inegável que Bolsonaro partirá de um ponto mais baixo do que outros que se reelegeram”, diz Maurício Moura, do instituto especializado em opinião pública IDEIA.

Enquanto se prepara para os inevitáveis ataques relacionados à economia, o presidente aposta no Auxílio Brasil de 400 reais, em substituição ao programa Bolsa Família, para tentar reverter a rejeição que cresce por motivos econômicos e sociais. O aumento no tíquete do benefício, no entanto, tende a ser insuficiente para reverter as perdas.

O presidente teve um pico de popularidade quando implementou o auxílio emergencial de 600 reais, chegando a 41% de aprovação em novembro do ano passado, segundo pesquisa EXAME/IDEIA. Mas o mesmo não deve acontecer com a chegada do Auxílio Brasil, na avaliação de especialistas.

Isso porque, depois de o auxílio emergencial ter atendido 67,9 milhões de pes­soas, o Auxílio Brasil é apenas uma atualização do Bolsa Família, que chega ainda a 15,6 milhões de famílias. Ou seja, muita gente que recebeu o auxílio emergencial durante a pandemia ficou sem assistência por não se encaixar nos critérios de pobreza e extrema pobreza do novo programa.

“Bolsonaro espera que 400 reais encham a geladeira, mas não está claro se isso será suficiente para elevar a popularidade dele”, afirma Souza. O Planalto pode estar superestimando os ganhos com o Auxílio Brasil e esquecendo que o programa é voltado para quem já recebia o Bolsa Família, ainda associado a uma política do PT. 

 Outro problema para Bolsonaro é que a taxa de desemprego está em 12,6%, com 13,5 milhões de pessoas sem trabalho no país, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E a inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ficou em 0,95% em novembro — no acumulado dos últimos 12 meses, a alta é de 10,74%. 

Diferentemente de 2018, Bolsonaro agora precisará dar satisfação sobre o mandato e explicar os números, que afetam principalmente os mais pobres. “Ele está tentando tirar dinheiro de onde não tem para gerar algum tipo de popularidade. Mas o fato é que ele terá de discutir pautas econômicas e sociais em 2022, o que ele nunca fez”, aponta o cientista político Paulo Ramirez, da ESPM.

 O eleitor de 2022 estará “vacinado” em relação à ideia de dar um cheque em branco ao candidato, diz Ramirez. A cobrança por programas específicos de geração de emprego e combate à fome será inevitável. “As pessoas com certeza cobrarão soluções para essa crise. Elas vão querer saber quantos empregos serão gerados e como o candidato pretende fazer isso”, afirma o especialista.


O fator Moro

O ex-juiz se firma por ora como o principal nome para rivalizar com Bolsonaro e Lula nas urnas, mas outras opções tentam se colocar na disputa polarizada entre direita e esquerda

Sergio Moro, ex-juiz federal e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, em evento de filiação ao Podemos: postura de outsider na política e agenda anticorrupção para fazer frente a Bolsonaro e Lula (Evaristo Sa/AFP/Getty Images)

O quadro desenhado para a eleição de 2022, até agora, mostra uma divisão clara entre duas candidaturas mais fortes, a de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a de Jair Bolsonaro (PL), e uma terceira via ainda fragmentada. Entre os dois pré-candidatos com mais destaque nas pesquisas, há pelo menos dez nomes que se colocam como opção para ocupar o Palácio do Planalto a partir de 2023.

Sergio Moro (Podemos), Ciro Gomes (PDT), João Doria (PSDB), Rodrigo Pacheco (PSD), Simone Tebet (MDB), Alessandro Vieira (Cidadania), Luiz Felipe D’Avila (Novo), André Janones (Avante), Leonardo Péricles (UP) e Cabo Daciolo (Brasil 35) se apresentam como alternativas para quem não quer Lula nem Bolsonaro.

Poderia ser uma boa notícia para os candidatos da terceira via o fato de que os dois mais cotados têm altos índices de rejeição — 48% dos eleitores não votariam no atual presidente de jeito nenhum, enquanto o petista não teria os votos de 40%, segundo pesquisa EXAME/IDEIA divulgada em 10 de dezembro. O problema é que nenhuma candidatura conseguiu, ainda, chamar a atenção dos insatisfeitos.

Quando são perguntados em quem votariam, sem que sejam apontados os candidatos, 45% dos entrevistados não citam ninguém, e os nomes de terceira via somam apenas 7% das intenções de voto na pesquisa espontânea. Ou seja, o espaço está aberto, mas as candidaturas ainda não têm projeção. A divisão favorece justamente os dois mais consolidados nas pesquisas: Lula e Bolsonaro.

O cientista político Paulo Ramirez, da ESPM, lembra que, em 2018, foi construída uma unanimidade da direita em torno do presidente, bem diferente do que tem acontecido até agora para o pleito de 2022, em que o grupo está dividido. “Nas últimas eleições, Bolsonaro uniu desde tucanos insatisfeitos até radicais de direita, conservadores, evangélicos e apoiadores da Operação Lava-Jato. Agora ele perdeu parte desse eleitorado”, observa. 

Para Ramirez, a fragmentação, vista principalmente no campo da direita e da centro-direita, fortalece a candidatura de Lula, já que a outra opção da esquerda, até agora, é Ciro Gomes, que não desponta de forma consistente. A pesquisa EXAME/IDEIA mostra o ex-presidente com 37% das intenções de voto quando são apontados os candidatos, enquanto o pedetista tem apenas 6%.

Do outro lado do jogo, Bolsonaro figura com 27%, mas disputa o eleitorado de direita com outras opções, como Sergio Moro, com 10%, e Doria, com 4%. Entre os muitos nomes de terceira via, as porcentagens na pesquisa estimulada, quando são apontados os candidatos, variam entre 0 de Vieira e ­Tebet e 1% para Pacheco, por exemplo. 

Para o cientista político André César, da Hold Assessoria Legislativa, é provável que muitos desses candidatos se unam a outras chapas ou saiam para concorrer a outros cargos. As pré-candidaturas servem, muitas vezes, para cacifar políticos e tentar angariar votos para o partido em outras frentes, mais do que necessariamente como uma pretensão real de assumir a Presidência. 

(Arte/Exame)

Portanto, em 2022, parte dos nomes da terceira via terá desembarcado das candidaturas. “Alguns deles devem sair para concorrer ao Senado, a algum governo estadual ou para ser vice de alguém”, diz César. Nesse cenário, as três candidaturas competitivas que se desenham são de Lula, Bolsonaro e Moro, embora exista a possibilidade de que o ex-juiz saia para se unir a outro candidato.

Por enquanto, Moro está firme na ideia de ser cabeça de chapa. A entrada dele na disputa, para especialistas, prejudica mais Bolsonaro do que Lula. O ex-juiz da Lava-Jato e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Bolsonaro, além de ser visto por alguns como uma opção de centro, é capaz de “roubar” votos do presidente, principalmente da parcela da direita do grupo antipetista e desiludida com o governo.

“Resta saber como ele vai aparecer nas próximas pesquisas. Ainda é cedo para dizer se ele desponta”, pondera a doutora em ciência política Carolina Botelho, pesquisadora da Universidade Mackenzie. Para ela, está claro que Moro tenta resgatar o apelo de “outsider” contra a corrupção, agenda que deve perder espaço em 2022.

Para crescer nas pesquisas, Moro precisará responder às demandas populares atuais, que serão diferentes das de 2018, diz Botelho. O combate à corrupção e o sentimento “antipolítica”, bandeiras do ex-juiz, deram o tom na última disputa, mas agora outros assuntos devem ser prioritários, como economia, educação e saúde pública. Por enquanto, ele não tem respostas para essas questões. 


Além de Brasília 

Estruturas partidárias entram em ação para garantir costuras locais e forjar alianças nacionais

Câmara dos Deputados: garantir uma base sólida de campanha nos redutos eleitorais é a grande missão dos candidatos nos próximos meses (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Enquanto boa parte do debate está centrada nas candidaturas à Presidência, 2022 guardará ainda uma boa dose de negociações bem longe dos palácios da capital federal. Estarão em jogo no pleito de outubro os cargos de governadores dos 26 estados mais o Distrito Federal, a estratégica renovação de um terço das 81 vagas do Senado e as 513 cadeiras na Câmara. Garantir uma base sólida de campanha nos redutos eleitorais é a grande missão dos candidatos nos próximos meses.

“Os palanques locais são fundamentais. Os deputados, por exemplo, não conseguem fazer campanha em todos os municípios e precisam muito de aliados e estrutura partidária”, lembra a cientista política Andréa Freitas, da Universidade de Campinas e do Núcleo de Instituições Políticas e Eleições do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. “Também não se deve esperar fidelidade ao que foi decidido pelos partidos nacionalmente. O palanque local é muito mais específico.”

Os deputados da base de Bolsonaro no Congresso, por exemplo, fazem no momento os cálculos sobre quanto vale a pena se afastar do ex-presidente Lula no Nordeste, onde o petista tem mais de 60% dos votos. Já o presidente Bolsonaro, que rompeu com muitos dos governadores aliados, agora aposta em lançar seus ministros para governo e Senado em estados estratégicos, de olho nos palanques estaduais. A aproximação com o Centrão no Congresso e as emendas de relator distribuídas por Arthur Lira também ajudarão a consolidar as bases estaduais do presidente para a eleição, dizem os analistas ouvidos pela EXAME. 

Outro ponto a ser observado é a reforma eleitoral (mais uma) aprovada no Congresso. A possibilidade de federações, em análise pelo Supremo Tribunal Federal até o fechamento desta edição, permitiria aos partidos se unirem para somar votos, superar a cláusula de barreira e seguir recebendo recursos. Mas com as federações exigindo fidelidade nas alianças, algo difícil de manter na sopa de letrinhas brasileira, só tendem a optar pelo modelo partidos de fato muito pequenos, que não sobreviveriam de outra forma.

Sejam quais forem as regras, é consenso entre os analistas que a eleição para o Congresso deve ter um menor nível de renovação do que em 2018, quando o discurso da antipolítica levou uma série de novatos ao Parlamento. Enquanto isso, a data final para que políticos troquem de partido é março, o que fará do começo do ano um período crucial nas negociações.

“Até lá, os candidatos estarão com um olho no peixe e outro no gato, estudando qual é o melhor movimento partidário antes que a janela se feche”, aponta Creomar de Souza, da Dharma. 

Geraldo Alckmin: o ex-governador lidera as pesquisas para o governo paulista, mas também é cortejado para ser vice de Lula (Gabriel Cabral/Divulgação)

Por fim, alguns estados reservam disputas decisivas para governadores, e que podem respingar em todo o cenário nacional. Em São Paulo, maior colégio eleitoral, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, era a potencial aposta bolsonarista até o fechamento desta edição, ao mesmo tempo que seu nome para vice de Bolsonaro sempre foi um dos cotados — o cargo de vice do presidente segue muito aberto, com apostas que vão da ministra Damares Alves ao presidente da Caixa, Pedro Guimarães.

Já Geraldo Alckmin, que deve deixar o PSDB (para PSD, PSB ou outro), lidera as pesquisas para o governo paulista, mas também é cortejado para ser vice de Lula. Sem Alckmin e sem um candidato forte do PSDB (o vice-governador Rodrigo Garcia é ainda desconhecido), a liderança nas pesquisas fica, na teoria, com Fernando Haddad (PT), mas o voto conservador do interior paulista será uma barreira a uma inédita vitória petista. Em Minas Gerais, Romeu Zema defenderá a reeleição no único governo conquistado pelo Novo em 2018.

No vácuo de poder que virou o Rio, o deputado Marcelo Freixo (que se mudou do PSOL para o PSB) disputará o governo com Cláudio Castro (PSC), que assumiu após o impeachment de Wilson Witzel. Na Região Nordeste, o quebra-cabeça será um dos mais complexos: os governadores em cinco dos nove estados não poderão disputar a reeleição, casos como de Flávio Dino (que pode tentar o Senado no Maranhão pelo PSB), Rui Costa (PT-BA) e Wellington Dias (PT-PI).

Garantir esses sucessores será um desafio grande para a esquerda na região, afirma a pesquisadora Luciana Santana, da Universidade Federal de Alagoas. “O Nordeste votará em peso em Lula na eleição presidencial, mas, para os governos, as disputas estão mais complicadas”, diz. Santana, que também participa do grupo de pesquisadores Rede Análise Covid-19, aponta ainda que os impactos da pandemia podem respingar mais nos governadores do que na disputa nacional.

A economia indo mal também não ajuda os mandatários estaduais e pode embaralhar cenários mais adiante.

Assim, não custa lembrar: até que o eleitor vá às urnas em 2 de outubro, quase nada é certo. Alguns políticos ficarão pelo caminho, e outros chegarão mais fortes do que nunca. Na prática, a campanha só começa em agosto, mas a única garantia é que, do Oiapoque ao Chuí, o ano eleitoral já chegou.  


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