Revista Exame

A crise que nem John Paulson viu

O americano John Paulson se tornou uma estrela de Wall Street ao ganhar bilhões apostando que a bolha imobiliária estouraria — desta vez, está sendo diferente

O investidor americano John Paulson: ele já ganhou um bônus de 5 bilhões de dólares, mas está perdendo em 2011 (John Madere/EXAME.com)

O investidor americano John Paulson: ele já ganhou um bônus de 5 bilhões de dólares, mas está perdendo em 2011 (John Madere/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 6 de outubro de 2011 às 19h18.

São Paulo - Em julho de 2010, a revista americana Bloomberg BusinessWeek publicou um artigo confrontando duas previsões antagônicas sobre o futuro da economia americana. De um lado, Paul Krugman, de 58 anos, prêmio Nobel de Economia, considerava altíssimos os riscos de uma nova crise.

De outro, John Paulson, um dos maiores investidores do mundo, tinha uma visão muito mais otimista. Paulson afirmava que a recuperação americana era “sustentável” e que os riscos de uma nova recessão eram inferiores a 10%. Quem teria razão?

A revista americana não fez questão de esconder em quem apostava. Paulson, o investidor, ganharia de Krugman, o acadêmico. Uma nova crise americana, portanto, seria improvável. Era comprar ações e partir para o abraço.

Por que tanta confiança no faro de John Paulson? O raciocínio é simples de entender. Ninguém, no mercado financeiro atual, ganhou tanto dinheiro acreditando no próprio faro. Entre 2005 e 2007, Paulson apostou tudo o que tinha — e o que não tinha — contra o mercado imobiliário americano.

Seus cálculos mostravam que havia, ali, uma bolha em estágio avançado de formação. Caso os preços dos imóveis continuassem subindo, ele e seus investidores perderiam. Caso contrário, ganhariam fortunas. Deu no que deu. Em 2007, seu fundo deu retornos espetaculares, e Paulson ganhou — sozinho — 4 bilhões de dólares.

Três anos depois, ele conseguiu retornos ainda maiores apostando na valorização do ouro. Seu bônus foi de 5 bilhões de dólares. Num confronto entre um sujeito desses e um acadêmico de classe média, por mais genial que o acadêmico seja, havia mesmo motivos para ficar com Paulson. Mas, um ano depois, começa a ficar evidente que o professor tinha razão. O bilionário não viu a crise de 2011. 

John Paulson tornou-se um dos protagonistas da onda de pânico que arrasou as bolsas americanas no início de agosto — mas, desta vez, no desconfortável papel de perdedor. Estima-se que seu principal fundo tenha perdido 31% de seu patrimônio no ano.

No dia 8 de agosto, quando o índice Dow Jones teve sua pior queda desde o apogeu da crise de 2008, circularam no mercado americano rumores de que Paulson estava sendo forçado a se desfazer de seus papéis — e que suas vendas forçadas eram as responsáveis pela queda anormal das ações. Krugman, claro, fartou-se: num comentário publicado em seu blog, tratou de espalhar os boatos anti-Paulson. 


O que deu errado? Em seu otimismo, Paulson saiu à compra de ações de bancos americanos. Como se sabe, instituições como Bank of America e Citigroup estiveram entre as maiores vítimas da crise de 2008 — as ações do Citi chegaram a ser negociadas abaixo do valor simbólico de 1 dólar.

Aos poucos, Paulson foi comprando ações dos dois bancões. Acumulou mais de 3,5 bilhões de dólares em papéis das duas instituições. Até o ano passado, a estratégia deu certo. Mas, em 2011, a coisa desandou. De janeiro a agosto, as ações do Citigroup perderam 36% de seu valor.

E os papéis do Bank of America valem hoje a metade do que valiam no início do ano. Em 15 de agosto, Paulson anunciou que havia reduzido pela metade sua participação no Bank of America. Para tornar seu 2011 ainda mais amargo, Paulson caiu num embaraçoso conto da carochinha.

Seu fundo tinha uma grande participação no capital da Sino Forest, empresa que administra florestas na China e na Nova Zelândia. Em junho, uma denúncia de fraude fez com que as ações da empresa caíssem mais de 70% em questão de dias. Paulson vendeu toda a sua participação na empresa, perdendo mais de 700 milhões de dólares.  

É no mínimo curioso que o tropeço de Paulson ocorra justamente no mês em que seu maior rival, o húngaro-americano George Soros, anunciou que vai se aposentar. Nenhum gestor de fundos de hedge deu tanto dinheiro a seus investidores quanto Soros. Foram 35 bilhões de dólares desde 1973.

Com sua série de tacadas bilionárias, Paulson vinha na cola de seu rival mais velho (a diferença de idade entre os dois é de 26 anos): até 2010, ele já havia dado lucros de 32 bilhões de dólares. “Investidores de todo o mundo observam Paulson atentamente, compram o que ele compra, vendem o que ele vende”, diz o jornalista Gregory Zuckerman, autor de um livro sobre o investidor americano.

Com a aposentadoria de Soros, os holofotes se concentraram ainda mais no desempenho de Paulson. E, justo agora, ele está perdendo dinheiro como nunca, desde a criação do fundo, 17 anos atrás.


De acordo com especialistas, os tempos difíceis são típicos de fundos que se tornam grandes demais. Atualmente, Paulson administra 35 bilhões de dólares. “É muito difícil encontrar tantos bons negócios quando se administra uma quantidade muito grande de recursos”, diz Zuckerman. 

Nem tudo está dando errado para Paulson, é bom que se diga. Ele não desfez, por exemplo, suas apostas na valorização do ouro. Seu Gold Fund, criado em 2010, tem aproximadamente 1 bilhão de dólares em ouro. Em seu ano de estreia, rendeu 35%. Um fundo especializado em empresas em crise também está indo bem.

O problema é que a maioria dos investidores de Paulson está em dois fundos que apanharam feio com a recente queda nas ações. O Advantage Plus registra baixa de 31% no ano; e o Advantage, queda de 25%. De acordo com a Hedge Fund Research, a média de perdas dos fundos de hedge no mesmo período foi de 6,1%.

Apesar de seu incrível sucesso nos últimos anos, essa não é a primeira vez que Paulson enfrenta adversidades. Nos anos que antecederam o estouro da bolha imobiliária, ele foi motivo de escárnio. Como o preço dos imóveis teimava em não parar de subir, seus concorrentes o ridicularizaram e os investidores o abandonaram.

Paulson redobrou as apostas. Acabou se tornando a maior estrela de Wall Street. Ele repetirá o feito agora? Mesmo com os dias de pânico do início de agosto, a crise de 2011 ainda está longe de ter a mesma gravidade do pânico de 2008.

E as ações recuperaram parte das perdas na semana seguinte: até dia 15, os papéis do Bank of America haviam recuperado 19% desde a pior queda, de 8 de agosto. Paulson, que raramente dá entrevistas, já afirmou que investe pensando no longo prazo e que variações no preço das ações são algo a esperar.

“Não deixei de confiar no faro dele”, disse a EXAME Charles Krusen, investidor do fundo de Paulson. Paul Krugman já está cantando a vitória na disputa entre acadêmicos e investidores. Uma dose de cautela faria bem ao professor.

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