hero_Harmonização facial: os negócios por trás de fofocas, memes e queixos

As linhas e traços para a harmonização (Getty Images)

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Harmonização facial: os negócios por trás de fofocas, memes e queixos

Para além das polêmicas, a harmonização facial estabeleceu um amplo ecossistema de negócios que movimenta milhões e não para de crescer

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Harmonização facial: os negócios por trás de fofocas, memes e queixos

Para além das polêmicas, a harmonização facial estabeleceu um amplo ecossistema de negócios que movimenta milhões e não para de crescer

As linhas e traços para a harmonização (Getty Images)

Modo escuro

Por Marcos Bonfim

Publicado em 18/04/2023, às 12:13.

Última atualização em 09/08/2023, às 16:14.

Em cinco anos, as pesquisas no Brasil por "harmonização facial" aumentaram 1.215%

Luz, redes sociais e reunião. A harmonização facial é um tema que está aí há algum tempo, mas a pandemia deu um boom. Com câmera ligada, telas o dia inteiro e muitas reuniões, as pessoas começaram a olhar mais para detalhes do rosto que antes passavam despercebidos.

“A pandemia foi um divisor de águas”, diz Giovana Pacini, CEO da Merz no Brasil. A empresa é uma das maiores fabricantes globais de produtos de estética usados em harmonização ao lado de Allegan e Galderma.

A aceleração no número de procedimentos levou a operação brasileira da companhia ao terceiro lugar, atrás apenas de Estados Unidos e Coréia do Sul. No calendário fiscal entre julho de 2020 e junho 2021, o negócio cresceu 85% em faturamento. E, no período seguinte, mais 43% de alta.

“A pandemia trouxe a conscientização do nosso templo. As pessoas começaram a fazer muitos questionamentos do papel do ser humano no nosso mundo e se deram conta da necessidade de cuidados com a mente e com a estética”, afirma Pacini.

O Google Trends ajuda a entender a evolução histórica deste mercado. Em 2017, os dados começam a mostrar o aumento do interesse pelo assunto. E, nos anos 2020, 2019 e 2021, o auge das procuras – setembro de 2020, quando a pandemia arrefeceu pela primeira vez, foi o pico, por exemplo. Em cinco anos, as pesquisas no Brasil por "harmonização facial" aumentaram cerca de 13 vezes, 1.215%.

Além da curiosidade por saber o que significa o termo, o custo e como é feito, as pesquisas estão frequentemente associadas a alguma celebridade que fez o procedimento como carolina dieckmann, Ivete Sangalo, Lucas Lucco e, mais recentemente, o ex-BBB Fred Nicácio, que ganhou um apelido carinhoso sobre a protuberância do queixo. No mundo das fofocas, a harmonização rende cliques, memes e bastante audiência. Na economia, movimenta cada dia mais dinheiro e negócios.

Esse mercado não é auditado  e não conta com números oficiais, mas dados globais mostram a velocidade e o crescimento potencial do setor estético, no qual a harmonização está incluída. A Allied Market Research estimou que essa indústria movimentou US$ 6,23 bilhões em 2021 e deve superar US$ 25,71 em 2031. Se confirmado, o salto ao longo dos 10 anos será de 313%.

Dados do Google Trends sobre as buscas por "harmonização facial" no Brasil

A entrada de novos profissionais

Mesmo antes dos anos pandêmicos, a harmonização facial já atraia a atenção de outras categorias e causava intensos debates. De um lados médicos e cirurgiões plásticos e, do outro, os chamados "não médicos', como enfermeiros, biomédicos e dentistas - esse último pode realizar harmonização orofacial, intervindo na arcada dentária dos pacientes.

Desde que os conselhos federais foram liberando a atuação desses profissionais em procedimentos estéticos, o mercado tem presenciado o boom de negócios relacionados à educação. E não é incomum histórias de profissionais que deixaram as suas áreas de formação para focar nos procedimentos estéticos.

"É um mercado muito rentável e tem tido uma migração muito grande", afirma  Marcelo Augusto Machado, fundador da Face Lab Academy, em Brasília. Passando por uma transição de carreira, ele estudava odontologia e cuidava de redes sociais de alguns consultórios para pagar os boletos quando percebeu uma oportunidade de negócios. Com um sócio, abriu uma escola boutique em 2020 em harmonização facial oferecendo cursos que custam hoje em torno de R$ 30 mil.

No mercado, há muitas oferta com opções de cursos de dois dias, normalmente nos fins de semana. A proposta de Machado foi diferente, oferecer uma plataforma de conteúdos com trilhas teóricas digitais que levam de cinco a seis meses. O presencial fica para os conteúdos práticos.

Desde o lançamento em 2020, a escola formou mais de 200 alunos entre médicos, dentistas, biomédicos, dermatologistas, oftalmologistas e enfermeiros.

Além da venda dos cursos, o instituto oferta a harmonização com esses alunos a potenciais pacientes. O procedimento é negociado a um tíquete médio que gira em torno de R$ 3,5 mil e é acompanhado pelos professores.

Com as duas frentes de negócios, a empresa faturou R$ 7 milhões em 2022, após registrar R$ 6 milhões um ano antes. Agora, a Face Lab investe na construção de uma sede própria em Brasília, com recursos de 2,5 milhões reais, e prevê a entrada no mercado paulista no próximo ano. Além disso, começa a abrir uma terceira frente, locação de espaço para os recém-formados executarem os procedimentos.

Aula online da Face Lab Academy (Divulgação/Face Lab)

Investimentos em novos espaços

Em São Paulo, este é um mercado em que a Opt.Doc tem atacado. Criada com um coworking com a oferta de salas e equipamentos de ponta para médicos e dentistas, o espaço nasceu em 2020 e logo sentiu a alta demanda vinda de especialistas em harmonização. Tanto que precisou readequar algumas salas de atendimento para atender a demanda e ainda infraestrutura, com a aquisição de geladeiras para manter os produtos refrigerados.

Dos 260 médicos que recebe mensalmente, mais de 200 são dentistas e 66% deles trabalham como harmonização orofacial. No faturamento, a prática representa 50% e, na ocupação, 60% de toda a capacidade do espaço.

Outra divisão do negócio está na locação das salas para a oferta de cursos que se concentram no calendário de fim de semana - e fecharam a agenda até o fim do ano. Os conteúdos sobre harmonização respondem por 93% de todo o portfólio.

De acordo com Patrícia del Gaizo, arquiteta e fundadora da Opt.Doc, o lugar já ficou pequeno e a empresa adquiriu mais três imóveis, previstos para entrar em operação ao longo de 2024. Só em equipamentos, ela estima investimentos de R$ 4 milhões em cada unidade - 0 valor pode ser reduzido caso consiga efetivar as parcerias e leasing com fabricantes em negociação.

Também está no radar a expansão por outros territórios como o Rio de Janeiro e Curitiba, no Paraná. A proposta é sair do modelo de financiamento próprio, o bootstrapping, e fechar com donos dos imóveis ou investidores que fazem a reforma do espaço e a Opt.doc entra com os equipamentos e a gestão dos negócios – os investidores ganham parte da receita.

“Quando você tem esse modelo, o negócio vai longe. Você consegue crescer rapidinho”, afirma del Gaizo. Para esse ano, a Opt.Doc projeta faturamento de R$ 4,8 milhões, 78% de alta sobre o ano passado.

Quem também está expandindo o negócio para atender as demandas da harmonização é o empresário e professor Daniel Machado. Ele é o CEO da Pròspere Group, operação que registrou 20 milhões em faturamento no passado, alta de 15% em relação a 2021.

O negócio é formado por três pilares: realização de harmonização, cursos para entrantes e uma distribuidora de produtos de harmonização.

Agora, está lançando a Faces Brasil, uma clínica conceito no Shopping Ibirapuera, em Moema, São Paulo.Com foco no público B e C, a unidade recebeu investimentos de 750 mil reais. Segundo o especialista, o modelo tem a proposta democratizar o acesso e o tíquete médio deve girar em torno de R$ 850,00.

“A gente cobra praticamente o preço do produto com uma margem pequena. Então, a gente consegue manter o mesmo produto, a mesma técnica e a mesma qualidade, mas vamos ter lucro no volume”, afirma Machado.

O preço é menor que um simples consulta cobrada por Machado, R$ 1.490,00, na Próspere Clinic, negócio principal e dialoga com os públicos A e B - o valor é abatido no tratamento se o paciente fechar algum tratamento e fazer no mesmo dia da consulta. Lá, os procedimentos ficam entre R$ 2.000,00 a R$ 5.000,00.

Há ainda opções que requerem maiores desembolsos e podem subir a conta até R$ 50.000,00, incluindo toxinas botulínicas e preenchimento até tratamentos com tecnologias, lasers e ultrassom. No geral, as maiores procuras são por rostos mais desenhados e preenchimentos labiais.

Para o novo negócio, Machado prevê investimentos de R$ 8 milhões e a abertura de 14 novas unidades. “A harmonização facial nunca esteve em tamanha alta. 2023 será o ano deste procedimento”, afirma o executivo. No grupo, a estimativa é de um faturamento de R$ 27 milhões, 35% acima de 2022.

O empresário Daniel Machado está investindo R$ 750 mil em uma nova unidade clínica no Shopping Ibirapuera

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O dia em que o Tom Cruise não apareceu

E como tudo no Brasil – ou quase tudo – acaba na justiça, o direito não poderia ficar de fora deste ecossistema. Quando o procedimento não dá certo ou não ficou do agrado do frequês, a falta de harmonia vai parar na justiça.

O advogado Guilherme Cattani começou no direito da saúde e da estética há alguns anos e se especializou em casos de harmonização facial nos últimos anos. O escritório, fundado há três anos em Balneário Camboriú, reúne mais de 30 profissionais e faturou 6 milhões de reais no ano passado.

A atuação da equipe é sobre todo o ecossistema de negócios da estética e as suas dores como a regularização dos negócios, tributos, questões trabalhistas e de regulamentações aos quais fabricantes de produtos e profissionais da estéticas estão submetidos.

Os casos envolvendo as harmonizações, no entanto, dominam a atenção. No geral, pessoas insatisfeitas com os resultados. “As pessoas se olham e dizem ‘não gostei. Quero o meu dinheiro de volta.’ E aí resolvem entrar na justiça”, afirma. Um dos casos mais emblemáticos que recorda é de homem que queria ficar a cara do Tom Cruise. O resultado não veio – já o processo.

A área de estética tem impactado um outro negócio recém-lançado de Gattani, a abertura de uma empresa de contabilidade para atender o mercado em geral. Hoje, 95% dos clientes são da área de harmonização e do setor de estética, o famoso cross selling. Ao longo do primeiro ano, o negócio fez 100 mil reais por mês.

Os investimentos continuados das empresas para fortalecer o ecossistema que gira em torno de harmonização são sustentados pelas expectativas em relação ao crescimento do mercado. Ainda é pouco democratizado e o número de pessoas que realizaram procedimentos é baixíssimo em relação ao tamanho da população brasileira.

A última pesquisa da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), de 2017, apontou que apenas 13% das pessoas tinham feito algum tipo de intervenção estética facial, 91% pertenciam as classes A e B e 94% eram mulheres.

Com o passar dos anos, o mercado enxerga algumas tendências como o início cada vez mais cedo da atenção e cuidados com a pele, a participação masculina ganhando corpo, democratização dos procedimentos com custos mais baixos ao longo dos anos e a derrubada de mitos e medos sobre os processos e os resultados.

“E ainda, as pessoas estão vivendo mais tempo e o que tenho notado é que tenho pacientes mais velhos querendo se tratar, melhorar a autoestima e a qualidade de vida. Tenho pacientes de 85 fazendo tratamentos estéticos. É muito diferente de antigamente”, afirma Eliza Minami, membro titular da SBCP.

Enquanto isso, cresce também a defesa para que os procedimentos entreguem resultados mais naturais e alinhados com os rostos dos pacientes - e não algo parecido uma linha de produção. E que chama tanta atenção em memes nas redes sociais.  

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