Em busca da eficiência com 5 empreendedores
Conheça 5 empreendedores cujos negócios estão aumentando a competitividade da economia brasileira
Da Redação
Publicado em 14 de fevereiro de 2014 às 17h56.
São Paulo - Nos últimos dez anos, o Produto Interno Bruto brasileiro avançou cerca de 40% — e o país subiu seis posições na lista das maiores economias mundiais, conquistando o sétimo lugar. O emprego formal e os salários também cresceram. Mas a produtividade média da mão de obra, das máquinas e de outros recursos não acompanhou esse ritmo.
Em 2012, foram necessários cinco brasileiros para produzir o mesmo que apenas um americano, de acordo com dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico. E, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a produtividade do conjunto dos trabalhadores brasileiros, quando considerados fatores como escolaridade e equipamentos, está praticamente estagnada há 30 anos.
Entre 2001 e 2011, apenas 26% do crescimento da economia veio de ganhos em eficiência, segundo o Boston Consulting Group. Baixa qualidade do ensino profissional, investimentos equivocados em inovação e tecnologia e maquinário obsoleto nas indústrias estão entre os principais entraves.
Os empreendedores que aparecem nesta reportagem, a décima da série Sou Empreendedor — Meu Sonho Move o Brasil, estão à frente de cinco empresas emergentes. Elas têm desempenhado um papel importante para ajudar a reverter esse quadro ao desenvolver produtos e serviços que atacam males que estão na raiz da improdutividade.
A Audaces, de Florianópolis, criou uma tecnologia que permite diminuir o tempo gasto pelas confecções no processo entre fazer o primeiro esboço de um vestido e colocá-lo na vitrine da loja. A paulista Paragon é contratada por grandes empresas para detectar pontos que podem ser melhorados em seus processos.
Em Nova Mutum, em Mato Grosso, a Unigeo faz diagnósticos de alta precisão para a agricultura com base em tecnologias que combinam sensores com GPS e drones que tiram fotos aéreas das plantações. O escritório Indio da Costa, que faz projetos de design de produtos, considera todo o ciclo de sua fabricação, o que permite economizar materiais e dispensar etapas que trazem mais custos do que benefícios.
No Rio de Janeiro, a Agência Cravo desenvolve cursos específcos para empresas que, por falta de opção, são obrigadas a recrutar profissionais que saíram da escola despreparados para as exigências do mercado de trabalho. Conheça suas histórias.
Automação no corte e na costura
Todos os anos, os estilistas da fabricante de roupas paranaense Morena Rosa fazem longas viagens em busca de inspiração para as novas coleções da marca. Um destino recente foi a Califórnia, onde surfistas e skatistas criam seus próprios estilos de se vestir, que podem variar de uma praia para outra.
Outro lugar foi a selva amazônica. Ali, eles vivenciaram costumes locais e viram de que forma os indígenas combinavam cores e estampas. Com essas referências, os estilistas fazem os primeiros esboços — e desses rabiscos nasce todo um processo de criatividade que se materializa nas coleções dispostas na vitrine das lojas.
Ao todo, são seis coleções por ano, uma a cada 60 dias. "Moda é um artigo perecível", diz Silas Gabriel Filho, responsável por controlar o fluxo de produção da Morena Rosa. "A fábrica tem de ser eficiente para acompanhar o ritmo do mercado."
De 2010 a 2011, a Morena Rosa investiu 600.000 reais em máquinas — apenas 2% do faturamento anual —, que aumentaram em 30% a velocidade da criação de moldes e do corte de tecidos. Esse ganho acontece em fases críticas da cadeia de produção. Antes, os modelistas tinham de riscar cada molde num papel usando régua e compasso.
"São, em média, 130 por coleção, que eram desenhados um por um", diz Renata Garuti, modelista da Morena Rosa. Do jeito antigo, os moldes eram fixados com alfnetes no tecido, que era cortado com tesoura. Com a automação, os moldes são desenhados com um software, que garante que as partes de cada roupa se encaixem com precisão. Enquanto isso, outra máquina faz o corte do tecido.
A automação trouxe mais rapidez para as fábricas da Morena Rosa. "Ganhamos quase um mês ao longo do ano", diz Gabriel Filho. "Em nosso mercado, isso representa um grande aumento de produtividade."
Os softwares e as novas máquinas foram desenvolvidos pela catarinense Audaces, empresa que se especializou em melhorar processos no setor têxtil. "Muitas confecções perdem mercado porque a tecnologia defasada pesa nos custos", afirma Claudio Grando, de 44 anos, sócio da Audaces.
A lista de clientes tem desde pequenos estilistas até marcas que desfilam na São Paulo Fashion Week, como Cavalera e Animale. Nos últimos três anos, as receitas da empresa triplicaram, atingindo 100 milhões de reais em 2013, segundo estimativas de mercado. A ideia da Audaces surgiu quando Grando e seu sócio, Ricardo Cunha, de 44 anos, cursavam ciências da computação na Universidade Federal de Santa Catarina.
Os dois desenvolveram um sofware que programava máquinas para cortar chapas de madeira e aço para indústrias moveleiras e metalúrgicas. "Tínhamos uma tecnologia básica, que poderia ser adaptada para outros setores", afirma Grando. "Percebemos uma oportunidade nas confecções."
Na corrida pela competitividade global, o setor têxtil brasileiro — que representa 9% do PIB indus-trial e emprega cerca de 1 milhão de pessoas — tem ficado para trás. Nos últimos seis anos, o déficit na balança comercial do setor cresceu 1.834%.
"A maior parte do problema é que a tecnologia de um grande número de empresas é atrasada, o que compromete a eficiência no uso dos recursos", afirma Roberto Piancó, especialista em tecnologia têxtil, que atuou por 19 anos no Grupo Malwee.
A obsolescência não é uma realidade exclusiva do setor têxtil. Em média, o maquinário de todo o parque fabril instalado no país tem 17 anos de tempo de uso. Nos Estados Unidos tem sete, e na Alemanha, cinco.
"Máquinas novas consomem menos energia e podem ser mais fáceis de manusear, o que por si só já aumenta a produtividade", diz João Emílio Gonçalves, coordenador de economia industrial da Confederação Nacional da Indústria, a CNI.
Desenho que ajuda a economizar
Da prancheta do designer carioca Guto Indio da Costa, de 42 anos, saem protótipos de todo tipo de produto — geladeira, fogão, garrafa térmica, ventilador. Diferentemente de muitos de seus colegas de profssão, Indio da Costa e sua equipe não estão preocupados apenas com a beleza e o charme de suas criações.
"Um trabalho de design precisa considerar o ciclo completo da fabricação do objeto projetado", diz ele. "O desenho não deve ter detalhes que provoquem desperdício de material nem que difcultem sua produção em escala industrial."
Indio da Costa conta ter feito mais de 200 projetos de design industrial em 20 anos. Um deles foi o de uma garrafa térmica para a marca Alladin, do Rio de Janeiro. As garrafas da Alladin eram largas e tinham alças para serem manuseadas. Indio da Costa criou uma garrafa mais alta e fna, que podia ser segurada com uma das mãos. "Esse modelo usa quase 30% menos material do que os outros da empresa", diz ele.
O escritório foi procurado por fabricantes de eletrodomésticos, como General Electric e Mabe, que também precisavam reduzir custos a partir do projeto dos produtos. Nos últimos anos, Indio da Costa tem se dedicado mais a criar produtos do zero e oferecê-los a fabricantes, em vez de só trabalhar por encomenda.
Uma dessas criações foi um ventilador de teto com lâmpadas de LED. "Elas são bem menores do que as incandescentes, o que permitiu que a cúpula fosse bem pequenininha", diz.
O produto passou a ser fabricado em dezembro pela Plajet, fabricante carioca de utensílios de plástico, como saboneteiras, toalheiros e ventiladores. "O novo modelo custa cerca de 40% menos do que os importados chineses", diz Paulo Vignolli, sócio da Plajet.
Em 2012, o escritório de Indio da Costa faturou 8 milhões de reais, 15% mais do que no ano anterior. "Quase metade das receitas veio de trabalhos de design industrial", diz Indio da Costa. "A outra, de projetos de arquitetura e urbanismo."
São altas as chances de o escritório de Indio da Costa — e de outros negócios emergentes ligados a design — crescer com o design industrial no Brasil. Uma pesquisa da CNI mostrou que o design vem subindo na lista de prioridades estratégicas das grandes empresas.
"O desenho industrial se tornou uma ferramenta de produtividade", diz Gustavo Gelli, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Design.
Removendo as pedras do caminho
O tenente-coronel Marcello Costa, de 41 anos, trabalha numa divisão do Exército que faz obras em estradas e aeroportos públicos. No início de 2011, Costa recebeu a missão de coordenar a ampliação do pátio de aviões do aeroporto de Guarulhos, o mais movimentado do país.
A Infraero, que controlava o aeroporto na época, havia determinado que o novo pátio tinha de ser entregue a tempo de ser construído ali um novo terminal de passageiros antes da Copa do Mundo de 2014. Costa tinha todos os motivos do mundo para ficar muito estressado.
Os cálculos do Exército previam que o pátio ficaria pronto só no segundo semestre de 2013. "Seria muito apertado erguer um terminal inteiro antes dos jogos", diz Costa. O pátio acabou fcando pronto em dezembro de 2012 — quase um ano antes do que estava no papel. Como isso foi possível?
Durante os trabalhos, o Exército contratou a Paragon, empresa de São Paulo que analisa processos industriais e projetos de infraestrutura. "Detectamos tudo o que pode dar errado", diz o engenheiro Luiz Augusto Franzese, de 45 anos, sócio da empresa desde a fundação, em 1992.
A Paragon simula as condições de trabalho dos clientes numa espécie de jogo em 3D. "Conseguimos enxergar o processo inteiro funcionando", diz Franzese.
No projeto de Guarulhos, a animação reproduzia como a obra seria tocada de acordo com os planos do Exército e o movimento do aeroporto hoje em dia. Caminhãozinho vai, caminhãozinho vem, aviãozinho sobe, aviãozinho desce, algo chamou a atenção dos engenheiros da Paragon.
A animação mostrava 15 escavadeiras rasgando o solo e 400 caminhões levando a terra retirada até um aterro destinado a receber os resíduos da obra. O aterro ficava a 40 quilômetros dali, o que já não é perto. Para piorar, havia o trânsito na rodovia Hélio Smidt, que dá acesso ao aeroporto e que seria usada na obra de verdade.
Pela manhã e no fim da tarde, horários de maior movimento no aeroporto, a animação mostrava filas de caminhões presos em congestionamentos. Nessas horas, eles demorariam muito mais para chegar ao canteiro do que em horários de trânsito livre.
"Os atrasos causariam uma falta de veículos para escoar a terra do canteiro durante metade do expediente", diz Costa. "Isso nos obrigaria a parar as escavadeiras, um dos principais motivos que fariam os trabalhos demorar tanto."
Muitas simulações foram feitas. Num dos cenários, aumentou-se o número de escavadeiras no canteiro. Noutro, mudou-se a ordem das tarefas. E por aí vai. Mas o problema era complicado de resolver — ou porque a execução dos trabalhos ficava mais difícil ou porque o custo aumentava. Em alguns casos, a alternativa era pior do que o problema.
Surgiu, então, a ideia de reservar um terreno no canteiro de obras para funcionar como aterro temporário. Seis caminhões levariam a terra escavada até lá. Depois, outros 230 veículos fariam o trajeto até o aterro definitivo.
"As escavadeiras trabalhariam sem interrupção em 96% do expediente", diz Costa. "E ainda reduziria 40% o número de caminhões utilizados." Assim foi feito, e o pátio ficou pronto dez meses antes do previsto inicialmente.
Em 2012, a Paragon faturou 8 milhões de reais — 20% acima de 2011. Entre os clientes estão mineradoras, siderúrgicas e empresas de óleo e gás, como Petrobras, Arcelor Mittal e Vale. "São negócios com muitos processos complexos e cada vez mais interligados", diz Franzese. "Essas empresas nos contratam para que as ajudemos a sincronizá-los."
Dornes e sensores na lavoura
Quem trafega pela BR-163 nas cercanias de Nova Mutum, cidadezinha de 30.000 habitantes no norte do Mato Grosso, vê quilômetros e quilômetros de terra vermelha em abril e setembro — meses em que o solo é preparado para o plantio de soja, milho e algodão.
Grande parte da área é do administrador Frederico Krakauer, de 38 anos. Krakauer começou a cuidar da fazenda da família nos anos 90. Na época, ele estava muito empenhado em aumentar a produção das plantações. "Eu aplicava fertilizantes caros, mas não adiantava muito", diz Krakauer. "A gente, então, aumentava a dose, mas o resultado era decepcionante."
Em 2005, uma nova empresa foi instalada em Nova Mutum — a Unigeo, que presta serviços de agricultura de alta precisão. "Ajudamos os agricultores a entender como funciona o ecossistema de suas lavouras", diz o engenheiro agrônomo Leonardo Gomes Cândido, de 37 anos, fundador da empresa.
Não é uma tarefa simples — as condições do solo podem variar em um mesmo terreno. "Não adianta pegar uma amostra e fazer um diagnóstico geral", diz ele. No caso da nutrição do solo, as necessidades de um determinado ponto podem não ser as mesmas de outro, a poucos metros de distância.
Era o que parecia estar acontecendo nas terras de Krakauer. O diagnóstico dependia de exames tão detalhados como os de um check-up médico. Os técnicos da Unigeo começaram a monitorar os sinais vitais do paciente. Sensores equipados com GPS foram enfados na terra para fazer um levantamento das variações de umidade de um lugar para outro.
Imagens de satélite de anos anteriores foram escarafunchadas para mostrar se alguma alteração no ambiente poderia estar relacionada à fraqueza da terra. E até drones foram enviados com a missão de fotografar as plantações do alto, para conferir se as áreas em que o verde era mais verde correspondiam às de maior fertilidade.
Os técnicos da Unigeo chegaram à conclusão de que eram relativamente poucos os trechos em que a fertilidade natural do solo era significativamente baixa — neles era realmente necessário colocar grande quantidade de adubo. Na maior parte, o paciente estava em boas condições de saúde.
"Aplicávamos a mesma proporção de fertilizantes na fazenda inteira", diz Krakauer. "Faltava fertilizante em algumas plantações e, ao mesmo tempo, havia desperdício em outras." Com a prescrição correta, a quantidade de insumos aplicada baixou 30% — e se manteve estável nas colheitas seguintes.
Com menos despesas, Krakauer pôde fazer novos investimentos, que ajudaram a aumentar a produtividade. Em oito anos, o número de sacas colhidas por hectare cresceu 10%. Em 2012, a Unigeo faturou 24 milhões de reais — 50% mais do que no ano anterior. Em parte a expansão veio da diversificação de serviços.
No início, a Unigeo fazia apenas mapas de fertilidade, como o encomendado por Krakauer. "Hoje, mapeamos também outros aspectos, como produtividade das máquinas e níveis de irrigação no solo", diz Cândido. "Há sempre alguma coisa a ser melhorada."
A sala de aula é na firma
A administradora Cristiane Brandão, de 37 anos, é sócia da Agência Cravo, empresa carioca que faz cursos customizados de capacitação de mão de obra para grandes empresas. "As empresas têm dificuldade para contratar profissionais qualificados e acabam empregando funcionários medianos, que precisam ser treinados para trabalhar com efciência", afirma Cristiane.
Antes de montar um curso, a Cravo desenha um cenário. São identificadas as áreas e os cargos com mais rotatividade, para saber o que leva o funcionário a pedir demissão. Reuniões com diretores da empresa servem para conhecer os setores menos eficientes e as metas de crescimento do ano.
Os funcionários costumam ser ouvidos para que expliquem suas dificuldades de aprendizado e apontem quais treinamentos serão realmente úteis no dia a dia. É feito um levantamento da velocidade da internet da empresa e de como os funcionários lidam com a tecnologia — se têm notebooks ou smartphones.
A pesquisa é importante para a Cravo definir o formato do curso, que pode ser online ou presencial, e o material didático, que pode incluir livros, vídeos e jogos. A qualificação de mão de obra é um desafo no Brasil. De acordo com pesquisa da consultoria McKinsey, mais de dois terços dos empregadores no país consideram que os universitários recém-formados não estão prontos para o mercado de trabalho.
E, segundo pesquisa do Instituto Paulo Montenegro, 26% dos estudantes da 6a à 9a série do ensino fundamental não entendem textos curtos nem sabem contar dinheiro.
São Paulo - Nos últimos dez anos, o Produto Interno Bruto brasileiro avançou cerca de 40% — e o país subiu seis posições na lista das maiores economias mundiais, conquistando o sétimo lugar. O emprego formal e os salários também cresceram. Mas a produtividade média da mão de obra, das máquinas e de outros recursos não acompanhou esse ritmo.
Em 2012, foram necessários cinco brasileiros para produzir o mesmo que apenas um americano, de acordo com dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico. E, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a produtividade do conjunto dos trabalhadores brasileiros, quando considerados fatores como escolaridade e equipamentos, está praticamente estagnada há 30 anos.
Entre 2001 e 2011, apenas 26% do crescimento da economia veio de ganhos em eficiência, segundo o Boston Consulting Group. Baixa qualidade do ensino profissional, investimentos equivocados em inovação e tecnologia e maquinário obsoleto nas indústrias estão entre os principais entraves.
Os empreendedores que aparecem nesta reportagem, a décima da série Sou Empreendedor — Meu Sonho Move o Brasil, estão à frente de cinco empresas emergentes. Elas têm desempenhado um papel importante para ajudar a reverter esse quadro ao desenvolver produtos e serviços que atacam males que estão na raiz da improdutividade.
A Audaces, de Florianópolis, criou uma tecnologia que permite diminuir o tempo gasto pelas confecções no processo entre fazer o primeiro esboço de um vestido e colocá-lo na vitrine da loja. A paulista Paragon é contratada por grandes empresas para detectar pontos que podem ser melhorados em seus processos.
Em Nova Mutum, em Mato Grosso, a Unigeo faz diagnósticos de alta precisão para a agricultura com base em tecnologias que combinam sensores com GPS e drones que tiram fotos aéreas das plantações. O escritório Indio da Costa, que faz projetos de design de produtos, considera todo o ciclo de sua fabricação, o que permite economizar materiais e dispensar etapas que trazem mais custos do que benefícios.
No Rio de Janeiro, a Agência Cravo desenvolve cursos específcos para empresas que, por falta de opção, são obrigadas a recrutar profissionais que saíram da escola despreparados para as exigências do mercado de trabalho. Conheça suas histórias.
Automação no corte e na costura
Todos os anos, os estilistas da fabricante de roupas paranaense Morena Rosa fazem longas viagens em busca de inspiração para as novas coleções da marca. Um destino recente foi a Califórnia, onde surfistas e skatistas criam seus próprios estilos de se vestir, que podem variar de uma praia para outra.
Outro lugar foi a selva amazônica. Ali, eles vivenciaram costumes locais e viram de que forma os indígenas combinavam cores e estampas. Com essas referências, os estilistas fazem os primeiros esboços — e desses rabiscos nasce todo um processo de criatividade que se materializa nas coleções dispostas na vitrine das lojas.
Ao todo, são seis coleções por ano, uma a cada 60 dias. "Moda é um artigo perecível", diz Silas Gabriel Filho, responsável por controlar o fluxo de produção da Morena Rosa. "A fábrica tem de ser eficiente para acompanhar o ritmo do mercado."
De 2010 a 2011, a Morena Rosa investiu 600.000 reais em máquinas — apenas 2% do faturamento anual —, que aumentaram em 30% a velocidade da criação de moldes e do corte de tecidos. Esse ganho acontece em fases críticas da cadeia de produção. Antes, os modelistas tinham de riscar cada molde num papel usando régua e compasso.
"São, em média, 130 por coleção, que eram desenhados um por um", diz Renata Garuti, modelista da Morena Rosa. Do jeito antigo, os moldes eram fixados com alfnetes no tecido, que era cortado com tesoura. Com a automação, os moldes são desenhados com um software, que garante que as partes de cada roupa se encaixem com precisão. Enquanto isso, outra máquina faz o corte do tecido.
A automação trouxe mais rapidez para as fábricas da Morena Rosa. "Ganhamos quase um mês ao longo do ano", diz Gabriel Filho. "Em nosso mercado, isso representa um grande aumento de produtividade."
Os softwares e as novas máquinas foram desenvolvidos pela catarinense Audaces, empresa que se especializou em melhorar processos no setor têxtil. "Muitas confecções perdem mercado porque a tecnologia defasada pesa nos custos", afirma Claudio Grando, de 44 anos, sócio da Audaces.
A lista de clientes tem desde pequenos estilistas até marcas que desfilam na São Paulo Fashion Week, como Cavalera e Animale. Nos últimos três anos, as receitas da empresa triplicaram, atingindo 100 milhões de reais em 2013, segundo estimativas de mercado. A ideia da Audaces surgiu quando Grando e seu sócio, Ricardo Cunha, de 44 anos, cursavam ciências da computação na Universidade Federal de Santa Catarina.
Os dois desenvolveram um sofware que programava máquinas para cortar chapas de madeira e aço para indústrias moveleiras e metalúrgicas. "Tínhamos uma tecnologia básica, que poderia ser adaptada para outros setores", afirma Grando. "Percebemos uma oportunidade nas confecções."
Na corrida pela competitividade global, o setor têxtil brasileiro — que representa 9% do PIB indus-trial e emprega cerca de 1 milhão de pessoas — tem ficado para trás. Nos últimos seis anos, o déficit na balança comercial do setor cresceu 1.834%.
"A maior parte do problema é que a tecnologia de um grande número de empresas é atrasada, o que compromete a eficiência no uso dos recursos", afirma Roberto Piancó, especialista em tecnologia têxtil, que atuou por 19 anos no Grupo Malwee.
A obsolescência não é uma realidade exclusiva do setor têxtil. Em média, o maquinário de todo o parque fabril instalado no país tem 17 anos de tempo de uso. Nos Estados Unidos tem sete, e na Alemanha, cinco.
"Máquinas novas consomem menos energia e podem ser mais fáceis de manusear, o que por si só já aumenta a produtividade", diz João Emílio Gonçalves, coordenador de economia industrial da Confederação Nacional da Indústria, a CNI.
Desenho que ajuda a economizar
Da prancheta do designer carioca Guto Indio da Costa, de 42 anos, saem protótipos de todo tipo de produto — geladeira, fogão, garrafa térmica, ventilador. Diferentemente de muitos de seus colegas de profssão, Indio da Costa e sua equipe não estão preocupados apenas com a beleza e o charme de suas criações.
"Um trabalho de design precisa considerar o ciclo completo da fabricação do objeto projetado", diz ele. "O desenho não deve ter detalhes que provoquem desperdício de material nem que difcultem sua produção em escala industrial."
Indio da Costa conta ter feito mais de 200 projetos de design industrial em 20 anos. Um deles foi o de uma garrafa térmica para a marca Alladin, do Rio de Janeiro. As garrafas da Alladin eram largas e tinham alças para serem manuseadas. Indio da Costa criou uma garrafa mais alta e fna, que podia ser segurada com uma das mãos. "Esse modelo usa quase 30% menos material do que os outros da empresa", diz ele.
O escritório foi procurado por fabricantes de eletrodomésticos, como General Electric e Mabe, que também precisavam reduzir custos a partir do projeto dos produtos. Nos últimos anos, Indio da Costa tem se dedicado mais a criar produtos do zero e oferecê-los a fabricantes, em vez de só trabalhar por encomenda.
Uma dessas criações foi um ventilador de teto com lâmpadas de LED. "Elas são bem menores do que as incandescentes, o que permitiu que a cúpula fosse bem pequenininha", diz.
O produto passou a ser fabricado em dezembro pela Plajet, fabricante carioca de utensílios de plástico, como saboneteiras, toalheiros e ventiladores. "O novo modelo custa cerca de 40% menos do que os importados chineses", diz Paulo Vignolli, sócio da Plajet.
Em 2012, o escritório de Indio da Costa faturou 8 milhões de reais, 15% mais do que no ano anterior. "Quase metade das receitas veio de trabalhos de design industrial", diz Indio da Costa. "A outra, de projetos de arquitetura e urbanismo."
São altas as chances de o escritório de Indio da Costa — e de outros negócios emergentes ligados a design — crescer com o design industrial no Brasil. Uma pesquisa da CNI mostrou que o design vem subindo na lista de prioridades estratégicas das grandes empresas.
"O desenho industrial se tornou uma ferramenta de produtividade", diz Gustavo Gelli, presidente da Associação Brasileira de Empresas de Design.
Removendo as pedras do caminho
O tenente-coronel Marcello Costa, de 41 anos, trabalha numa divisão do Exército que faz obras em estradas e aeroportos públicos. No início de 2011, Costa recebeu a missão de coordenar a ampliação do pátio de aviões do aeroporto de Guarulhos, o mais movimentado do país.
A Infraero, que controlava o aeroporto na época, havia determinado que o novo pátio tinha de ser entregue a tempo de ser construído ali um novo terminal de passageiros antes da Copa do Mundo de 2014. Costa tinha todos os motivos do mundo para ficar muito estressado.
Os cálculos do Exército previam que o pátio ficaria pronto só no segundo semestre de 2013. "Seria muito apertado erguer um terminal inteiro antes dos jogos", diz Costa. O pátio acabou fcando pronto em dezembro de 2012 — quase um ano antes do que estava no papel. Como isso foi possível?
Durante os trabalhos, o Exército contratou a Paragon, empresa de São Paulo que analisa processos industriais e projetos de infraestrutura. "Detectamos tudo o que pode dar errado", diz o engenheiro Luiz Augusto Franzese, de 45 anos, sócio da empresa desde a fundação, em 1992.
A Paragon simula as condições de trabalho dos clientes numa espécie de jogo em 3D. "Conseguimos enxergar o processo inteiro funcionando", diz Franzese.
No projeto de Guarulhos, a animação reproduzia como a obra seria tocada de acordo com os planos do Exército e o movimento do aeroporto hoje em dia. Caminhãozinho vai, caminhãozinho vem, aviãozinho sobe, aviãozinho desce, algo chamou a atenção dos engenheiros da Paragon.
A animação mostrava 15 escavadeiras rasgando o solo e 400 caminhões levando a terra retirada até um aterro destinado a receber os resíduos da obra. O aterro ficava a 40 quilômetros dali, o que já não é perto. Para piorar, havia o trânsito na rodovia Hélio Smidt, que dá acesso ao aeroporto e que seria usada na obra de verdade.
Pela manhã e no fim da tarde, horários de maior movimento no aeroporto, a animação mostrava filas de caminhões presos em congestionamentos. Nessas horas, eles demorariam muito mais para chegar ao canteiro do que em horários de trânsito livre.
"Os atrasos causariam uma falta de veículos para escoar a terra do canteiro durante metade do expediente", diz Costa. "Isso nos obrigaria a parar as escavadeiras, um dos principais motivos que fariam os trabalhos demorar tanto."
Muitas simulações foram feitas. Num dos cenários, aumentou-se o número de escavadeiras no canteiro. Noutro, mudou-se a ordem das tarefas. E por aí vai. Mas o problema era complicado de resolver — ou porque a execução dos trabalhos ficava mais difícil ou porque o custo aumentava. Em alguns casos, a alternativa era pior do que o problema.
Surgiu, então, a ideia de reservar um terreno no canteiro de obras para funcionar como aterro temporário. Seis caminhões levariam a terra escavada até lá. Depois, outros 230 veículos fariam o trajeto até o aterro definitivo.
"As escavadeiras trabalhariam sem interrupção em 96% do expediente", diz Costa. "E ainda reduziria 40% o número de caminhões utilizados." Assim foi feito, e o pátio ficou pronto dez meses antes do previsto inicialmente.
Em 2012, a Paragon faturou 8 milhões de reais — 20% acima de 2011. Entre os clientes estão mineradoras, siderúrgicas e empresas de óleo e gás, como Petrobras, Arcelor Mittal e Vale. "São negócios com muitos processos complexos e cada vez mais interligados", diz Franzese. "Essas empresas nos contratam para que as ajudemos a sincronizá-los."
Dornes e sensores na lavoura
Quem trafega pela BR-163 nas cercanias de Nova Mutum, cidadezinha de 30.000 habitantes no norte do Mato Grosso, vê quilômetros e quilômetros de terra vermelha em abril e setembro — meses em que o solo é preparado para o plantio de soja, milho e algodão.
Grande parte da área é do administrador Frederico Krakauer, de 38 anos. Krakauer começou a cuidar da fazenda da família nos anos 90. Na época, ele estava muito empenhado em aumentar a produção das plantações. "Eu aplicava fertilizantes caros, mas não adiantava muito", diz Krakauer. "A gente, então, aumentava a dose, mas o resultado era decepcionante."
Em 2005, uma nova empresa foi instalada em Nova Mutum — a Unigeo, que presta serviços de agricultura de alta precisão. "Ajudamos os agricultores a entender como funciona o ecossistema de suas lavouras", diz o engenheiro agrônomo Leonardo Gomes Cândido, de 37 anos, fundador da empresa.
Não é uma tarefa simples — as condições do solo podem variar em um mesmo terreno. "Não adianta pegar uma amostra e fazer um diagnóstico geral", diz ele. No caso da nutrição do solo, as necessidades de um determinado ponto podem não ser as mesmas de outro, a poucos metros de distância.
Era o que parecia estar acontecendo nas terras de Krakauer. O diagnóstico dependia de exames tão detalhados como os de um check-up médico. Os técnicos da Unigeo começaram a monitorar os sinais vitais do paciente. Sensores equipados com GPS foram enfados na terra para fazer um levantamento das variações de umidade de um lugar para outro.
Imagens de satélite de anos anteriores foram escarafunchadas para mostrar se alguma alteração no ambiente poderia estar relacionada à fraqueza da terra. E até drones foram enviados com a missão de fotografar as plantações do alto, para conferir se as áreas em que o verde era mais verde correspondiam às de maior fertilidade.
Os técnicos da Unigeo chegaram à conclusão de que eram relativamente poucos os trechos em que a fertilidade natural do solo era significativamente baixa — neles era realmente necessário colocar grande quantidade de adubo. Na maior parte, o paciente estava em boas condições de saúde.
"Aplicávamos a mesma proporção de fertilizantes na fazenda inteira", diz Krakauer. "Faltava fertilizante em algumas plantações e, ao mesmo tempo, havia desperdício em outras." Com a prescrição correta, a quantidade de insumos aplicada baixou 30% — e se manteve estável nas colheitas seguintes.
Com menos despesas, Krakauer pôde fazer novos investimentos, que ajudaram a aumentar a produtividade. Em oito anos, o número de sacas colhidas por hectare cresceu 10%. Em 2012, a Unigeo faturou 24 milhões de reais — 50% mais do que no ano anterior. Em parte a expansão veio da diversificação de serviços.
No início, a Unigeo fazia apenas mapas de fertilidade, como o encomendado por Krakauer. "Hoje, mapeamos também outros aspectos, como produtividade das máquinas e níveis de irrigação no solo", diz Cândido. "Há sempre alguma coisa a ser melhorada."
A sala de aula é na firma
A administradora Cristiane Brandão, de 37 anos, é sócia da Agência Cravo, empresa carioca que faz cursos customizados de capacitação de mão de obra para grandes empresas. "As empresas têm dificuldade para contratar profissionais qualificados e acabam empregando funcionários medianos, que precisam ser treinados para trabalhar com efciência", afirma Cristiane.
Antes de montar um curso, a Cravo desenha um cenário. São identificadas as áreas e os cargos com mais rotatividade, para saber o que leva o funcionário a pedir demissão. Reuniões com diretores da empresa servem para conhecer os setores menos eficientes e as metas de crescimento do ano.
Os funcionários costumam ser ouvidos para que expliquem suas dificuldades de aprendizado e apontem quais treinamentos serão realmente úteis no dia a dia. É feito um levantamento da velocidade da internet da empresa e de como os funcionários lidam com a tecnologia — se têm notebooks ou smartphones.
A pesquisa é importante para a Cravo definir o formato do curso, que pode ser online ou presencial, e o material didático, que pode incluir livros, vídeos e jogos. A qualificação de mão de obra é um desafo no Brasil. De acordo com pesquisa da consultoria McKinsey, mais de dois terços dos empregadores no país consideram que os universitários recém-formados não estão prontos para o mercado de trabalho.
E, segundo pesquisa do Instituto Paulo Montenegro, 26% dos estudantes da 6a à 9a série do ensino fundamental não entendem textos curtos nem sabem contar dinheiro.