Os irmãos Leonardo e Leandro, donos da Ecoville (Endeavor/Divulgação)
Mariana Desidério
Publicado em 14 de abril de 2018 às 08h00.
Última atualização em 14 de abril de 2018 às 08h00.
Leonardo e Leandro tinham menos de 5 anos. Mas até hoje lembram do que o pai, José Edmar Castelo, dizia para eles. Formado em engenharia e chefe de manutenção de uma grande empresa, ele enxergava para os filhos um futuro empreendedor.
– Um dia, vocês vão ser os melhores no que fazem. Mas, para isso, precisam pensar grande.
Até Leonardo completar 18 anos, e seu irmão 14, a família não passava muito tempo no mesmo endereço. Já tinham morado em São Paulo, Uberlândia e Salvador. As mudanças constantes, motivadas pelo emprego do pai, uniram muito a família: os dois irmãos, a irmã e os pais. Longe dos outros parentes, eles se apoiavam entre si para adaptarem-se às mudanças e à dinâmica das novas cidades.
Quando chegou o momento de escolher a faculdade, os irmãos não tiveram dúvidas: seguiriam a carreira do pai. O conselho que sempre ouviram para pensarem grande ressoava tanto neles que o desempenho dos dois irmãos costumava ser acima da média. Aos 17 anos, por exemplo, Leonardo fez um tecnólogo em Eletromecânica, o que abriu as portas para trabalhar em uma multinacional, liderando o time de Manutenção, num processo seletivo que envolveu 64 pessoas.
De volta a São Paulo, os irmãos e o pai decidiram abrir uma empresa de automação. Apesar de sempre sonharem em atingir muitas pessoas de forma escalável, aquele modelo de negócio não os levava por esse caminho. Um ano depois, fecharam as portas.
Andando pelas ruas de seu bairro, com a cabeça fervilhando de ideias sobre o próximo negócio, Leonardo e Leandro ouviram um carro de som. A voz do locutor ecoava pelas ruas vinda de uma caminhonete que quase tombava de tão pesada. Nela, produtos de limpeza caseiros eram vendidos em garrafas PET e pequenos barris empilhados. Apesar do improviso, os dois irmãos viam as portas das casas se abrindo, as vendas acontecendo e um modelo de negócios que se desenhava bem diante deles.
O problema é que a concorrência em São Paulo não faria dessa uma boa cidade para começar. A infância itinerante trouxe aos irmãos desprendimento suficiente para olharem o mapa do Brasil em busca da cidade com melhores oportunidades para o novo negócio. A pesquisa que fizeram sobre mercados potenciais chegou a um ponto do mapa: Joinville, em Santa Catarina. Porém, a mudança não foi tão simples. Seria preciso uma reunião de família para acertar os detalhes: os irmãos, suas esposas, os pais e a irmã.
No plano, Leonardo e Leandro se mudariam primeiro, já que não tinham condições de levar todos de uma vez. Os dois venderam seus carros, duas caminhonetes Silverado, juntaram todo capital que tinham e investiram na construção de um pequeno galpão e na compra de duas Kombis para fazer a venda direta. A certeza sobre esse caminho era tão grande que Leandro chegou a se separar da esposa, que não concordava com a mudança.
Apesar do planejamento, os irmãos consideram esse movimento inicial um erro de cálculo. “Nós gastamos tudo com a construção de um pequeno galpão. Começamos errado: em vez de alugar, decidimos construir. Não sobrou mais nada.”, conta Leonardo. Esse aperto financeiro abalou a família toda. Em São Paulo, todo mundo foi morar em uma única casa, para economizar o aluguel. Já em Joinville, os irmãos passaram dois anos dormindo no galpão: fabricando os produtos de limpeza à noite e vendendo durante o dia nas kombis que adquiriram. Leonardo conta que “não tinha guarda-roupa, eu guardava minha roupa em um móvel de banheiro. Nosso colchão ficava no chão, não tínhamos nem cama.”.
A dificuldade era tanta que eles carregavam nos fundos da Kombi um litro de óleo. O motor vazava, mas eles não tinham dinheiro para o conserto, por isso, a cada três quarteirões, paravam e completavam o óleo para o motor não fundir. Diante de uma situação dessas, longe da família e com a receita dos primeiros produtos usada para reinvestir na fabriqueta, os irmãos se apoiavam em um mantra que carregavam dentro de si.
“São suas decisões, não suas condições, que determinam o seu destino.”
Apesar do sufoco dos primeiros anos, quanto mais os irmãos trabalhavam, mais a sorte aumentava. A formação em Engenharia de Produção facilitou o desenvolvimento de produtos de limpeza com alto poder de diluição, aumentando a relação de custo x benefício para o consumidor final. Porém, apesar de desenvolverem bons produtos, os dois empreendedores não sabiam como vendê-los. Demorou alguns anos até os irmãos chegarem em um modelo que envolvia demonstrações e testes práticos, antecipando o ciclo de vendas, aumentando o ticket médio e formando uma verdadeira máquina de vendas de produtos de limpeza. Com esse modelo criado e melhorado, a venda de porta em porta começou a crescer a ponto de, em 2009, contratarem a primeira equipe CLT de revendedores: 14 pessoas que acreditaram no sonho. Em seguida, a frota das duas kombis começou a expandir e chegou a 11 veículos que percorriam as ruas de Joinville dando vida, a cada dia, à marca Ecoville.
Desse crescimento surgiu uma ideia: montar um “supermercado de produtos de limpeza” para outros revendedores adquirirem o produto. Nascia, em 2011, no bairro Costa e Silva, a primeira loja da família Castelo.
Esse crescimento súbito levou os dois irmãos a participarem de um projeto da Revista Pequenas Empresas Grandes Negócios chamado Extreme Makeover. A competição analisou o potencial de crescimento de mais de 2600 empresas até escolher um vencedor: a Ecoville. Para os irmãos, esse seria o momento da virada. E foi. Mas por razões diferentes das que eles imaginavam.
O prêmio foi usado para investir em 7 lojas comprando gôndolas, fachadas e sistemas, tudo parcelado. Além disso, os empreendedores saíram nas edições impressas, gerando um reconhecimento de marca nacional, muito além das fronteiras de Joinville. Porém, a grande transformação na vida dos dois irmãos aconteceu no dia de lançamento do projeto, em um evento na editora Globo. Leonardo considera que esse, sem dúvidas, foi o seu Day1.
“A palestra de abertura era do presidente da Alterdata Software, Ladmir Carvalho, uma fala que para nós foi muito transformadora. Quando ele desceu do palco, meu irmão e eu fomos falar com ele, parabenizando pela palestra e perguntando se podíamos marcar uma conversa. Nosso objetivo era entender como crescer mais rápido!”
Ladmir convidou os dois para visitar a sede da Alterdata no Rio de Janeiro, uma empresa com mais de 1.300 funcionários. Os dois irmãos desembarcaram no Santos Dumont e 7h da manhã foram recebidos por ele para um café. Passaram o dia conhecendo as instalações, o modelo de gestão e a visão de futuro do empreendedor. Saíram de lá tarde da noite.
Se eles chegavam ao Rio com a visão da fechadura, com certeza voltariam a Joinville podendo enxergar toda a janela.
“Daquele momento para frente, passamos a ver os negócios de uma forma completamente diferente. Nós sonhávamos em ser uma grande empresa regional, mas saímos de lá com a visão ampliada. Foi naquele momento que percebemos como é importante ouvir e se espelhar em grandes empreendedores.”
Hoje, os dois irmãos são uma referência na rede da Endeavor. Raros são os empreendedores com a humildade que eles têm de ouvir as orientações e provocações dos mentores, voltar para a empresa com a lição de casa, e retornar com os resultados e aprendizados. Essa prática da escuta fez os sonhos da Ecoville se alargarem. Em 2015, o modelo se concentrou na expansão das franquias, chegando a 142 lojas próprias naquele ano e 268 atualmente — com expectativas de continuar crescendo.
Há muitas razões que fazem de Leonardo e Leandro Castelo empreendedores que sonham grande. A história de resiliência que carregam, a rede de franqueados apaixonados que cultivam e a habilidade única de ampliar a visão a cada nova conversa fazem deles empreendedores transformadores. Por esses motivos, e por construírem um negócio com alto potencial de impacto, eles foram aprovados no Painel de Seleção Internacional (ISP) da Endeavor, no último dia 6/4 em Manila, nas Filipinas. Essa foi a última etapa de um processo que já dura alguns anos, desde a participação deles no programa de aceleração Scale-Up Endeavor Santa Catarina, em 2016.
Ao lado de uma rede com mais de 400 mentores e empreendedores dispostos a ajudar nessa caminhada, os irmãos agora têm o desafio de ampliar a cada dia o sonho, levando a Ecoville para o Brasil inteiro. E — por que não? — para o mundo. Para os empreendedores, o sonho está ali bem diante deles, sendo uma questão de tempo para se realizar.
“Nós queremos que as pessoas olhem para a Ecoville e entendam que ela mudou a experiência e o formato de compra dos produtos de limpeza. Ou seja, nós vamos ser os propulsores de um novo formato de compra no mercado global.”
Este texto foi publicado originalmente no site da Endeavor.