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Cervejarias artesanais entram no mercado da cerveja light

Cervejarias estão agora tentando fazer produtos similares àquele que costumavam ignorar e mesmo desprezar: a cerveja leve e aguada

Cervejeiro Andrew Kokinakes trabalha na Sierra Nevada Brewing, na Califórnia: (Max Whittaker/The New York Times)

Mariana Fonseca

Publicado em 15 de junho de 2019 às 08h00.

Última atualização em 15 de junho de 2019 às 13h53.

Para Sam Calagione, um dos fundadores da cervejaria artesanal Dogfish Head, a tentativa de sua empresa de se tornar mais saudável teve uma origem egoísta. "Comecei a notar que estava ficando com um pneuzinho", disse Calagione, atribuindo o ganho de peso às múltiplas cervejas que toma diariamente para o trabalho. "Então pensei: bem, não vou beber menos, por isso é melhor começar a inovar e criar algumas cervejas menos calóricas, mas saborosas."

Em 2016, a cervejaria, sediada em Delaware, começou a produzir sua SeaQuench Ale, uma sour com 140 calorias, promovida como "a cerveja da Dogfish Head que mais mata a sede". Agora, Calagione prevê que, dos mais de 300 mil barris que vai produzir este ano, cerca de um quarto vai atender à demanda dos consumidores mais preocupados com a manutenção de estilos de vida ativos do que com o lúpulo ou o alto teor alcoólico. Uma das cervejas é uma nova IPA (India Pale Ale) com menos calorias do que uma Bud Light.

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O mercado de cervejas artesanais se expandiu rapidamente na última década, conforme as cervejarias americanas iam desenvolvendo variações extravagantes e inventivas, muitas vezes com ingredientes não convencionais – açúcar de beterraba! jalapeños! –, além de muitas calorias e altos teores alcoólicos. As mesmas cervejarias estão agora tentando fazer produtos similares àquele que costumavam ignorar e mesmo desprezar: a cerveja leve e aguada.

"Acho natural que queiram variações da cerveja artesanal tradicional", disse Benj Steinman, presidente da publicação especializada "Beer Marketer's Insights", sobre as cervejarias artesanais. "O negócio está difícil agora. Você não pode ficar parado."

De 2010 a 2018, a quota, por volume, das cervejas artesanais no mercado americano cresceu de aproximadamente 4,9 por cento para 13,2 por cento, de acordo com a Brewers Association, um grupo comercial da indústria.

Mas as cervejas light da grande indústria ainda dominam. Bud Light, Coors Light e Miller Lite são três das quatro cervejas mais vendidas no país anualmente. E o crescimento da quantidade total de cerveja artesanal que está sendo produzida e vendida diminuiu nos últimos anos.

Um problema potencial é que 52 por cento dos bebedores de cerveja disseram este ano que queriam reduzir o consumo de álcool, de acordo com uma pesquisa conduzida pela Harris Poll em parceria com a Nielsen. "Optar por um estilo de vida mais saudável" foi a principal razão citada. Portanto, os cervejeiros estão se adaptando.

Algumas das maiores marcas artesanais chegaram até mesmo a adquirir produtores menores recentemente, mudanças que podem tornar mais acessíveis algumas cervejas artesanais mais leves. A Dogfish Head e a Boston Beer Co. anunciaram em maio que haviam se fundido, em um acordo avaliado em US$ 300 milhões. Em fevereiro, a cervejaria Sierra Nevada adquiriu a Sufferfest Beer Co., de três anos de idade, cujo marketing visa aos corredores.

Paul Geffken, de 36 anos, membro do Borderline Running Club em North Andover, Massachusetts, disse que a Miller High Life era a cerveja oficial do grupo desde sua fundação. Mas ele e vários de seus companheiros corredores que treinam para maratonas estão silenciosamente se bandeando para o lado da 26,2 Brew, uma cerveja da Marathon Brewing, que faz parte da Boston Beer Co. e que é comercializada para os atletas.

Geffken disse que preferia beber algo que fosse "um pouco refrescante" depois de uma corrida. Ele acrescentou que, além do sal marinho por causa dos eletrólitos, "a 26,2 tem coentro". "Não é a Bud Light ou a cerveja artesanal tradicional, na verdade. E, depois de uma corrida, você quer ingerir alguma coisa, mas não quer algo pesado", disse ele.

Mike Mitaro, presidente do Brewers Advisory Group, disse que as cervejarias precisavam reconhecer essas tendências e se adaptar. "No início dos anos 2000, a geração do milênio impulsionou o crescimento da cerveja artesanal. Conforme vão chegando aos trinta anos, as pessoas começam a pensar mais em calorias, saúde e bem-estar. É uma mentalidade diferente de quando você tem vinte e poucos, por isso as pessoas tendem a gravitar para a cerveja mais leve."

Mas, em vez de simplesmente recriar as cervejas light, ridicularizadas por tanto tempo, muitos cervejeiros querem enfatizar seu trabalho artesanal. Algumas, como a Slightly Mighty, com 95 calorias, da Dogfish Head, são IPAs mais leves, com menos álcool. As IPAs muitas vezes contêm mais de 200 calorias, e teor alcoólico acima de cinco por cento, com um sabor respeitável.

Outras, como a Rec. League da Harpoon Brewery e a Repeat, sem glúten, da Sufferfest, utilizam sementes de chia, pólen de abelha ou outros ingredientes que visam oferecer benefícios para a saúde, como reduzir inflamações ou a pressão arterial. E algumas cervejarias artesanais estão simplesmente produzindo cerveja sem álcool.

"Acho que essas bebidas tidas como saudáveis vão se tornar uma parte crescente do portfólio de um monte de cervejeiras artesanais. Quando você tem sete mil empresários trabalhando para o benefício de sua própria empresa, obtém uma resposta coletiva rápida que discerne entre o que pode funcionar ou não", disse Mitaro.

Além de apenas eliminar calorias e adicionar superalimentos às suas receitas, as cervejarias estão comercializando seus produtos como componentes que cabem no estilo de vida ativo dos clientes.

Caitlin Landesberg, fundadora da Sufferfest, disse que sua produção não estaria amplamente disponível em bares ou festivais de cerveja. Em vez disso, a Sufferfest continuaria a ser comercializada para atletas, inclusive sendo oferecida nas comemorações na linha de chegada de corridas. "Desde o começo, nós nos concentramos no 'consumidor suado'. Há aquele grupo demográfico que é o millenial que quer ter algo que é novo e prazeroso, mas que compreenda seu estilo de vida preocupado com a saúde, e o consumidor suado é uma tribo da qual faço parte", disse ela.

Dan Lamonaca, o dono da loja Beer Karma, na cidade de Nova York, disse que os puristas da cerveja artesanal tinham poucas queixas sobre as cervejas mais leves, em grande parte porque, ao contrário de outras bebidas orientadas para a saúde, como a hard seltzer e a hard kombucha que as cervejeiras artesanais tentaram produzir, elas são realmente cervejas.

Rob Burns, cofundador da Night Shift Brewing (Tony Luong/The New York Times)

Rob Burns, um dos fundadores da Night Shift Brewing, em Massachusetts, disse que a Nite Lite Lager da empresa, uma versão sofisticada de uma cerveja light produzida em massa e fabricada com flocos de milho, havia sido criada em parte para conquistar uma pequena quota de mercado dos gigantes cervejeiros – e para dar aos bebedores uma pausa da forte IPA.

"Por que deixaríamos de lado grande parte do mercado das cervejarias globais, enquanto as locais têm 10, 15 por cento da quota de mercado?", questionou Burns, acrescentando que, ao determinar o preço de varejo de 12 unidades de Nite Lite por US$ 1 a US$ 3 a mais em média que a Bud Light ou a Miller Lite, a Night Shift poderia seduzir bebedores não artesanais, sedentos por uma versão diferenciada de sua habitual cerveja light.

Encorajada pelo que Burns disse ser uma forte demanda inesperada pela Nite Lite, que excedeu a oferta disponível na ocasião, a Night Shift lançou recentemente uma variação, a Lime Lite, para continuar aumentando sua participação no mercado doméstico de cerveja light. E o mesmo acontece com a Slightly Mighty, da Dogfish Head. Calagione disse que as encomendas estavam superando as previsões iniciais da empresa. As estimativas iniciais anteciparam a necessidade de produzir cinco mil barris este ano. Com base nas encomendas dos distribuidores, esse número subiu para 35 mil.

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