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Empreendedores que quebraram mostram como recomeçar

Eles aprenderam com os erros e resolveram montar novos negócios

Fred Santos e a The Burguer: ele já quebrou duas vezes em outras áreas, mas não desanimou e está dando a volta por cima (Flávio Florido/Ricardo Yoithi Matsukawa-ME/Jornal de Negócios do Sebrae/SP)

Fred Santos e a The Burguer: ele já quebrou duas vezes em outras áreas, mas não desanimou e está dando a volta por cima (Flávio Florido/Ricardo Yoithi Matsukawa-ME/Jornal de Negócios do Sebrae/SP)

Mariana Fonseca

Mariana Fonseca

Publicado em 16 de junho de 2019 às 08h00.

Última atualização em 16 de junho de 2019 às 08h00.

Frederico Santos, o Fred, começou a empreender ainda adolescente, aos 16 anos, em 2005. Vendia prataria (pingentes, colares e pulseiras) e roupas para colegas de escola em São José dos Campos. Não tinha experiência nenhuma, apenas um caderninho em que anotava suas compras e vendas.

O negócio prosperou e ele chegou a ter quatro vendedoras, uma delas sua irmã. “No começo deu tudo certo, mas como era tudo na confiança não investi em estrutura, em nada. Elas vendiam, retiravam suas comissões e me passavam o resto. Um dia, uma sumiu, outras duas não me pagaram”. Só a irmã honrou seu compromisso.

Mais tarde, aos 19, começou a trabalhar em um banco. “Minha mente começou a abrir, passei a ter contato direto com empresários e gerentes”, conta. Com o salário e sua atividade paralela de vendedor conseguiu juntar R$ 30 mil – valor expressivo para um jovem iniciante.

Porém, um problema financeiro de seus pais fez com que o imóvel que eles moravam corresse risco de ir à leilão. Precisando de R$ 100 mil para evitar que isso acontecesse, ele ajudou com sua economia e outro amigo com o restante. “Fiquei abalado, tive que começar do zero de novo.”

Fred decidiu apostar em seus dotes como vendedor e foi até para Miami comprar roupas para revender, mas acabou por desistir da atividade comercial.

Começou, então, a organizar festas de música eletrônica. Produziu nove eventos, mas o negócio de festas é sazonal e foi ficando caro, principalmente para pagar os DJs estrelados que ganhavam seus cachês independentemente da quantidade de público. “Com custos altos para arcar, acabei falindo de novo, dessa vez em condições financeiras negativas”. Fred tinha 25 anos e, segundo suas palavras, “só sobrou a energia e a vontade”.

De acordo com o consultor do Sebrae-SP Rafael Souza, o caso de Fred é frequente na vida empreendedora. “Pesquisas indicam que muitos empresários de sucesso falham três vezes antes de acertarem. Mas é preciso força de vontade e inteligência emocional para saber se reerguer”, diz.

A pesquisa Causa Mortis, realizada pelo Sebrae em 2014, identificou os fatores para a derrocada de um empreendimento. A falta de capital de giro é o principal fator para o fechamento de uma empresa. Em português claro, o dinheiro acaba, mas as contas para pagar continuam.

Souza chama a atenção para os motivos que conduzem à falta de dinheiro em caixa: falhas no planejamento e na gestão – geralmente originadas na má formação técnica e inexperiência dos empreendedores.

“O comportamento empreendedor define boa parte do sucesso ou fracasso de uma empresa. Os que dão a volta por cima têm o espírito empreendedor aflorado, são otimistas e realizadores, sempre veem o copo meio cheio”, analisa o consultor – coincidentemente, é esse o perfil de Fred.

Novo começo

O nome “sujo” no Serasa e a ausência de capital para investir não desanimou Fred. Com um sócio, decidiu abrir uma hamburgueria artesanal, bem ao estilo das casas que já vinham crescendo em São Paulo, mas que ainda não existiam no interior. Conseguiram um empréstimo com a mãe de Diego Melão, o sócio. Foram R$ 20 mil reais.

“Como ninguém era do ramo, e o capital era baixo e emprestado, não podíamos mais errar. Buscamos o Sebrae e fizemos o Empretec e alguns cursos na área da alimentação”. O Empretec, segundo Fred, ensinou-o a ver seu negócio com mais frieza e objetividade, auxiliando-o na tomada de decisões mais precisas.

Depois de se prepararem melhor, Fred e Melão abriram a The Burger com mesas de plástico, equipamentos de segunda mão e nenhum luxo. “Montamos em um terreno do meu sócio justamente para economizar com o aluguel”, conta Fred.

Como São José ainda não tinha uma hamburgueria na linha artesanal e autoral, o negócio engrenou. Fred conta que as mídias sociais ajudaram a difundir os produtos e a identidade da empresa.

Hoje seu estabelecimento tem uma clientela fiel, um nome consolidado e equipamentos importados da mesma marca utilizada por grandes redes.

“Temos uma autenticidade e originalidade que são nossas”, explica. Enquanto Fred trabalha com a gestão do negócio, que envolve finanças, compras e contatos com fornecedores, Melão fez cursos e se aprofundou no mundo das carnes e hambúrgueres; trabalha na cozinha, seleciona matérias-primas e cria receitas.

A hamburgueria se expandiu e já conta com uma cozinha de preparação e delivery em outro endereço, mas Fred não está satisfeito e pretende crescer mais ainda. “Primeiro, quero transformar o espaço de delivery em uma distribuidora de nossos produtos e outros alimentos. Mais à frente, pretendo fazer cursos de franquia para realmente expandir”

Apesar dos sentimentos negativos e da perda financeira que ficam após o fechamento, quase metade dos empresários que fecham as portas (45%) voltam a empreender como autônomos ou donos de outras empresas, revela a pesquisa Causa Mortis.

“Quebrar é também uma oportunidade de aprendizado. Mas tem que ter a sobriedade e a humildade para compreender os erros. Depois, a chance de cometê-los de novo é praticamente nula”, avalia o consultor Rafael Souza.

A humildade, segundo ele, é muito importante no perfil empreendedor, pois evita que o empresário tenha uma postura míope diante do seu próprio negócio e do mercado. “Muitos acham que o problema nunca é com eles, mas é a área de atuação, a crise econômica, os consumidores. Essa postura é equivocada”, ressalta.

Retroceder nunca, render-se jamais

Imagine um empreendedor que começou aos 11 anos, abriu uma empresa, cresceu, contratou o próprio pai para a empresa, quebrou, recomeçou, montou uma indústria, agência de propaganda, prestadora de serviços, foi franqueado, representante comercial, vendeu sua indústria, tentou descansar, não conseguiu e começou tudo de novo.

Muito resumidamente, essa é a trajetória de Felipe Sousa. Para ele, cair, sentir a queda e levantar sempre fez parte de sua trajetória empreendedora. Quando Felipe tinha 11 anos, seu pai trabalhava com comunicação visual, pintando muros e outdoors. O menino viu então a oportunidade de revender tintas texturizadas de um dos fornecedores do pai. A revenda deu tão certo que ele formalizou o negócio e montou sua primeira empresa.

Alguns anos depois, ele contratou seu pai, que passou a cuidar da gestão do negócio enquanto Felipe cuidava das vendas e da estratégia. Juntos chegaram a ter quatro lojas físicas. Mas veio o primeiro baque. “Meu pai teve problemas com bebida e eu acabei brigando com ele. Desmanchamos a parceria e perdi tudo.”

Ainda menor de idade e sem muito dinheiro para investir, ele retomou seus contatos no setor para abrir uma pequena indústria de tintas texturizadas e massa corrida. Nessa época ele também foi representante comercial e revendedor de concreto estampado para pavimentação, além de ter montado uma franquia, que fracassou.

Já o negócio industrial prosperou a ponto de suas tintas ganharem reconhecimento como produtos sustentáveis. Para alavancar suas vendas para pequenos lojistas, Felipe abriu uma agência de propaganda especializada no setor.

“Montei a agência para atuar junto com a fábrica e oferecer serviços para os pequenos revendedores. Eu garantia aos lojistas que, com meus produtos, o faturamento ia crescer. E isso acontecia. Montei também uma empresa para aplicação do produto”, conta ele.

Em 2016, ele recebeu uma proposta de uma grande indústria química e vendeu sua empresa. Sua intenção era parar por um tempo, ter um ano sabático, e voltar para abrir um bar temático. Seu descanso durou cinco meses. “Não consegui ficar parado, montei uma startup.”

Sua empresa, uma plataforma on-line de cotação e contratação de serviços e produtos para obras, participou da incubadora da Escola de Negócios e também do Startup SP, programa de desenvolvimento de startups digitais – ambas iniciativas do Sebrae-SP.

Os diferenciais da Simplifica Obra são seu sistema de validação de fornecedores, garantia de até R$ 350 mil para eventuais falhas nas obras e processos auditados. Hoje, a empresa tem sete funcionários fixos e outros oito representantes comerciais autônomos.

Atende grandes administradoras de condomínio, escolas e hospitais. Sua meta é arrojada: fechar 300 contratos com empresas até o final de 2019, além dos serviços para pessoas físicas. E Felipe tem apenas 26 anos.

“Nessa idade, é difícil ter alguém com tanta experiência e vivência no  Empreendedorismo como ele”, diz Marcus Vinicius de Oliveira Leite, consultor do Centro Nacional de Referência em Empreendedorismo, Tecnologia e Economia Criativa do Sebrae-SP. “No Brasil, critica-se muito o fracasso e valoriza-se só o sucesso. Quem não se abalar com as críticas, aprender com erros e se preparar, como o Felipe fez, consegue seguir em frente mais forte ainda”, finaliza.

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