Marcos Khalil, da UZ Games: "Fazemos questão que o candidato goste de jogos" (Daniela Toviansky)
Da Redação
Publicado em 24 de abril de 2012 às 06h12.
São Paulo - Saber escolher os franqueados é fundamental para o crescimento saudável de uma rede de franquias. Se a seleção não for benfeita, corre-se o risco de não contar com empreendedores suficientemente dedicados para aprender as particularidades do negócio — o que costuma gerar atritos e alta rotatividade entre os franqueados.
De acordo com especialistas, um bom processo seletivo deve partir da definição do perfil desejado, considerando aspectos técnicos, capacidade de gestão do negócio e poder financeiro. A partir disso, deve seguir etapas que permitam identificar, entre todos os que se apresentam, quais são aqueles que realmente se encaixam no que a rede precisa.
Não é uma tarefa fácil e, por isso, muitos donos de redes de franquias não contam com processos de seleção eficientes do primeiro contato à assinatura do contrato de adesão. Veja, a seguir, um passo a passo que permite ao franqueador identificar o melhor franqueado possível. Ele é resultado da experiência de donos de redes que apresentam baixos índices de rotatividade em seus mercados.
1 O que pedir na ficha cadastral
Além de solicitar dados pessoais, profissionais, experiências anteriores e capital disponível para investir na unidade, deve-se perguntar como o candidato conheceu a marca e por que a escolheu. "Se não houver uma boa resposta, pode ser um sinal de que ele está procurando uma franquia qualquer, e não especificamente aquela", diz o consultor Adir Ribeiro. É verdade que, dessa forma, o número de candidatos pode diminuir.
"Em compensação, a qualidade dos que ficam tende a ser melhor do que sem essa peneira", diz Ribeiro. É o que faz Rodolfo Alves, de 30 anos, dono da rede paulista de quiosques Mr. Beer, que vende cervejas artesanais. Com 33 unidades, 15 franqueados e faturamento estimado em 10 milhões de reais para 2012, a rede está sempre em busca de novos candidatos.
No cadastro virtual há um campo para o candidato informar quantas horas diárias dedicará ao negócio e se vai exercer outras atividades simultaneamente à gestão da loja — além de perguntas sobre aspectos financeiros básicos, como percentual do investimento reservado para capital de giro e expectativa de ganhos mensais.
"Com base nesses dados, fazemos a primeira triagem. Quem não revela intenção de se dedicar em tempo integral já é desclassificado", diz Alves. A expectativa de ganhos também é outro fator de corte importante. A Mr. Beer oferece rentabilidade entre 10% e 15% sobre as vendas. "Quem quer mais do que isso bateu na porta errada", diz Alves.
Cuidado: Criar barreiras demais já no cadastro pode dar a impressão de que a cultura da empresa é burocrática e intransigente, afugentando bons candidatos.
2 As perguntas da entrevista
Um roteiro padronizado para conduzir as entrevistas otimiza o tempo do entrevistador e do entrevistado, que muitas vezes estão em cidades diferentes. Esse primeiro contato também pode ser feito por telefone, num bate-papo informal com os candidatos. As perguntas devem ser bem objetivas: já chefiou funcionários? Já teve ou tem negócio próprio? Quais são suas principais experiências? Conhece bem a região em que vai atuar? Pesquisou algum ponto comercial para instalar a franquia?
"Uma boa entrevista fornece uma medida mais realista do preparo do candidato", diz a consultora de franquias Cláudia Bittencourt.
Cuidado: É fácil se impressionar com candidatos extrovertidos e articulados que vendem bem o próprio peixe, mas têm pouca capacidade de gerir um negócio.
3 Alinhar as expectativas
Nessa etapa, ambas as partes devem ser totalmente francas. Para o franqueador, é o momento de colocar na mesa o que espera de um franqueado, como é a operação no dia a dia, quais são as regras que devem ser respeitadas e que tipo de comportamento o novo parceiro deverá adotar.
É hora também de revelar o faturamento médio por loja, a lucratividade e o prazo estimado de retorno do investimento. Para o franqueado, é a oportunidade para dizer por que escolheu aquela franquia, que sonhos deseja realizar, quanto espera ganhar e qual sua disposição para se dedicar ao negócio.
"É nessa etapa que o franqueador consegue perceber se o futuro candidato acha que o sucesso de sua unidade dependerá de esforço ou se será algo natural porque a operação anda sozinha', diz o consultor Marcelo Cherto.
Cuidado: Revelar detalhes do negócio a alguém que não vai ficar ou, pior, acaba indo para a concorrência pode ser perigoso — daí a importância das etapas anteriores.
4 Identificação com o negócio
A maior exigência para quem quer abrir uma loja da rede de jogos eletrônicos UZ Games, de São Paulo, é gostar de jogos. O pré-requisito é comprovado na prática. Em vez de entrevistas comuns, o candidato passa por uma bateria de 21 jogos, cujo objetivo é avaliar quanto ele tem afinidade com as áreas de marketing e vendas, como se relaciona com pessoas, como lida com as adversidades e se é capaz de enxergar oportunidades.
"Se o desempenho for abaixo de 50%, o candidato é dispensado", afirma Marcos Khalil, de 43 anos, sócio da rede. "Não nos importamos se ele tem ou não experiência anterior. Mas fazemos questão de que goste de jogos, senão não vai funcionar na mesma sintonia da rede." A UZ Games tem 37 lojas e 23 franqueados e projeta um faturamento de mais de 18 milhões de reais em 2012.
Cuidado: Gostar do mercado em que a rede atua não é garantia de capacidade de gestão. É um critério que só faz sentido se fizer parte de uma seleção mais técnica.
5 Com ou sem experiência?
Muitos donos de redes de franquias têm dúvida se experiência é ou não um critério importante. “Isso varia de franquia para franquia”, diz Cherto. Entre dois bons candidatos para a mesma loja, a rede McDonald’s prefere quem nunca atuou na área, porque não carrega vícios e pode ser treinado segundo as normas da bandeira.
Já a rede de agências de viagem Flytour prefere gente do setor — e de preferência que já tenha uma agência. "Cabe à franqueadora definir o que mais se adapta às suas necessidades e à sua cultura", diz Cherto. "Mas, se a opção for por pessoas sem experiência, é preciso investir numa ótima estrutura de treinamento."
Cuidado: A falta de flexibilidade nesse critério pode fazer com que bons candidatos sejam descartados — independentemente de terem experiência ou não.
6 A hora do Test-Drive
A rigor, o test-drive não é exatamente parte do processo de escolha — é mais uma medida de precaução para que franqueador e franqueado consigam dormir tranquilos. Na maioria dos casos, o test-drive leva três ou quatro dias. Nesse período, o futuro franqueado trabalha de verdade — chega antes do primeiro funcionário e só sai depois que o último cliente foi embora e a limpeza acabou.
"Foi no test-drive que uma candidata com todas as qualidades desejadas e dinheiro para investir desistiu", diz Fátima Rocha, sócia da rede de lanches carioca MegaMatte. "Ela se deu conta de que simplesmente não conseguiria passar tantas horas em pé atendendo os clientes." A rede tem 98 lojas e faturamento estimado de 83 milhões de reais para este ano. "Desde que abrimos a primeira loja, em 2005, não registramos mais do que três desistências nessa fase", diz Fátima.
Cuidado: O test-drive tem de reproduzir fielmente as reais condições de trabalho na rede. Se há dias da semana com mais movimento, por exemplo, o test-drive deve ser marcado para esse dia.