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Sinais vitais

Depois de enfrentar dois anos de prejuízo, a Embratel volta ao lucro e vai às compras. A tempestade passou?

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2010 às 13h16.

No fim do ano passado, a Embratel vivia no pior dos mundos: seu balanço fechara com prejuízo de 623 milhões de reais, 13% maior que o já problemático resultado de 2001. Sua dívida, quase toda indexada ao dólar e pressionada pela desvalorização da moeda brasileira, batera em 4,9 bilhões de reais. Boa parte dela começaria a vencer ainda no verão de 2003. Em razão da desaceleração da economia, as receitas haviam encolhido 5% no ano. Essa conjunção de dificuldades ocorria justamente num momento delicado: a abertura do mercado de longa distância para as empresas de telefonia local. A partir daí a Embratel passaria a sofrer uma concorrência até então desconhecida.

Para completar, sua controladora, a americana MCI/WorldCom, debatia-se em meio a um escândalo contábil de 11 bilhões de dólares e protagonizava a maior falência da história dos Estados Unidos (que agora tenta reverter). Um eventual socorro financeiro da matriz estava, portanto, descartado. Com tantos obstáculos a barrar-lhe o caminho, a Embratel passou a ser alvo de previsões fatalistas. Na opinião de alguns analistas, acabaria vendida. Na de outros, simplesmente caminharia para o desastre.

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O fato, porém, é que no fim do primeiro semestre deste ano a empresa começou a escalar o abismo em que parecia ter mergulhado. Embora não tenha ainda chegado ao topo da montanha, nos últimos meses a Embratel melhorou consideravelmente seu desempenho. "A empresa está vindo por um caminho correto", diz Carolina Gava, analista de telecomunicações da consultoria carioca Espírito Santo Securities. "A percepção do mercado hoje é muito positiva." Os números revelam a razão da mudança de humor dos analistas:

  • A Embratel fechou o segundo trimestre com um lucro líquido de 128 milhões de reais, após ter operado nos últimos dois anos no vermelho.
  • A geração de caixa no período cresceu 14% em relação ao trimestre anterior.
  • A dívida da empresa caiu de 4,9 bilhões de reais no final de 2002 para 4,1 bilhões ao fim do primeiro semestre deste ano.
  • A provisão para devedores duvidosos chegou a 6,6% da receita bruta no segundo trimestre de 2002. No mesmo período deste ano havia caído para 3,9% do faturamento -- ou 84 milhões de reais.

    A grande vitrine do processo de recuperação da Embratel foi o anúncio, em agosto, da aquisição da Vésper, a empresa de telefonia fixa espelho da Telefônica, em São Paulo, e da Telemar, nos 16 estados do Sudeste e do Nordeste onde a operadora atua. A previsão é que o negócio seja concretizado até o fim do ano. Semanas depois, a Embratel comunicou sua disposição em adquirir também a operação da americana AT&T na América Latina. "A Embratel está sinalizando que tem fôlego para competir", diz André Lago, analista de telecomunicações da Investidor Profissional, uma das maiores administradoras de recursos do Rio de Janeiro.

    O que aconteceu com a Embratel para que ela saísse da condição de alvo do mercado para a de caçadora de oportunidades? Um ponto de inflexão na trajetória da empresa, do desastre iminente para a perspectiva de recuperação, foi a renegociação da dívida com seus 25 credores em fevereiro deste ano. "Refinanciamos 892 milhões de dólares da nossa dívida que vencia no curto prazo", diz o cubano Jorge Rodriguez, de 46 anos, presidente da Embratel. "Foi a maior renegociação de dívida na América Latina no último ano."

    FORA DO GANCHO
    Após dois anos de prejuízo a Embratel
    voltou a ter lucro...
    (em milhões de reais)
    2001
    -553
    2002
    -623
    2003*
    182
    ...a dívida diminuiu... (em bilhões
    de reais)
    2001
    3,1
    2002
    4,9
    2003*
    4,1
    ...e a inadimplência encolheu (em
    bilhões de reais)
    2001
    1,5
    2002
    0,627
    2003*
    0,19
    *Primeiro semestre de 2003
    Fonte: empresa

    Segundo analistas do mercado de telecomunicações, só neste ano a empresa teria de desembolsar 777 milhões de dólares para pagamento da dívida. Agora, pelo acerto com os credores, apenas 20% desse débito será pago no vencimento original. Outros 30% serão divididos em sete parcelas trimestrais e os 50% restantes serão cobrados a partir de 2005. "Sem essa renegociação, a empresa quebraria", diz Lago, da Investidor Profissional. "A Embratel não teria condições de tocar sua operação com o caixa sangrando dessa maneira."

    É possível imaginar o que se passou na cabeça dos analistas quando, no segundo semestre do ano passado, a economia brasileira mergulhou numa enorme incerteza em razão do conturbado quadro eleitoral. Os financiamentos externos para o Brasil desapareceram, o dólar disparou e o risco-país foi para as alturas. Os bancos não se dispunham a renovar seus créditos com as empresas. "A agravante, no caso da Embratel, é que metade de sua dívida é com agências internacionais de crédito, como o Eximbank americano", diz Lago. "Justamente aqueles que mais resistiam a renovar seus créditos."

    Rodriguez, um executivo com carreira construída nos Estados Unidos e que há quatro anos vive no Brasil, tem outra interpretação para a situação da Embratel naquele momento conturbado. "O mercado exagerou nas previsões pessimistas. Não havia razão para que os credores não confiassem na capacidade da Embratel de honrar seus compromissos", afirma. "Sempre mantivemos uma relação de tranqüilidade com os credores."

    Embora Rodriguez tente amenizar as dificuldades do processo, a renegociação da dívida da Embratel foi dura e demorada. Os contatos com os credores começaram em agosto de 2002 -- quando a Embratel comunicou que precisaria de mais tempo para acertar suas contas -- e só terminaram em fevereiro deste ano, com a assinatura do acordo. Foram seis meses de intensas discussões e um interminável vai-e-vem na sede da empresa, localizada no centro do Rio de Janeiro. As conversas ocorreram separadamente com cada credor e também com todo o grupo.

    O principal trabalho dos executivos da Embratel foi convencer os credores de que, se a empresa ganhasse algum tempo, a dívida seria paga sem maiores problemas. O argumento, segundo Rodriguez, era que a Embratel havia sido atropelada pela desvalorização cambial no momento em que estava implementando programas importantes de recuperação de suas receitas e de aumento da sua competitividade no concentrado mercado nacional de telefonia. "A estratégia para a empresa já estava definida", diz ele. "Isso ajudou na renegociação."

    A estratégia começou a ser traçada em 2001, quando a operação da Embratel -- que parecia ser a mais atraente do pacote de privatizações das empresas de telecomunicações, em 1998 -- começou a apresentar problemas. A companhia sofreu, logo de cara, com o difícil relacionamento com as operadoras locais -- Telemar, Telefônica e Brasil Telecom.

    Um dos maiores problemas entre elas foi a forma de cobrança das contas da Embratel emitidas pelas concorrentes. A princípio, havia duas alternativas: incluir as faturas nas contas das operadoras locais ou fazer a sua própria emissão. Diante da taxa de 7 reais cobrada pelas locais para cada fatura emitida, a Embratel ficou com a segunda opção. Aí apareceram os problemas. Por não ser a dona de rede de cabos que atendem às residências, a empresa não tinha como cortar a linha de clientes que deixavam de pagar suas contas. Resultado: a inadimplência cresceu assustadoramente. Em 2001 atingiu 1,5 bilhão de reais.

    Para enfrentar os caloteiros, a Embratel desenvolveu, no ano passado, um software que localiza e controla o número de telefone dos clientes. Com isso, passou a controlar as contas e a saber onde cobrar as faturas. "Hoje temos como bloquear o uso do 21 por um cliente inadimplente", diz Rodriguez. Após a implantação do sistema, a inadimplência da companhia caiu para 84 milhões de reais no último trimestre, o valor mais baixo dos últimos três anos. Nessa questão, a Embratel contou com uma ajuda da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que obrigou as operadoras locais a realizar o co-faturamento, cobrando no máximo 0,79 centavos de real por fatura.

    Outra fonte de custos que vem sendo atacada pela Embratel são as tarifas de interconexão pagas às operadoras locais em razão da utilização de suas redes. Esses custos caíram de 1,8 bilhão de reais no primeiro semestre de 2002 para 1,5 bilhão no mesmo período deste ano. "Fomos vítimas do monopólio das empresas locais que cobraram preços abusivos para que pudéssemos utilizar suas redes", diz Rodriguez. O executivo de uma dessas operadoras contesta as críticas. "As operadoras investiram bilhões na expansão das suas redes e a Embratel quer usá-las sem pagar por isso", diz.

    Apesar da reclamação das operadoras locais, o governo já fechou a questão sobre esse assunto. Em junho, o Ministério das Comunicações determinou que as taxas de interconexão cairão progressivamente até 2007. "Estamos utilizando a fórmula de cálculo usada em todo o mundo para remunerar as operadoras pelo uso da rede", diz o ministro Miro Teixeira. "O que não pode é o consumidor ser prejudicado com tarifas mais altas devido às brigas entre as empresas."

    Além das reduções previstas em lei, outro fator contribuiu para a redução dos custos da Embratel com a interconexão: os investimentos na própria rede. Atualmente, 76% da rede utilizada pela empresa é própria. "Queremos depender cada vez menos das operadoras locais", diz Silvia Pereira, gerente de relações com o mercado da Embratel.

    O impacto na redução de custos é uma das razões que levaram a Embratel a optar por ampliar sua rede através da compra da Vésper e da AT&T. Com a Vésper, dona de uma carteira de 500 000 clientes, os executivos da Embratel procuram garantir a expansão no mercado de banda larga da internet para pequenos e médios clientes. Atualmente, a Embratel é líder no mercado de transmissão de dados para grandes corporações. "Nossos planos são de ampliar rapidamente nossos serviços de banda larga e voz para os clientes locais", diz Rodriguez.

    E quais as chances de a Embratel ser bem-sucedida nesse negócio, já que o atual controlador da Vésper, a americana Qualcomm, falhou na missão? "Por já ter um serviço de longa distância e uma excelente rede de dados, a Embratel tem mais chances de fazer a Vésper decolar", diz Andréa Rivas, analista do Yankee Group, consultoria especializada em telecomunicações. "Será possível oferecer um pacote de voz, dados e longa distância a preços mais competitivos em razão do tamanho e da eficiência da sua rede." A AT&T é outro negócio estratégico. Estima-se que com a aquisição -- avaliada em cerca de 110 milhões de dólares -- a Embratel tenha condições de ampliar sua rede de dados para clientes corporativos para boa parte da América Latina.

    Esses avanços, na opinião dos analistas, são ainda insuficientes para tirar definitivamente a Embratel de uma zona de risco. "A dívida da empresa ainda é muito alta e toda ela em dólar", diz Carolina Gava, da Espírito Santo Securities. "Esse é ainda um fator que preocupa." A favor da companhia está a expectativa de crescimento da economia brasileira nos próximos meses. "Como a Embratel é mais focada em clientes corporativos, uma recuperação econômica aumentará significativamente a demanda por seus serviços", diz Andréa Rivas. "Isso ajudará a reduzir os riscos da empresa daqui para a frente."

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