Serviço campeão
Um único restaurante Outback atende 30 mil pessoas por mês. Seu segredo? Garçons que agem como donos do negócio
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 09h26.
No ano passado, um fato inédito aconteceu no comando mundial da rede americana Outback Steakhouse, que tem 700 restaurantes em 17 países. Pela primeira vez em 12 anos de história, o grupo abriu mão de recrutar funcionários dos Estados Unidos, onde está sua sede, para treinar a equipe de uma nova filial. Oito brasileiros foram enviados a Lisboa, encarregados do treinamento dos 100 funcionários da primeira loja da rede em Portugal. A escolha não foi só pela proximidade cultural. O sucesso das lojas brasileiras pesou. O restaurante da avenida das Américas, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, de onde saiu a equipe enviada a Lisboa, é o mais movimentado da rede no mundo (junto com o outro carioca, dentro do Shopping New York City Center, a 500 metros de distância do primeiro): recebe cerca de 30 mil clientes por mês.
A comida é muito boa, o que contribui para as filas que se formam na porta. Mas esse não é o único motivo que leva os clientes a fazer fila -- e chegam a esperar mais de uma hora -- para provar os pratos, americanos até a última cebola empanada. O serviço é campeão. A ordem é atender bem, não importa como. "Se uma criança pedir um hambúrguer do McDonald's e houver uma lanchonete perto, vamos até lá comprar", diz Salim Maroum, 47 anos, um dos fundadores do Outback no Brasil, que muitas vezes veste o avental e faz o papel de garçom. Os garçons, ou outbackers, como gostam de ser chamados, são orientados a resolver problemas e agir como empreendedores, mesmo que isso signifique gerenciar só três ou quatro mesas. Recentemente, duas senhoras queriam dividir uma batata recheada ao meio. Metade para cada uma. "Explicamos a elas que o prato não ficaria tão saboroso e servimos duas batatas -- sem cobrar nada a mais. O importante é que elas ficassem satisfeitas", conta Maroum.
Sem regras
Histórias como essa, das batatas, podem ser comuns em restaurantes sofisticados, mas não acontecem com freqüência em grandes cadeias, onde tudo é padronizado e não se deve fugir das regras. Mas o Outback não pode levar regras a sério, ou teria de mudar seu lema: "No rules, just right" (algo como "Não seguimos regras, só fazemos certo"). A frase está escrita em um quadrinho pendurado na parede, entre um e outro objeto vindo da Austrália, tema da decoração da casa.
O lema dá liberdade aos garçons para que gerenciem suas mesas e negociem com o gerente a melhor e mais rápida maneira de atender os clientes. Eles fazem isso como se gerenciassem sua própria empresa. A cozinha é sua fornecedora, com quem precisam negociar prazos e mudanças na receita original. "Precisamos de pequenos empreendedores", diz Bertrand Letouzé, 44 anos, carioca, sócio do primeiro restaurante Outback, aberto em 1997, e que enviou a equipe a Lisboa. "Eles devem ficar atentos e cuidar dos seus clientes e, se for necessário, dos clientes dos outros também." Todo mês, dois funcionários são reconhecidos pela casa. Um pelo melhor atendimento e outro pelo desempenho. A foto dos premiados vai para um quadro dentro do restaurante.
Escolhidos a dedo
Os garçons do Outback são jovens, muitos estão na faculdade, falam inglês e chegam de carro ao trabalho. Em geral, arrumaram o emprego para custear a faculdade ou conseguir uma graninha a mais para comprar um carro novo e viajar. Trabalham de seis a oito horas por dia, têm duas folgas semanais e ganham, incluindo as caixinhas, cerca de 1,2 mil reais por mês. O salário é atraente, mas não poderia ser de outro jeito se levarmos em conta o perfil dos funcionários que o Outback deseja. Trata-se de um tipo de garçom bem diferente dos atendentes de cadeias de fast food tradicionais. "Muitos deles eram clientes da casa que se interessaram e vieram trazer seu currículo", diz Christiano Londres, 32 anos, dono do restaurante que fica dentro do New York City Center, no Rio.
Os clientes que se candidatam a uma vaga têm meio caminho andado para consegui-la."Buscamos funcionários que falem a mesma língua que nossos freqüentadores", diz Maroum. Ele aponta para uma jovem bonita, vestindo jeans, sentada no balcão, esperando para ser atendida. "Está vendo aquela moça? Ela era uma cliente. Hoje é nossa funcionária e está esperando seu turno começar!"
Boa aparência e juventude estão entre os requisitos, mas quem quer trabalhar na rede tem de passar por uma bateria de testes antes da contratação. O primeiro deles é quase vocacional. Se o candidato quer ser garçom mas tem mais jeito para a cozinha, é essa a vaga que será oferecida. "Quando entrei, eu queria recepcionar os clientes. Tinha vergonha de ser garçonete", conta Janaína Raul, 25 anos, que começou como garçonete, fez parte do grupo enviado a Lisboa e hoje é uma das gerentes do restaurante.
Os outros testes, que duram duas semanas, medem o desempenho dos candidatos e sua capacidade para solucionar problemas. Esses, sim, são requisitos básicos para entrar na equipe -- e provavelmente parte importante no sucesso da casa. "Não existe treinamento que ensine as pessoas a cuidar dos outros: é algo que você precisa saber naturalmente", diz Letouzé. Saber cuidar dos clientes, não ter regras, cultivar o espírito de equipe. São belas expressões, mas, para o Outback, colocar em prática essas idéias não contribui só para construir a imagem da rede. Faz muito bem para os negócios. O faturamento da rede no Brasil dobrou de 1999 para 2000. Alcançou 22 milhões de reais e deve chegar a 30 milhões até o final do ano.
A receita do bom atendimento do outback
Salim Maroum, diretor de operações e um dos fundadores do Outback no Brasil, é um libanês de 47 anos. Ele parece tímido e quieto, mas se transforma quando fala sobre seu negócio, seus funcionários e sobre as histórias que acontecem nos restaurantes da rede. Não é difícil encontrá-lo vestindo o uniforme e o avental dos garçons, entregando pratos nas mesas e até ajudando o pessoal a descarregar mercadorias dos caminhões. Maroum ensina aqui alguns dos segredos do bom atendimento:
No Outback, até garçom precisa ter espírito empreendedor. Cada um deles tem o objetivo de conquistar seus clientes e de atendê-los de uma maneira melhor e diferente de todos os outros.
Se alguém pedir batata em vez de arroz, frango no lugar da carne e trocar os legumes cozidos por purê, tudo bem. O importante é que o cliente saia da mesa com a impressão de que é único.
Dar aos clientes o que eles querem não é o bastante. Os garçons têm de encontrar uma maneira de surpreendê-los com algo que vá além do que foi pedido.
"Nossa equipe sabe que, cada vez que se chega ao lugar planejado, você precisa ter um novo degrau para almejar", diz Maroum. Em outras palavras, nunca se dê por satisfeito.
Olhos nos olhos, sorriso no rosto e muita atenção. "O cliente precisa sentir que existe prazer em atender e que o garçom se interessa por ele", diz Maroum.
Os garçons têm de conhecer muito bem o que vendem. "Não é só perguntar se a carne deve chegar bem ou malpassada", diz Maroum. "É preciso conhecer cada prato, identificar o que aquele cliente quer e oferecer algo que vai deixá-lo satisfeito."