Provamos o revolucionário hambúrguer de carne fresca do McDonald’s
A maior empresa de restaurantes dos Estados Unidos abandonou o Quarteirão com carne congelada em suas 14.000 unidades americanas
Carolina Riveira
Publicado em 17 de maio de 2018 às 17h16.
Última atualização em 6 de maio de 2019 às 18h25.
Nova York – Faz mais de 60 anos desde que o empresário Ray Croc lançou as bases que fizeram da rede de lanchonetes McDonald’s um fenômeno. Eles incluem combos promocionais, processos padronizados e ingredientes industrializados – como batatas cortadas de fábrica e hambúrgueres congelados. As batatas continuam as mesmas de sempre, mas a companhia lançou nos Estados Unidos seu primeiro sanduíche feito com carne fresca – uma nova versão do bom e velho Quarteirão.
O produto já vinha sendo testado aos poucos desde 2016, mas passou a ser vendido em larga escala em março deste ano, quando foi disponibilizado em cerca de 3.500 localidades no país. No início de maio o produto ficou disponível em todas as 14.000 unidades do país.
EXAME provou o sanduíche em Nova York, onde chegou em abril. Promoções no aplicativo do McDonald’s convidam os clientes a experimentar o hambúrguer por 2 dólares (o preço original é pouco mais de 4). “Pegue um guardanapo. Você vai precisar”, diz um dos cartazes promocionais. De fato, o Quarteirão fresco é mais suculento e saboroso que o sanduíche congelado, com um sabor que até lembra o de hamburguerias bem mais caras.
O McDonald’s afirma que a velocidade da rede não será comprometida, uma vez que os hambúrgueres frescos cozinham mais rápido que os congelados. Se tudo der certo, um sanduíche leva cerca de 2 minutos para ser preparado.
Além do Quarteirão (chamado de quarter pounder nos Estados Unidos), também passaram a levar hambúrgueres frescos os sanduíches premium da marca, da linha Signature. É a mesma linha que traz os lanches da Copa no Brasil — embora os hambúrgueres frescos ainda não tenham previsão de chegada no mercado brasileiro.
“A mudança para a carne fresca nos hambúrgueres do Quarteirão é a mais significativa em nosso sistema de restaurantes e operações desde o All Day Breakfast [linha de café da manhã lançada em 2015]”, disse o presidente do McDonald’s nos Estados Unidos, Chris Kempczinski, na nota de lançamento em março.
Atrás da concorrência
O McDonald’s não é, nem de perto, a primeira rede de fast food a testar os hambúrgueres frescos. O processo, na verdade, é a grande marca registrada do concorrente Wendy’s, que usa carne fresca nos sanduíches desde sua fundação em 1969.
O Wendy’s — que abriu suas primeiras filiais no Brasil em 2017 — é a quarta maior rede de fast food dos Estados Unidos. O McDonald’s lidera, seguido pela rede de café Starbucks e pelo Subway, que vende sanduíches personalizados pelo cliente.
Dados da consultoria Mintel mostram que 74% dos consumidores estão interessados em comer hambúrgueres feitos com carne fresca, e que a maioria dos clientes aceitaria pagar mais por um produto desse tipo.
“Os consumidores associam comida fresca com saúde e qualidade, ainda que provavelmente não percebam os novos hambúrgueres como sendo saudáveis”, diz Caleb Bryant, especialista em foodservice da consultoria Mintel.
A mudança exige adaptação na logística das unidades, já que o hambúrguer não-congelado é mais frágil e suscetível a contaminação.
Há alguns episódios problemáticos na combinação fast food e produtos frescos: no Chipotle, rede de comida mexicana que trabalha com uma grande gama de ingredientes frescos, episódios de contaminação levaram à queda do fundador e então presidente Steve Ells no ano passado.
Outro que sentiu na pele a complexidade logística foi o KFC, rede que vende produtos à base de frango. Em fevereiro deste ano, a empresas teve de paralisar a operação em mais de 500 das 900 unidades no Reino Unido porque um novo fornecedor, cujo contrato havia sido fechado meses antes, não conseguiu entregar carne suficiente.
Em 2016, o presidente do McDonald’s, Steve Easterbrook, disse que não existia um fornecedor de carne fresca capaz de suprir a demanda da marca nos Estados Unidos, e por isso a mudança teria de ser feita de forma gradual.
Neste ano, em entrevista ao site Business Insider após o lançamento do novo Quarteirão, Easterbrook disse que “é possível” que os outros hambúrgueres também passem a levar carne fresca, mas que a empresa ainda está fazendo testes.
“A rede de fornecedores de todos esses grandes restaurantes é extremamente otimizada, e qualquer grande mudança requer muito planejamento”, diz Bryant, da Mintel. O especialista acredita que é justamente o tamanho da cadeia do McDonald’s que o fez demorar a implementar os produtos com carne fresca e lembra que o Wendy’s já vêm aprimorando essa logística há quatro décadas. “O Wendy’s já organizou sua rede de fornecedores para esse fim.”
Desde o anúncio da carne fresca do McDonald’s, o Wendy’s vem fazendo uma série de provocações nas redes sociais. Uma sequência de postagens no Twitter da empresa lembrava que os demais sanduíches do Mc, como o Big Mac, continuariam sendo feitos com carne congelada. Em um comercial no Super Bowl, final do campeonato de futebol americano e um dos eventos com maior audiência no mundo, o Wendy’s brincava que “o iceberg que afundou o Titanic também era congelado”, fazendo referência ao lendário acidente com o navio britânico em 1912.
Em nota a EXAME, o McDonald’s afirmou que “está sempre evoluindo” e “trabalhando de perto” com os fornecedores no processo de transição para a carne fresca, e que “elevou os já existentes padrões de qualidade da comida e procedimentos de segurança”. Entre as mudanças, os fornecedores passaram a utilizar novas geladeiras especializadas para manter a temperatura da carne ainda que sem o congelamento. A empresa afirma que é o mesmo tipo de parceria que vem sendo realizada na transição para os ovos cage-free (com galinhas que não são criadas em gaiolas) e no uso de manteiga ao invés de margarina nos produtos de café da manhã.
Conquistando os millenials
A novidade da carne fresca é mais uma na série de tentativas do McDonald’s para gradualmente deixar para trás a imagem de comida de baixa qualidade. Desde que Steve Easterbrook foi nomeado presidente, em 2015, a empresa vem tentando promover projetos para diversificar e melhorar o cardápio, como a opção de saladas, café da manhã e frango sem hormônios.
O desafio é agradar consumidores cada vez mais preocupados com alimentação saudável, variedade e qualidade da comida. Uma pesquisa de 2014 da Mintel mostrou que 42% dos millenials (de idades entre 20 e 37 anos) não confiam em grandes corporações alimentícias, uma taxa que é de apenas 18% entre os não-millennials.
“O bom preço e a conveniência ainda vão continuar sendo muito importantes. Mas só isso não é mais suficiente”, diz Patricia Smith, especialista em nutrição e mercados de fast food na Universidade de Michigan-Dearborn. “As redes de fast food não querem parecer todas iguais. Por isso elas vêm tentando desenvolver produtos que as diferenciem das demais e atraiam a fidelidade do cliente.”
O McDonald’s terminou o ano passado com o menor faturamento anual desde 2009, de 22,8 bilhões de dólares. De olho nas mudanças do mercado, a rede lançou em 2017 um plano de crescimento batizado de “Velocidade”, cujos três pilares são “manter”, “reconquistar” e “converter”. O McDonald’s afirma querer manter os clientes já fiéis, expandindo sua área de atuação, enquanto quer reconquistar os clientes que perdeu. Para chegar lá, quanto mais carne com gosto de carne, melhor.