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Montadoras: a oportunidade Trump

Michele Loureiro Se há uma indústria que deve ter sua dinâmica global chacoalhada com as políticas de Donald Trump, esta é a indústria automotiva. O novo presidente americano já criticou montadoras como Ford, GM e Toyota por fabricar no exterior carros vendidos nos Estados Unidos, e tem provocado uma corrida para novas plantas industriais no […]

MONTADORAS:  As asiáticas Hyundai, Honda e Toyota, por sua vez, ganharam 17 pontos na década, enquanto fatia da GM, Fiat e Volkswagen decresceu de 70,2% para 43.6% / Germano Lüders (Germano Luders/Exame)

MONTADORAS: As asiáticas Hyundai, Honda e Toyota, por sua vez, ganharam 17 pontos na década, enquanto fatia da GM, Fiat e Volkswagen decresceu de 70,2% para 43.6% / Germano Lüders (Germano Luders/Exame)

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Da Redação

Publicado em 9 de fevereiro de 2017 às 11h18.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 17h58.

Michele Loureiro

Se há uma indústria que deve ter sua dinâmica global chacoalhada com as políticas de Donald Trump, esta é a indústria automotiva. O novo presidente americano já criticou montadoras como Ford, GM e Toyota por fabricar no exterior carros vendidos nos Estados Unidos, e tem provocado uma corrida para novas plantas industriais no país. Mas e as montadoras instaladas no Brasil, que sofrem com metade da capacidade ociosa e demanda ainda em baixa no país, como ficam nesse novo cenário?

Para a indústria brasileira, a chegada de Trump, ao contrário do que se imagina, pode significar uma oportunidade de ampliar laços no Mercosul, na União Europeia e em mercados ainda inexplorados.

A balança comercial entre Brasil e Estados Unidos é favorável aos americanos, o que na teoria nos deixa fora da alça de mira de Trump. “Os automóveis estão entre os produtos mais comercializados entre os dois países, mas grande parte desse volume é realizada entre as companhias e essa situação não deve ser prioridade para o governo de Trump”, diz Abrão Neto, secretário de Comércio Exterior do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços.

Para o representante do MDIC, mesmo que não haja impacto direto no volume de carros comercializados entre Brasil e Estados Unidos, a indústria local pode ser beneficiada com a metodologia de Trump. Com a saída dos Estados Unidos da Parceria Transpacífico, já há um interesse maior de países europeus e sul-americanos pelo intercâmbio com os produtos brasileiros. “O número de contatos com o MDIC aumentou significativamente. Os países querem entender essa nova configuração e estreitar as relações com o Brasil”, afirma Neto.

O secretário acredita que o acordo com a União Europeia, que está há anos em pauta e não avança de forma expressiva, pode ganhar velocidade com a nova configuração da economia motivada pelas ações do presidente dos Estados Unidos. “Temos negociações claras e prioritárias de livre comércio com países da Efta (Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein), União Europeia e Índia. As iniciativas de Trump podem trazer oportunidade para da maior celeridade as conversas que estão curso”, afirma.

O aprofundamento com o Mercosul é um dos efeitos que deve surgir mais rápido. A maior parte das exportações de carros do Brasil, cerca de 80%, ficam na região. “Nosso comércio com países como Chile e Colômbia devem ganhar mais destaque”, avalia Neto.

Mas o México também é um alvo do Brasil. Com o discurso de construção de um controverso muro na fronteira e uma possível taxação de produtos vindos do país, os Estados Unidos acabaram abrindo as portas de um mercado muito importante para a indústria automotiva brasileira. “Já estamos discutindo um aprofundamento de acordo com o México. A ideia é reforçar o acordo automotivo e incluir mais cerca de 800 itens na lista de exportações”, diz o secretário do MDIC.

Para Milad Kalume Neto, gerente da consultoria especializada em indústria automotiva Jato Dynamics, o México, com maiores restrições alfandegárias americanas e ociosidade na produção, tem capacidade de sobra para ampliar as exportações ao Brasil, mas isso precisa ser um ponto de atenção para a política econômica nacional. “Se atualmente a balança comercial é desfavorável ao Brasil, a tendência é que ocorra uma sensível piora pois não seria insensato prevermos um volume maior de veículos importados daquele país”, afirma.

Nesta semana, o presidente argentino Mauricio Macri visitou o Brasil e, entre uma enxurrada de compromissos genéricos, se comprometeu a estreitar os laços entre os dois países, embora a Argentina tenha estabelecido recentemente uma nova regulamentação para beneficiar autopeças fabricadas no país.

O cenário brasileiro

As exportações de veículos cresceram 24,7% em 2016, para 520.300 unidades, ante 417.300 no ano anterior, resultado de um câmbio favorável e de uma migração para novos mercados, já que a indústria local arrefeceu. Mas enquanto o governo está otimista com novos mercados para exportação, a política industrial para o setor automotivo não torna as importações amigáveis e pode ser um agente limitador para novos parceiros.

Os números da Anfavea, associação que representa as montadoras, revelam que as importações caíram drasticamente nos últimos anos. Em 2013, foram importadas 707.000 unidades, número 62% menor do que o verificado no ano passado, quando 270.000 carros chegaram ao país.

A queda é resultado do Inovar-Auto, programa do governo federal implantado em 2012 para frear as importações e ampliar as normas de eficiência energética dos veículos. “Precisamos de uma política industrial que converse com a realidade do setor automotivo e seja viável para exportações e importações”, avalia o consultor da Jato Dynamics. A primeira fase do Inovar-Auto termina este ano e governo e montadoras estudam como será feita a renovação.

Enquanto isso, na indústria o compasso é de espera. A Anfavea não se posicionou oficialmente sobre o impacto do governo de Trump na indústria automotiva do Brasil. Rogelio Golfarb, vice-presidente de Assuntos Corporativos da Ford América do Sul, acredita que a situação deva ser acompanhada de perto. “Nosso nível de trocas com os Estados Unidos não é tão relevante, mas existe uma incerteza de como o novo presidente afeta a geopolítica e economia global. Isso traz volatilidade e estamos imersos nesse cenário”, diz.

A fim de apoiar Trump, a Ford cancelou um investimento de 1,6 bilhão de dólares programado para a construção de uma fábrica no México e anunciou um aporte de 700 milhões de dólares na unidade de Michigan, nos Estados Unidos, para desenvolver veículos autônomos e elétricos e prevê a criação de 700 postos de trabalho diretos.

Em seus famosos tweets, Trump já fez ameaças às montadoras que pretendem construir fábricas além da fronteira, como a BMW. Além disso, ele já se reuniu com representantes da Ford, Fiat Chrysler e General Motors e deixou claro que quem estiver ao seu lado terá benefícios e quem bater de frente terá a vida publicamente dificultada. A verborragia de Trump, aliada à capacidade ociosa de nossas montadoras, é uma oportunidade e tanto de conquistar novos clientes mundo afora. Não convém desperdiçá-la.

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