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JBS vai para a Venezuela e vira tábua de salvação de Maduro

A principal preocupação do governo no momento é a oferta de alimentos

Carne da JBS: No momento, a principal preocupação do governo venezuelano é a oferta de alimentos (Divulgação)
DR

Da Redação

Publicado em 8 de setembro de 2015 às 14h39.

Em junho, o presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Diosdado Cabello, passou quatro dias no Brasil. Acompanhado de outras autoridades, reuniu-se com a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula. Pelo Twitter, declarou que estava “trabalhando pela Pátria”.

Mas o primeiro encontro importante de Cabello no Brasil foi com Joesley Batista, o mais velho dos cinco irmãos do clã bilionário que controla a JBS, o maior produtor mundial de carnes.

O líder venezuelano jantou com a família Batista e dedicou três dias de sua viagem a visitar fábricas do frigorífico brasileiro.

A visita de Cabello ao Brasil diz muito sobre a relação de codependência que surge entre a JBS e o governo da Venezuela, bem como sobre as atuais prioridades da administração chavista no momento en que a hiperinflação, a queda na produção e o aumento da criminalidade levam ao racionamento de alimentos, às revoltas populares e aos saques.

“A principal preocupação do governo no momento é a oferta de alimentos”, afirma Fernando Portela, diretor-executivo da Câmara de Comércio e Indústria Venezuelano-Brasileira (Cavenbra).

“Eles precisam continuar abastecendo as lojas para permanecer no poder”.

Na Venezuela, apenas um em cada cinco eleitores diz querer que o presidente Nicolás Maduro termine seu mandato, que vai até 2019. Com as eleições parlamentares marcadas para dezembro, o partido do governo corre o risco de perder o controle do Congresso pela primeira vez em 16 anos.

Cabello declarou que viajava ao Brasil com o objetivo de negociar o fornecimento de alimentos e medicamentos e, assim, vencer a “guerra econômica” que os capitalistas estariam travando contra seu país. O governo não respondeu aos pedidos da reportagem por mais esclarecimentos.

Acordo diferenciado

Para a JBS, o mercado venezuelano ganhou um significado especial. A empresa, que em abril fechou um contrato de US$ 2,1 bilhões com o governo daquele país, é responsável por quase metade da carne bovina e um quarto do frango consumido por 28 milhões de consumidores.

O país vizinho responde por cerca de 10 por cento das receitas de exportação da companhia. Para alguns analistas, trata-se de uma posição de risco, já que a Venezuela está perto de um calote. A JBS pensa diferente.

“Para a JBS, foi a oportunidade de fazer algo que ninguém mais fez em um país que tem uma demanda potencial importante”, disse Miguel Gularte, presidente da JBS Mercosul, em entrevista.

Ao assumir o processo de distribuição e empacotamento de seus produtos na Venezuela, a JBS conseguiu reduzir drasticamente o tempo necessário para que os alimentos importados chegassem às prateleiras, um diferencial competitivo, disse o executivo.

A JBS tem um acordo que outras empresas não têm. No ano passado, a multinacional vendeu cerca de US$ 1,2 bilhão em alimentos ao governo venezuelano, tendo sido paga em até 90 dias, segundo documentos elaborados em conjunto pela firma brasileira e pela estatal que detém o monopólio das importações, a Corpovex. Segundo Gularte, a JBS espera ampliar em 20 por cento as vendas à Venezuela em 2015.

A companhia está negociando a estruturação de um financiamento de longo prazo com o Credit Suisse AG para acelerar seu crescimento na Venezuela.

Faturas não pagas

Em contrapartida, várias corporações locais e estrangeiras há anos não conseguem obter dólares, racionados pelo governo venezuelano. A Ecoanalítica, uma consultoria com sede em Caracas, estima que o governo venezuelano possui US$ 28 bilhões em faturas não pagas a empresas privadas.

“Para a Venezuela, é uma vantagem negociar com uma única empresa de multiproteína, com uma plataforma logística integrada, em vez de comprar frango de uma empresa, carne bovina de outra”, afirma Gularte. “A Venezuela encontrou um parceiro que a respeita”.

O acordo com a JBS oferece uma tábua de salvação ao governo de Maduro, que se esforça para preencher as prateleiras dos supermercados antes das eleições.

Politicamente, os governos do Brasil e da Venezuela têm se apoiado em meio à crise. Nicolás Maduro defendeu Dilma Rousseff contra os pedidos de impeachment da oposição. Dilma, por sua vez, criticou as sanções dos Estados Unidos contra o governo Maduro.

Doações políticas

No ano passado, a JBS foi a maior doadora para a campanha da presidente Dilma Rousseff à reeleição. As doações políticas ao PT e a outros partidos foram citadas na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga as operações do BNDES, que possui cerca de um quarto das ações da JBS.

As exportações da JBS para a Venezuela não contam com financiamento público, e o acordo com a Corpovex não tinha sido sequer comunicado ao governo brasileiro, afirma Gularte. A JBS preferiu não comentar sobre a CPI do BNDES.

Os laços entre a JBS e o governo venezuelano são dignos de nota em um país onde as importações despencaram devido ao colapso do petróleo, a principal fonte de receita do país, e onde as empresas de alimentos têm sido particularmente visadas pelo governo.

Em julho, soldados ocuparam os armazéns da maior produtora local de alimentos, a Empresas Polar, acusada pelo governo de sabotar a economia por reduzir a produção. A companhia, com sede em Caracas, diz que as autoridades monetárias da Venezuela lhe devem US$ 463 milhões.

Risco de crédito

Os principais concorrentes da JBS também sentiram dificuldades na Venezuela. Neste ano, a BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, e o frigorífico Marfrig deixaram de exportar para o país vizinho em meio ao crescente risco de crédito.

O frigorífico Minerva informou que só exporta para a Venezuela quando pago com antecedência. A saída dessas empresas ajudou a impulsionar a participação da JBS no mercado venezuelano.

A cada 10 dias, um navio da Hamburg Süd contratado pela JBS adentra o maior porto da Venezuela, Puerto Cabello.

Duas semanas depois de deixarem o Brasil, os contêineres brancos e refrigerados cheios de carne e outros produtos são descarregados e despachados. A estatal Corporación de Abastecimientos y Servicios Agrícolas (Casa) monitora cada contêiner diariamente.

Segundo as autoridades portuárias, os alimentos são transportados prioritariamente para as áreas mais ameaçadas por distúrbios ou por campanhas da oposição.

Fronteira fechada

Recentemente, o governo Maduro declarou estado de emergência perto de parte da fronteira colombiana, argumentando que o contrabando de alimentos agravava a escassez. Para os críticos, o presidente venezuelano tentou criar um bode expiatório para desviar a atenção de suas políticas fracassadas.

Empresas locais enfrentam perspectivas muito diferentes das da JBS no que diz respeito as preços recebidos e à distribuição de seus produtos.

Um frigorífico venezuelano que vende carne de vacas criadas localmente a um supermercado privado recebe apenas 16 por cento do preço da carne brasileira, segundo Franz Rivas, diretor-executivo da Associação Venezuelana de Frigoríficos (Asofrigo).

Um contêiner importado por uma empresa privada venezuelana pode permanecer semanas em um navio fora do porto e esperar até dois meses para passar pela alfândega, segundo a Cavenbra e a Câmara de Comércio de Puerto Cabello.

O programa de redistribuição de terras do governo, uma das causas do embate entre os socialistas e o setor privado, tirou muitos pequenos pecuaristas do negócio.

Com isso, a fatia da produção doméstica de carne bovina o mercado caiu de 60 por cento para 20 por cento na última década, segundo o Conselho Venezuelano da Carne e o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA, na sigla em inglês).

Reflexo da crise na indústria, as importações de gado para abate local também desabaram. No ano passado, a Venezuela, que chegou a ser o segundo maior importador mundial de gado, praticamente não recebeu nenhum volume, de acordo com dados do USDA.

Segundo Rivas, todos os frigoríficos membros da Asofrigo operam com prejuízo atualmente.

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Em junho, o presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Diosdado Cabello, passou quatro dias no Brasil. Acompanhado de outras autoridades, reuniu-se com a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula. Pelo Twitter, declarou que estava “trabalhando pela Pátria”.

Mas o primeiro encontro importante de Cabello no Brasil foi com Joesley Batista, o mais velho dos cinco irmãos do clã bilionário que controla a JBS, o maior produtor mundial de carnes.

O líder venezuelano jantou com a família Batista e dedicou três dias de sua viagem a visitar fábricas do frigorífico brasileiro.

A visita de Cabello ao Brasil diz muito sobre a relação de codependência que surge entre a JBS e o governo da Venezuela, bem como sobre as atuais prioridades da administração chavista no momento en que a hiperinflação, a queda na produção e o aumento da criminalidade levam ao racionamento de alimentos, às revoltas populares e aos saques.

“A principal preocupação do governo no momento é a oferta de alimentos”, afirma Fernando Portela, diretor-executivo da Câmara de Comércio e Indústria Venezuelano-Brasileira (Cavenbra).

“Eles precisam continuar abastecendo as lojas para permanecer no poder”.

Na Venezuela, apenas um em cada cinco eleitores diz querer que o presidente Nicolás Maduro termine seu mandato, que vai até 2019. Com as eleições parlamentares marcadas para dezembro, o partido do governo corre o risco de perder o controle do Congresso pela primeira vez em 16 anos.

Cabello declarou que viajava ao Brasil com o objetivo de negociar o fornecimento de alimentos e medicamentos e, assim, vencer a “guerra econômica” que os capitalistas estariam travando contra seu país. O governo não respondeu aos pedidos da reportagem por mais esclarecimentos.

Acordo diferenciado

Para a JBS, o mercado venezuelano ganhou um significado especial. A empresa, que em abril fechou um contrato de US$ 2,1 bilhões com o governo daquele país, é responsável por quase metade da carne bovina e um quarto do frango consumido por 28 milhões de consumidores.

O país vizinho responde por cerca de 10 por cento das receitas de exportação da companhia. Para alguns analistas, trata-se de uma posição de risco, já que a Venezuela está perto de um calote. A JBS pensa diferente.

“Para a JBS, foi a oportunidade de fazer algo que ninguém mais fez em um país que tem uma demanda potencial importante”, disse Miguel Gularte, presidente da JBS Mercosul, em entrevista.

Ao assumir o processo de distribuição e empacotamento de seus produtos na Venezuela, a JBS conseguiu reduzir drasticamente o tempo necessário para que os alimentos importados chegassem às prateleiras, um diferencial competitivo, disse o executivo.

A JBS tem um acordo que outras empresas não têm. No ano passado, a multinacional vendeu cerca de US$ 1,2 bilhão em alimentos ao governo venezuelano, tendo sido paga em até 90 dias, segundo documentos elaborados em conjunto pela firma brasileira e pela estatal que detém o monopólio das importações, a Corpovex. Segundo Gularte, a JBS espera ampliar em 20 por cento as vendas à Venezuela em 2015.

A companhia está negociando a estruturação de um financiamento de longo prazo com o Credit Suisse AG para acelerar seu crescimento na Venezuela.

Faturas não pagas

Em contrapartida, várias corporações locais e estrangeiras há anos não conseguem obter dólares, racionados pelo governo venezuelano. A Ecoanalítica, uma consultoria com sede em Caracas, estima que o governo venezuelano possui US$ 28 bilhões em faturas não pagas a empresas privadas.

“Para a Venezuela, é uma vantagem negociar com uma única empresa de multiproteína, com uma plataforma logística integrada, em vez de comprar frango de uma empresa, carne bovina de outra”, afirma Gularte. “A Venezuela encontrou um parceiro que a respeita”.

O acordo com a JBS oferece uma tábua de salvação ao governo de Maduro, que se esforça para preencher as prateleiras dos supermercados antes das eleições.

Politicamente, os governos do Brasil e da Venezuela têm se apoiado em meio à crise. Nicolás Maduro defendeu Dilma Rousseff contra os pedidos de impeachment da oposição. Dilma, por sua vez, criticou as sanções dos Estados Unidos contra o governo Maduro.

Doações políticas

No ano passado, a JBS foi a maior doadora para a campanha da presidente Dilma Rousseff à reeleição. As doações políticas ao PT e a outros partidos foram citadas na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga as operações do BNDES, que possui cerca de um quarto das ações da JBS.

As exportações da JBS para a Venezuela não contam com financiamento público, e o acordo com a Corpovex não tinha sido sequer comunicado ao governo brasileiro, afirma Gularte. A JBS preferiu não comentar sobre a CPI do BNDES.

Os laços entre a JBS e o governo venezuelano são dignos de nota em um país onde as importações despencaram devido ao colapso do petróleo, a principal fonte de receita do país, e onde as empresas de alimentos têm sido particularmente visadas pelo governo.

Em julho, soldados ocuparam os armazéns da maior produtora local de alimentos, a Empresas Polar, acusada pelo governo de sabotar a economia por reduzir a produção. A companhia, com sede em Caracas, diz que as autoridades monetárias da Venezuela lhe devem US$ 463 milhões.

Risco de crédito

Os principais concorrentes da JBS também sentiram dificuldades na Venezuela. Neste ano, a BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, e o frigorífico Marfrig deixaram de exportar para o país vizinho em meio ao crescente risco de crédito.

O frigorífico Minerva informou que só exporta para a Venezuela quando pago com antecedência. A saída dessas empresas ajudou a impulsionar a participação da JBS no mercado venezuelano.

A cada 10 dias, um navio da Hamburg Süd contratado pela JBS adentra o maior porto da Venezuela, Puerto Cabello.

Duas semanas depois de deixarem o Brasil, os contêineres brancos e refrigerados cheios de carne e outros produtos são descarregados e despachados. A estatal Corporación de Abastecimientos y Servicios Agrícolas (Casa) monitora cada contêiner diariamente.

Segundo as autoridades portuárias, os alimentos são transportados prioritariamente para as áreas mais ameaçadas por distúrbios ou por campanhas da oposição.

Fronteira fechada

Recentemente, o governo Maduro declarou estado de emergência perto de parte da fronteira colombiana, argumentando que o contrabando de alimentos agravava a escassez. Para os críticos, o presidente venezuelano tentou criar um bode expiatório para desviar a atenção de suas políticas fracassadas.

Empresas locais enfrentam perspectivas muito diferentes das da JBS no que diz respeito as preços recebidos e à distribuição de seus produtos.

Um frigorífico venezuelano que vende carne de vacas criadas localmente a um supermercado privado recebe apenas 16 por cento do preço da carne brasileira, segundo Franz Rivas, diretor-executivo da Associação Venezuelana de Frigoríficos (Asofrigo).

Um contêiner importado por uma empresa privada venezuelana pode permanecer semanas em um navio fora do porto e esperar até dois meses para passar pela alfândega, segundo a Cavenbra e a Câmara de Comércio de Puerto Cabello.

O programa de redistribuição de terras do governo, uma das causas do embate entre os socialistas e o setor privado, tirou muitos pequenos pecuaristas do negócio.

Com isso, a fatia da produção doméstica de carne bovina o mercado caiu de 60 por cento para 20 por cento na última década, segundo o Conselho Venezuelano da Carne e o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA, na sigla em inglês).

Reflexo da crise na indústria, as importações de gado para abate local também desabaram. No ano passado, a Venezuela, que chegou a ser o segundo maior importador mundial de gado, praticamente não recebeu nenhum volume, de acordo com dados do USDA.

Segundo Rivas, todos os frigoríficos membros da Asofrigo operam com prejuízo atualmente.

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