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Como combater culturas tóxicas no ambiente de trabalho

Jon Picoult © 2016 New York Times News Service Uma empresa descobre que seus funcionários têm se comportado mal, e até de forma antiética. Muitas agências do governo resolvem investigar. Os consumidores ficam enraivecidos. Executivos da empresa ficam chocados com as revelações e garantem que nunca deram ordens para que seus subordinados agissem de forma […]

Nas imagens, a senadora Elizabeth Warren questiona John Stumpf, diretor-executivo do Wells Fargo, em uma audiência em setembro, nos EUA / Gabriella Demczuk/The New York Times

Nas imagens, a senadora Elizabeth Warren questiona John Stumpf, diretor-executivo do Wells Fargo, em uma audiência em setembro, nos EUA / Gabriella Demczuk/The New York Times

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Da Redação

Publicado em 17 de outubro de 2016 às 13h46.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h09.

Jon Picoult
© 2016 New York Times News Service

Uma empresa descobre que seus funcionários têm se comportado mal, e até de forma antiética. Muitas agências do governo resolvem investigar. Os consumidores ficam enraivecidos. Executivos da empresa ficam chocados com as revelações e garantem que nunca deram ordens para que seus subordinados agissem de forma tão repreensível.

Soa familiar?

Foi isso que aconteceu recentemente no escândalo do Wells Fargo, quando foi divulgado que alguns funcionários do banco haviam aberto contas e emitido cartões de crédito sem o consentimento dos clientes, na tentativa de bater metas comerciais agressivas.

John G. Stumpf, executivo-chefe do banco, declarou que as ações foram um lapso ético envolvendo 5.300 funcionários do baixo escalão, que já foram despedidos. Mas diversas pessoas que trabalham ou trabalharam no banco falam a respeito de um ambiente no qual os gestores checam o volume de vendas diversas vezes ao dia, para garantir o cumprimento das metas. Os vendedores capazes de bater as metas ganham bônus consideráveis.

Mas essa é uma história que não ocorre apenas no Wells Fargo. Trata-se de uma narrativa bem conhecida, comum a inúmeras empresas.

Na Volkswagen, os engenheiros equiparam milhões de carros com um software capaz de burlar os testes de emissão de carbono para que os automóveis ficassem dentro dos limites orçamentários da empresa. Na General Motors, gestores relatam atraso no recall de disjuntores defeituosos e potencialmente perigosos em decorrência de preocupações com os custos da troca. E também não podemos nos esquecer do escândalo do Departamento de Relações de Veteranos das Forças Armadas dos EUA que falsificou listas de espera para cumprir metas de serviço agressivas e pouco realistas.

Em todos esses casos, os gestores se mostraram chocados com os lapsos, e as investigações acabaram por culpar a “cultura” das empresas pela situação.

Mas como uma cultura tóxica pode se desenvolver de maneira diametralmente oposta a tudo o que os líderes supostamente dizem e defendem? A resposta reside em uma variação do clássico “faça o que eu digo, não faça o que eu faço”. Os funcionários apreendem a cultura da empresa não a partir dos discursos da gerência, mas dos sinais que ela dá.

Esses sinais estão presentes em todo o espaço de trabalho. Algumas vezes, aparecem de forma declarada, como na forma das atribuídas recompensas e o reconhecimento. Mas também podem emergir de modo mais sutil, como nas métricas prediletas dos gestores, e como eles reagem a opiniões adversas.

Esses sinais podem facilmente sobrepujar até mesmo os discursos mais cuidadosos da diretoria sobre as missões e os valores da empresa. Eles cercam os funcionários a todo o momento, direcionando seu foco e moldando suas percepções sobre quais são os bons e os maus comportamentos.

Os problemas no Wells Fargo, na Volkswagen, na GM e na VA são exemplos perfeitos de como os sinais do ambiente de trabalho são capazes de moldar a cultura organizacional e o comportamento dos funcionários de formas inesperadas. Contudo, essa dinâmica está presente em praticamente todas as empresas, como pude testemunhar enquanto ajudava algumas delas a encontrar essas contradições.

Nos piores casos, esses sinais levam a comportamentos antiéticos e muitas vezes até ilegais. Contudo, na maioria das vezes simplesmente servem de referência aos funcionários sobre os tipos de pessoa e de comportamentos que a empresa realmente valoriza. Embora esses problemas não apareçam nas manchetes, as consequências podem ser extremamente graves.

Por exemplo, uma empresa com a qual trabalhei não conseguia garantir que seus representantes comerciais se concentrassem na qualidade, ao invés da velocidade em ligações telefônicas. Não importa o que os executivos dissessem, os funcionários teimavam em terminar as ligações o mais rápido que pudessem, sem se importar com a qualidade do serviço.

O que estava realmente por trás desse comportamento? Em todas as ligações, os monitores exibiam um enorme relógio digital que registrava cada segundo, tiquetaqueando ameaçadoramente enquanto a ligação prosseguia. Esse era um sinal que os gestores simplesmente não eram capazes de esconder em seus discursos.

Outra empresa tinha dificuldades com o moral baixo da equipe de serviços, que sempre se sentia como cidadãos de segunda classe dentro da empresa, ainda que os gestores sempre falassem sobre a importância dos funcionários para o sucesso da empresa.

Contudo, os sinais no local de trabalho contavam uma história completamente diferente. A equipe trabalhava em um prédio velho e sem reforma – oposto à estrutura com domo dourado onde trabalhava o restante dos funcionários.

Esse sinal dourado de privilégio também estava presente no sistema de incentivos da empresa. Representantes comerciais com desempenho superior eram premiados com viagens para resorts luxuosos. Quando os integrantes da equipe de serviço superavam as metas, eles recebiam um ticket valendo uma refeição grátis no restaurante da empresa.

Havia ainda uma rede varejista cujos funcionários viviam tão focados em seguir as regras e regulamentações que acabavam por perder de vista os clientes que deveriam atender. Depois de analisar os sinais no ambiente de trabalho, a empresa descobriu qual era o problema: o primeiro tópico abordado nos treinamentos de novos funcionários eram as 17 razões pelas quais poderiam ser demitidos por violar as regras da empresa. Não espanta, portanto, que os trabalhadores estivessem tão focados em cumprir as regras, à custa do serviço prestado aos clientes.

As empresas muitas vezes ficam intrigadas ao perceber que os funcionários não estão agindo de acordo com seus valores, nem atendendo aos pedidos dos executivos. Porém, não há razão para se surpreender. São os comportamentos do dia a dia que moldam as normas culturais da empresa. Enquanto os executivos não prestarem atenção nesses sinais sutis, vão continuar a se surpreender como que seus funcionários são motivados a fazer.

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