A hora do ganha-ganha
A chamada precificação, ou a arte de cotar preços, é um campo tão complexo que vem desconcertando estudiosos e executivos de vendas e marketing há séculos. Em nenhuma outra área do marketing fica tão clara a natureza dual de conflito/cooperação existente na relação entre comprador e vendedor. Uma parte dessa relação é um jogo de […]
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 09h27.
A chamada precificação, ou a arte de cotar preços, é um campo tão complexo que vem desconcertando estudiosos e executivos de vendas e marketing há séculos. Em nenhuma outra área do marketing fica tão clara a natureza dual de conflito/cooperação existente na relação entre comprador e vendedor. Uma parte dessa relação é um jogo de soma zero, ou seja, o lucro de um representa necessariamente o prejuízo do outro. Mas existe uma faceta nessa relação em que ambos podem sair ganhando. É o que acontece na precificação vinculada ao desempenho, ou PDV.
Trata-se de uma situação em que o vendedor é remunerado de acordo com o desempenho efetivo de seu produto ou serviço. Isso está se tornando mais e mais comum. No meio publicitário, as agências tradicionalmente recebiam 15% do custo da mídia que adquiriam para um cliente. Hoje, cada vez mais a remuneração delas depende de atingirem ou não certas metas de publicidade ou marketing. A empreiteira que reconstruiu a via expressa de Los Angeles, danificada no terremoto de 1995, recebeu enormes incentivos pelo desempenho ao concluir a obra antes do prazo. A mesma tendência pode ser vista em setores tão diversos quanto consultoria, transporte rodoviário e serviços industriais pesados.
Veja o que aconteceu entre a ABB e a Ford. A montadora precisava de um fornecedor que projetasse e construísse uma fábrica de pintura automotiva em Oakville, no Canadá. As duas empresas concordaram em trabalhar juntas rejeitando a abordagem tradicional de concorrências baseadas em informações incompletas. O projeto começou com uma troca maciça de informações e levou a um tipo inédito de acordo. A ABB iria projetar e construir a fábrica por um preço muito abaixo da média. Mais tarde, se conseguisse reduzir ainda mais os custos, receberia um percentual pré-acordado do que fosse economizado. Resultado: a Ford foi beneficiada com custos muito menores e um nível de risco mais baixo. A ABB obteve uma parcela dos ganhos que gerou ao reduzir os custos e realizar um projeto mais aperfeiçoado.
A precificação vinculada ao desempenho é uma espécie de seguro que garante que o vendedor não cobrará menos que o usual do comprador. Quando houver dúvidas a respeito do desempenho final de um serviço ou produto, esse tipo de arranjo garante que, se o vendedor fornecer mais, ele receberá mais. Igualmente importante, o comprador tem a garantia de que não irá pagar mais do que o usual. Quando o desempenho final for dúbio, a PVD permitirá ao comprador pagar somente pelo desempenho que efetivamente obtiver, segundo um critério mensurável. Mais do que ninguém, os indivíduos responsáveis pelas decisões de compra não querem absorver o risco profissional de pagar mais do que o usual. Na vida pessoal, se pagamos caro demais por um produto, sofremos uma conseqüência marginal. Numa empresa, isso pode destruir o emprego e a carreira de um diretor de compras.
Existem outros benefícios. Um arranjo contratual normal não forçaria o vendedor e o comprador a estabelecer comunicação a fundo entre si. Já os contratos de PVD costumam ser muito intrincados, pois ambas as partes são obrigadas a lidar com as limitações e os objetivos do outro. A própria discussão em detalhes dessas questões serve para estabelecer uma comunicação "de banda larga" entre as duas partes. Essa abertura é um incentivo para maior cooperação e coordenação entre comprador e vendedor. Esse tipo de acordo, muito mais amplo, oferece maior valor ao primeiro e custo menor para o segundo.
A lógica econômica da PVD é poderosa. Sua eficácia está sendo comprovada na prática por diversas empresas. A EDS usou essa estratégia na integração e terceirização de sistemas. Órgãos públicos americanos a usaram em serviços como limpeza de resíduos e reposicionamento profissional para desempregados. Mas essa precificação, que é complexa, não serve para qualquer tipo de cotação. Em determinadas situações, variantes limitadas podem ser úteis. Por exemplo, a utilização de garantias pontuais, como cláusulas punitivas que estipulam descontos para entregas fora do prazo.
Ben Shapiro é consultor e professor da
Harvard Business School. Ele participará de um seminário promovido pela HSM, com o apoio de EXAME, em 11 de abril, em São Paulo