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1º restaurante a desafiar o apartheid fecha após 40 anos

Gramadoelas foi o primeiro grande restaurante que desafiou o regime do apartheid permitindo a entrada de clientes negros

Mandela: assim como o ex-presidente sul-africano, restaurante Gramadoelas era símbolo da luta contra o apartheid (Chris Jackson / Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 3 de agosto de 2013 às 10h39.

Johanesburgo - O histórico Gramadoelas de Johanesburgo, o primeiro grande restaurante que desafiou o regime do apartheid permitindo a entrada de clientes negros, serviu pela última vez seu célebre buffet pan-sul-africano e fechou as portas.

Sua aposta contra a segregação racial chegou quase por acaso, depois que o governo sul-africano da época do regime segregacionista não respondeu ao telefonema do restaurante que pedia autorização para a reserva de um grupo de políticos norte-americanos que incluía negros.

Os proprietários se aventuraram a atender os clientes, e a falta de resposta oficial do regime racista do apartheid a sua transgressão lhes deu confiança para permitir a entrada de pessoas de qualquer raça.

"Se, de maneira excepcional, quiséssemos servir a pessoas negras ou mulatas, deveríamos entrar em contato com Pretória para pedir permissão", recorda Odwan Naudé, dono e fundador do estabelecimento, que fechou no último mês de julho após mais de quatro décadas com as fornalhas acesas.

"Em uma ocasião, tivemos uma reserva de um grupo de políticos norte-americanos, alguns deles negros, mas ninguém atendia no telefone de Pretória", relata Naudé, que junto a seu sócio e companheiro sentimental, Brian Shalkoff, decidiram tentar a sorte.

"A polícia não interveio e, a partir daquele dia, abrimos as portas a todos. Acho que fomos os primeiros", conta o empresário.

Mas o Gramadoelas, que serviu personalidades como a rainha Elizabeth II da Inglaterra e o ex-presidente sul-africano Nelson Mandela, também é famoso pelo citado buffet pan-sul-africano, que abrange todas as tradições culinárias que convivem no país.

Essa singularidade, junto à decoração de época, transformou o restaurante, ao longo de sua trajetória, em um dos locais que melhor reflete a diversidade da África do Sul.

"Fomos os primeiros a oferecer toda a culinária sul-africana", diz com satisfação Naudé, que, apesar de seus 82 anos, lamenta ter de fechar seu restaurante.


A vida desse mítico local chega ao fim com o vencimento da concessão do espaço que ocupa no famoso Market Theatre, no centro de Johanesburgo.

Fundado em 1967 no bairro de Hillbrow, o Gramadoelas - que significa "lugar remoto" no idioma afrikaans - cumpriu amplamente seu objetiv, e recebeu sul-africanos de todas as raças, turistas e celebridades como as atrizes Charlize Theron e Catherine Deneuve.

De todas as ilustres visitas, Naudé lembra especialmente a de Mandela em 1994, antes de sua posse como primeiro presidente negro da África do Sul.

"Veio a um ato grande com Hillary Clinton no teatro, no qual nós servíamos a comida", explica.

"Lembro que, embora não estivesse previsto que comeria aqui, entrou no restaurante, chamou todos os funcionários, apresentou-se, felicitou-lhes e agradeceu pela boa comida que haviam servido nas suas visitas anteriores", acrescentou.

A complexa história do país se reflete nos 46 anos de história do restaurante e nas suas paredes, onde estão quadros do holandês pioneiro na África do Sul, Jan van Riebeeck, com utensílios culinários de madeira típicos dos povos africanos.

O fechamento do Gramadoelas deixa órfãos frequentadores das sessões do Market Theatre, que passavam o tempo degustando algumas de suas especialidades enquanto esperavam a próxima sessão da casa de espetáculos.

É o caso do "pescado em escabeche do Cabo", temperado com produtos asiáticos que os escravos malaios trazidos pelos primeiros colonos procedentes da Holanda - dos quais descende o próprio Naudé - introduziram nas cozinhas de seus senhores.

Esse tipo de prato mestiço era, talvez, o mais emblemático do cardápio do restaurante, que também preparava a africâner salsicha boerewors, frango ao curry indiano e pratos negros como o mohodu (tripas).

O fim do Gramadoelas veio acompanhado de uma tragédia.


Brian Shalkoff morreu nesse mês de julho após receber uma brutal surra durante um assalto à casa que dividia com Naudé no centro de Johanesburgo.

Durante uma das últimas noites de serviço no restaurante, Odwan Naudé recebeu os pêsames e emocionantes despedidas dos fiéis clientes que conserva há décadas.

O anfitrião respondeu a todos com excelente educação, sem esconder sua tristeza pelo fechamento e pelo que chama de "a tragédia de Brian".

Naudé também não esconde o orgulho por tudo o que conseguiram juntos com o Gramadoelas, cuja vasta coleção de móveis, talheres e objetos decorativos antigos foi leiloada esta semana no próprio local.

Para trás, ficam mais de quatro décadas de história gastronômica sul-africana, a lembrança indelével de milhares de clientes que degustaram seus manjares e o inevitável pesar de Odwan Naudé.

"Sinto muito que o teatro precise deste espaço - confessa o veterano empresário -, porque teria gostado de continuar uns anos mais...".

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Johanesburgo - O histórico Gramadoelas de Johanesburgo, o primeiro grande restaurante que desafiou o regime do apartheid permitindo a entrada de clientes negros, serviu pela última vez seu célebre buffet pan-sul-africano e fechou as portas.

Sua aposta contra a segregação racial chegou quase por acaso, depois que o governo sul-africano da época do regime segregacionista não respondeu ao telefonema do restaurante que pedia autorização para a reserva de um grupo de políticos norte-americanos que incluía negros.

Os proprietários se aventuraram a atender os clientes, e a falta de resposta oficial do regime racista do apartheid a sua transgressão lhes deu confiança para permitir a entrada de pessoas de qualquer raça.

"Se, de maneira excepcional, quiséssemos servir a pessoas negras ou mulatas, deveríamos entrar em contato com Pretória para pedir permissão", recorda Odwan Naudé, dono e fundador do estabelecimento, que fechou no último mês de julho após mais de quatro décadas com as fornalhas acesas.

"Em uma ocasião, tivemos uma reserva de um grupo de políticos norte-americanos, alguns deles negros, mas ninguém atendia no telefone de Pretória", relata Naudé, que junto a seu sócio e companheiro sentimental, Brian Shalkoff, decidiram tentar a sorte.

"A polícia não interveio e, a partir daquele dia, abrimos as portas a todos. Acho que fomos os primeiros", conta o empresário.

Mas o Gramadoelas, que serviu personalidades como a rainha Elizabeth II da Inglaterra e o ex-presidente sul-africano Nelson Mandela, também é famoso pelo citado buffet pan-sul-africano, que abrange todas as tradições culinárias que convivem no país.

Essa singularidade, junto à decoração de época, transformou o restaurante, ao longo de sua trajetória, em um dos locais que melhor reflete a diversidade da África do Sul.

"Fomos os primeiros a oferecer toda a culinária sul-africana", diz com satisfação Naudé, que, apesar de seus 82 anos, lamenta ter de fechar seu restaurante.


A vida desse mítico local chega ao fim com o vencimento da concessão do espaço que ocupa no famoso Market Theatre, no centro de Johanesburgo.

Fundado em 1967 no bairro de Hillbrow, o Gramadoelas - que significa "lugar remoto" no idioma afrikaans - cumpriu amplamente seu objetiv, e recebeu sul-africanos de todas as raças, turistas e celebridades como as atrizes Charlize Theron e Catherine Deneuve.

De todas as ilustres visitas, Naudé lembra especialmente a de Mandela em 1994, antes de sua posse como primeiro presidente negro da África do Sul.

"Veio a um ato grande com Hillary Clinton no teatro, no qual nós servíamos a comida", explica.

"Lembro que, embora não estivesse previsto que comeria aqui, entrou no restaurante, chamou todos os funcionários, apresentou-se, felicitou-lhes e agradeceu pela boa comida que haviam servido nas suas visitas anteriores", acrescentou.

A complexa história do país se reflete nos 46 anos de história do restaurante e nas suas paredes, onde estão quadros do holandês pioneiro na África do Sul, Jan van Riebeeck, com utensílios culinários de madeira típicos dos povos africanos.

O fechamento do Gramadoelas deixa órfãos frequentadores das sessões do Market Theatre, que passavam o tempo degustando algumas de suas especialidades enquanto esperavam a próxima sessão da casa de espetáculos.

É o caso do "pescado em escabeche do Cabo", temperado com produtos asiáticos que os escravos malaios trazidos pelos primeiros colonos procedentes da Holanda - dos quais descende o próprio Naudé - introduziram nas cozinhas de seus senhores.

Esse tipo de prato mestiço era, talvez, o mais emblemático do cardápio do restaurante, que também preparava a africâner salsicha boerewors, frango ao curry indiano e pratos negros como o mohodu (tripas).

O fim do Gramadoelas veio acompanhado de uma tragédia.


Brian Shalkoff morreu nesse mês de julho após receber uma brutal surra durante um assalto à casa que dividia com Naudé no centro de Johanesburgo.

Durante uma das últimas noites de serviço no restaurante, Odwan Naudé recebeu os pêsames e emocionantes despedidas dos fiéis clientes que conserva há décadas.

O anfitrião respondeu a todos com excelente educação, sem esconder sua tristeza pelo fechamento e pelo que chama de "a tragédia de Brian".

Naudé também não esconde o orgulho por tudo o que conseguiram juntos com o Gramadoelas, cuja vasta coleção de móveis, talheres e objetos decorativos antigos foi leiloada esta semana no próprio local.

Para trás, ficam mais de quatro décadas de história gastronômica sul-africana, a lembrança indelével de milhares de clientes que degustaram seus manjares e o inevitável pesar de Odwan Naudé.

"Sinto muito que o teatro precise deste espaço - confessa o veterano empresário -, porque teria gostado de continuar uns anos mais...".

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