OMS critica lentidão da vacinação na Europa e piora da crise no Brasil
A situação da pandemia no Brasil é "claramente crítica", com a maioria das unidades de tratamento intensivo em hospitais com 90% ou mais de ocupação, segundo avaliou a epidemiologista Maria Van Kerkhove
Mariana Martucci
Publicado em 1 de abril de 2021 às 18h36.
Última atualização em 1 de abril de 2021 às 19h30.
A Organização Mundial da Saúde ( OMS ) criticou nesta quinta-feira, 1º, a lentidão "inaceitável" da vacinação na Europa, em um momento em que a pandemia de covid-19 se agrava na América Latina, especialmente no Brasil, que registrou em março seu mês mais letal.
"Atualmente a situação regional é a mais preocupante em vários meses", declarou o diretor da divisão Europa da OMS, Hans Kluge.
Dos 2,8 milhões de mortos registrados no mundo desde dezembro de 2019, a região da Europa soma o maior número, com cerca de 958.000 óbitos, seguida por América Latina e Caribe (cerca de 783.500) e Estados Unidos e Canadá (575.000), conforme balanço da AFP estabelecido nesta quinta.
Na zona Europa — com 50 países, incluindo Rússia e vários estados da Ásia Central —, mais de 24.000 mortes foram contabilizadas na semana passada e estão "rapidamente" se aproximando de 1 milhão no total, segundo a organização.
"Precisamos agilizar o processo, aumentando a produção, reduzindo os obstáculos à [ sua ] administração (...) e aproveitando todas as doses armazenadas", acrescentou Kluge.
Mas nesta mesma sexta-feira, os países-membros da UE disputaram acirradamente a distribuição de 10 milhões de doses adicionais do medicamento Pfizer BioNTech.
Os dois laboratórios também confirmaram que o medicamento é muito eficaz contra a chamada variante sul-africana do coronavírus e também entre os mais jovens.
A vacina russa Sputnik V, por sua vez, não receberá autorização da UE "antes do final de junho", alertou o secretário de Estado francês para a Europa, Clement Beaune.
A Europa abriga 12% da população mundial e já administrou mais de 152 milhões de doses de vacinas anticovid, ou seja, um quarto de todas as injetadas no mundo.
Nos próximos "oito a 14 dias", a Alemanha vai fortalecer o controle em suas fronteiras terrestres, enquanto a Itália decidiu estender suas medidas até 30 de abril. Na Áustria, a região de Viena ficará confinada na Páscoa.
Na França, onde a situação está se deteriorando há várias semanas e se aproxima de 100.000 mortes, as escolas ficarão fechadas por pelo menos três semanas. As restrições serão estendidas a todo território.
O consumo de álcool em espaços públicos será proibido nas próximas semanas, e o acesso a locais propícios a reuniões ao ar livre também será limitado, anunciou o primeiro-ministro francês, Jean Castex.
Sem chama olímpica
A situação também se agrava no restante do mundo, do Japão ao Brasil, passando pelo Canadá.
Na Ásia, o governo japonês anunciará novas restrições, especialmente em Osaka, cujas autoridades regionais não querem o revezamento da tocha olímpica na metrópole para limitar as infecções, segundo a imprensa local.
Do outro lado do Pacífico, a província de Ontário, motor econômico do Canadá, prepara-se para anunciar um reconfinamento de 28 dias para interromper uma nova onda de infecções, depois que Québec anunciou o fechamento de escolas e negócios não essenciais.
Embora no vizinho Estados Unidos a situação melhore à medida que a vacinação avança, seu presidente Joe Biden pediu que as medidas continuem a ser respeitadas, como o uso de máscaras, e que os clubes esportivos não abram todas as cadeiras de seus estádios.
"Temos de chegar a um ponto em que um número suficiente de pessoas tenha sido vacinado para diminuir a possibilidade de [ o vírus ] se espalhar", frisou.
O pior mês no Brasil
A situação da pandemia de coronavírus no Brasil é "claramente crítica", com a maioria das unidades de tratamento intensivo em hospitais com 90% ou mais de ocupação e novas variantes mais infecciosas em circulação, segundo avaliou a epidemiologista responsável pelo resposta da Organização Mundial da Saúde (OMS) à pandemia, Maria Van Kerkhove.
A cientista brasileira e chefe do setor de vacinas da OMS, Mariangêla Simão, afirmou que a situação no Brasil a "preocupa muito", mas que produção de imunizantes no País por entidades como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Instituto Butantan auxiliam o combate local ao vírus, em meio à dificuldade da OMS distribuir vacinas a todos os países por meio da iniciativa Covax. Ela alertou, porém, que é importante manter as restrições à circulação mesmo com a imunização em larga escala. "Disponibilidade de vacinas não pode dar falsa impressão de segurança aos brasileiros", disse Simão.
Na América Latina, o Brasil, que aprovou na quarta-feira o uso emergencial da vacina Johnson & Johnson, o número de mortos está crescendo a um ritmo assustador. O gigante sul-americano registrou seu pior mês da pandemia em março, com mais de 66.000 mortes.
Depois dos Estados Unidos (552.073 mortes), o Brasil é o país com o maior número de vítimas fatais nesta pandemia (321.515), seguido pelo México (203.210).
"Nunca um único evento gerou tantas mortes em 30 dias na história do Brasil", disse à AFP o médico Miguel Nicolelis, ex-coordenador da Comissão Científica formada pelos estados do Nordeste para enfrentar a pandemia.
Segundo Nicolelis, “a pandemia está totalmente fora de controle e (...) a perspectiva de chegar a meio milhão de mortes em julho já é plausível”.
A Bolívia fechou sua fronteira com o Brasil por uma semana, caso uma nova variante de covid-19 circulasse.
O Chile — que faz fronteira terrestre com Argentina, Bolívia e Peru — também anunciou que fechará suas fronteiras ao longo de abril. A campanha de vacinação está avançando, mas os casos também.
E as infecções estão "em alta" em todo continente, alertou a diretora da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), Carissa Etienne.