Luta contra o racismo deve continuar, diz ativista dos EUA
As palavras, em defesa da continuidade do movimento pelos direitos civis, são de John Feagin, 87 anos, no Dia Internacional contra a Discriminação Racial
Agência Brasil
Publicado em 21 de março de 2017 às 14h24.
"A luta não acabou e agora não é só pelos negros, é por mulheres, muçulmanos, mexicanos e qualquer outro grupo alvo de discriminação".
As palavras, em defesa da continuidade do movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos , são de John Feagin, 87 anos, professor aposentado que participou do Boicote aos Ônibus no Alabama - protesto histórico no Sul do país que resultou na revogação das leis estaduais que segregavam brancos e negros no transporte público.
Para lembrar hoje (21) o Dia Internacional contra a Discriminação Racial, data instituída pelas Nações Unidas (ONU) em 1960, a Agência Brasil visitou a cidade de Montgomery, capital do Alabama e palco do boicote de dezembro de 1955 a 1956. Foi lá que o movimento negro norte-americano contra a desigualdade se consolidou.
No centro histórico da cidade sulista, a Igreja Batista da Avenida Dextel e o Museu Rosa Parks abrigam detalhes da história da luta pelos direitos civis do país. Fomos à igreja batista, construída em 1877, local de congregação da comunidade negra na época.
O então jovem pastor batista Martin Luther King Jr, assumiu a liderança da igreja em 1954. No ano seguinte, em dezembro de 1955, a comunidade negra se reuniu comandada por ele e decidiu iniciar a boicote aos ônibus do transporte coletivo de Montgomery, após a prisão da costureira Rosa Parks.
"Todo mundo já estava bem cansado das leis separatistas. Era humilhante demais, e a prisão da Rosa Parks, quando ela se recusou a ceder o lugar no ônibus para o homem branco, nos impulsionou", contou John Feagin.
Ele tinha 23 anos na época e lembra que Martin Luther King já defendia a marcha pacífica na luta pelos direitos civis. "Votamos uma resolução aqui na igreja e dividimos as tarefas."
Memória
Rosa Parks foi presa no dia primeiro de dezembro e solta após pagamento de fiança. Feagin diz que ele fez parte da equipe de divulgação, junto a outros colegas da Universidade do Alabama.
"Nós começamos a rodar [imprimir] os panfletos e naquele mesmo dia todos os bairros da população negra tinham recebido o aviso para não usar o transporte público."
Mulheres e homens negros passaram a usar meios de transporte alternativos, como carona e caminhadas em marchas que atingiram também outras cidades na região, como Selma.
O protesto durou 382 dias até que, no dia 20 de dezembro 1956, quando a Suprema Corte determinou a inconstitucionalidade das leis segregacionistas nos ônibus coletivos do Alabama.
"Todos nós marchamos, mas nós - que éramos os mais jovens e tínhamos um papel de comunicação de massa - mandávamos folhetos e ajudávamos a manter o espírito de todos mobilizados, na conversa do dia a dia, assim como o pastor dava seus sermões inspiradores aos domingos", detalha. E ressalta que o processo foi muito difícil, com muita resistência e hostilidade.
Luta contínua
John Feagin conversou com a Agência Brasil em frente a um mural no interior da igreja que ele mesmo ajudou a pintar. Além dele, outros 17 participantes do boicote ainda estão vivos e frequentam a cidade.
"Sabemos que acumulamos a história da luta pela igualdade neste país, mas também sabemos que não acabou", diz. "Como dizia o pastor Martin temos que nos manter em movimento, lutando por todos", acrescenta.
Em frente à igreja, um grupo de norte-americanos brancos vindos de Chicago cumprimenta Feagin, enquanto ele aguarda a abertura da igreja.
"A secretária da igreja contou que o senhor esteve no boicote. Que orgulho conhecê-lo", diz um dos integrantes do grupo.
Na entrevista, o professor aposentado conta que é otimista quando avalia a trajetória da luta pelos direitos civis e igualdade racial.
"Se hoje somos um país unificado e se hoje temos leis que nos protegem isso se deve a essa luta", avalia. "Com o avanço da lei, o racismo ganhou nuances mais veladas."
Educação
No Museu e Biblioteca Rosa Parks, instituição mantida pela Universidade Troy (uma faculdade privada), os visitantes têm acesso a um acervo importante de documentação da época do protesto e à história de sua biografia.
"Nosso foco é a educação. Por isso, oferecemos cursos e pequenas palestras para estudante do ensino fundamental até o ensino médio", conta a diretora do Museu, Felicia Bell.
Além de cursos, e do tour guiado multimídia, os visitantes têm acesso a exposições de arte relacionadas ao tema da igualdade racial.
Atualmente o museu recebe uma exposição fotográfica e biográfica de mulheres que fazem parte da luta contra a discriminação nos dias de hoje.
"Aqui queremos continuar o legado de Rosa Parks, empoderando e conscientizando as pessoas do que elas podem alcançar", comenta a diretora.
Uma excursão de alunos universitários do Estado de Wisconsin, quase 1,2 mil quilômetros do Alabama visitava o museu e a cidade.
"Viemos em uma caravana. Acreditamos que é extremamente importante visitar nossa história e ver como os movimentos se moveram ao longo dos anos. Precisamos levar o que vimos aqui e multiplicar nas escolas", contou Karen Dominguez, uma jovem coordenadora da Universidade de Wisconsin que participava da excursão.