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Dólar paralelo supera 1.000 pesos na Argentina pela 1ª vez após falas de Milei

Pesos são um lixo que não servem nem como adubo, disse candidato que lidera pesquisas para a eleição presidencial

Argentina peso argentino dólar (Getty Images/Getty Images)

Argentina peso argentino dólar (Getty Images/Getty Images)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 10 de outubro de 2023 às 13h52.

Última atualização em 10 de outubro de 2023 às 14h57.

A cotação do dólar blue, valor informal que serve de referência para transações no dia a dia na Argentina, superou o patamar de 1.000 pesos pela primeira vez, após declarações polêmicas de Javier Milei, candidato que lidera as pesquisas e pode se tornar o novo presidente do país.

Por volta das 14h, a moeda argentina era negociada a 1.040 pesos no mercado informal, 95 pesos acima do fechamento na segunda, 9. O peso tem sofrido um processo de forte desvalorização nas últimas semanas. Em agosto, por exemplo, o dólar blue era cotado por cerca de 600 pesos.

Em meio à alta no câmbio paralelo, o governo argentino aumentou os impostos sobre a compra de dólar em algumas categorias. Com isso, os dólares na categoria solidário (geralmente usado para poupança) tarjeta (para compras no cartão de crédito, como assinatura de streamings) e Qatar (para viagens ao exterior) passam a ter o mesmo valor. Nesta terça, a cotação dessas categorias era de 731 dólares por peso.

A corrida por dólares se acirrou nesta semana, depois do segundo debate presidencial na Argentina, no domingo, 8, e de declarações de Milei em uma entrevista. Na segunda, 9, em entrevista a uma rádio, o candidato voltou a atacar o peso. "Jamais em pesos, o peso é uma moeda que não vale nem como esterco, esses lixos não valem nem como adubo", afirmou.

Na semana passada, Milei disse que "quanto mais alto estiver o dólar, mais fácil é dolarizar". O candidato defende acabar com o peso e usar o dólar como moeda oficial da Argentina. No entanto, economistas alertam que essa medida deixaria o governo com menos opções para lidar com a inflação e com crises econômicas, e que para dolarizar um país, é preciso ter uma enorme quantidade de moeda americana. A Argentina tem escassez de dólares e enfrenta dificuldades para honrar compromissos externos. Milei tem dito que conseguiria obter a soma necessária para a dolarização, mas não detalhou como faria.

O Banco Central argentino disse que o sistema financeiro argentino está sólido e solvente. Em agosto, o BC do país desvalorizou o peso, e desde então mantém uma taxa fixa, de 365,50 dólares por peso, mas para obter a moeda americana por essa cotação é preciso atender a uma série de condições, que na prática fazem com que poucos argentinos consigam obter a moeda americana por esse valor.

Eleições na Argentina

O primeiro turno da eleição presidencial na Argentina será realizado em 22 de outubro. Segundo um compilado das últimas pesquisas divulgadas entre o fim de agosto e 1º de outubro, elaborado pelo jornal "El País", Milei tem atualmente 35,3% dos votos, ante 30% de Sergio Massa, candidato governista e de esquerda, e 25,9% de Patrícia Bullrich, de centro-direita e ligada ao ex-presidente Mauricio Macri (2015-19). 

Se os percentuais se mantiverem, haverá segundo turno entre Milei e Massa, a ser disputado em 19 de novembro. No domingo, 8, houve o segundo e último debate entre os candidatos, marcado por uma série de ataques entre eles.

Javier Milei, candidato à Presidência da Argentina, durante debate (Tomas Cuesta/Getty Images)

Como começaram os controles sobre o dólar na Argentina

A relação da Argentina com o dólar é complexa, embora por uma razão simples: há grande procura pela moeda americana, mas ela está em falta. Para lidar com o problema, o governo adotou uma série de regras para dificultar o acesso aos dólares ao longo dos anos, que deram origem a um sistema complicado e a um forte mercado paralelo.

O modelo atual de controle cambiário, apelidado de "cepo", foi criado em 2011, no governo de Cristina Kirchner, para dificultar o acesso aos dólares, com o objetivo de tentar frear a desvalorização do peso. Com isso, empresas que precisam da moeda estrangeira, para pagar importações ou empréstimos ou remeter lucros ao exterior, por exemplo, dependem de aprovação de um órgão estatal, a Afip.

No entanto, com a dificuldade de acesso, ganhou força o mercado paralelo, apelidado de "dólar blue". Embora operado de maneira irregular, a cotação do blue é divulgada com destaque. Seu valor serve como termômetro da economia argentina e referência para transações do dia a dia. É comum que argentinos comprem dólares no mercado paralelo para fazer poupança, por exemplo.

Em 2015, o governo de Mauricio Macri acabou com os controles para acesso aos dólares. Isso fez que o peso tivesse queda de 40% na cotação em 24 horas e a procura pela moeda americana disparasse. Nos anos seguintes, o peso desvalorizou muito: passou de cerca de 9 pesos por dólar em 2015 para mais de 60 pesos em 2019.

Dada a queda forte do peso, o governo Macri, perto da eleição de 2019, voltou a colocar limites para a compra de dólares em 2019. Primeiro, estabeleceu um limite de US$ 10 mil mensais por pessoa, que logo foram reduzidos para US$ 200.

O aperto realizado por Macri, que perdeu a reeleição, fez com que a distância entre a cotação oficial e paralela ganhasse mais força. Eleito em 2019, o presidente Alberto Fernández, manteve as restrições e foi acrescentando outras, como um imposto de 30% sobre as compras de dólar. Ao mesmo tempo, foram sendo criados novos tipos de câmbio, que somam mais de 12, como dólar soja, Netflix e Vaca Muerta.

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