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Degelo do Ártico, a porta de entrada para uma hecatombe?

Os cientistas ainda não sabem precisar os efeitos do degelo, mas uma certeza existe – menos gelo significa menor reflexão da luz solar, e maior aquecimento

À deriva: perda de gelo ameaça os ecossistemas marinhos e terrestres no polo norte (Greenpeace)

Vanessa Barbosa

Publicado em 28 de abril de 2014 às 07h51.

São Paulo – O novo relatório do IPCC faz um alerta sobre o degelo no Oceano Ártico, um dos efeitos mais notáveis do aquecimento global . De acordo com o estudo do Painel da ONU, a perda de gelo na região ocorreu a uma taxa de 3,5% a 4,1%, por década, no período entre 1979 e 2012.

A redução do manto de gelo durante o verão teve maior baixa – entre 9,4% e 13,6 %, por década. Nessa taxa, o gelo do Ártico na época mais quente do ano corre o risco de desaparecer até meados do século.

Durante o verão, a redução do gelo na região tem se intensificado de tal maneira que atingiu um mínimo de 3,4 milhões de quilômetros quadrados, em 2012, 18% a menos do que o recuo em 2007 e 50% abaixo da média dos anos oitenta e noventa.

Segundo o relatório, “há grande confiança” de que as temperaturas do permafrost (o tipo de solo encontrado na região do Ártico) aumentaram na maioria das regiões desde de 1980. “O aquecimento observado foi de até 3°C em partes do norte da Alaska e de até 2 ° C em partes do norte da Rússia”, diz o texto.

Os cientistas não sabem dizer com precisão quais serão os efeitos do degelo no Ártico no sistema climático global no longo prazo. Mas uma certeza existe – menos gelo no mar significa a redução das áreas de refelexão da luz solar para a atmosfera, o que intensifica o aquecimento. Uma série de estudos dão algumas pistas das surpresas que o degelo no Ártico reserva.

Bomba relógio “econômica”

Sob a camada de gelo do Ártico, existem reservas gigantes de metano (CH4), um gás efeito estufa 20 vezes mais potente que o dióxido de carbono (CO2). O derretimento dos subsolos árticos congelados por sua vez contribuiria para o aquecimento adicional do planeta. Um estudo publicado na revista Science, em julho, calcula que os custos do degelo para a economia se aproximariam dos US$60 trilhões de dólares, quase o Produto Interno Bruto (PIB) mundial (de US$ 70 trilhões).


Assinado por acadêmicos da Universidade de Cambridge, no Reino Unido e da Erasmus University Rotterdam, na Holanda, o estudo destaca o papel fundamental do Ártico na regulação dos oceanos e do clima, e de como seu derretimento poderá intensificar as mudanças climáticas, prejudicando ainda mais colheitas e infraestruturas ao redor do mundo.

Batalha por recursos

Com o desaparecimento de gelo e da neve, o que facilita o acesso à área, a importância do Ártico no campo da energia global e fornecimento de recursos minerais faz a região ser vislumbrada como um novo eldorado. Estima-se que 30% do gás natural e 15% do petróleo ainda não descobertos no mundo estão lá.

Relatório do Progama das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), publicado em fevereiro, destaca que o recuo do gelo do mar também faz com que a Rota do Mar do Norte e da Passagem do Noroeste fiquem abertas para a navegação em determinados momentos do ano. Alguns países prevêem que a rota marítima do norte se torne uma “auto-estrada" para a navegação de importância global, com tráfego até 40 vezes maior em 2020.

"Na verdade, o que acontece é que o derretimento do gelo está causando uma demanda por combustíveis fósseis, os principais responsáveis pelo degelo", alertou na ocasião Achim Steiner, diretor Executivo do Pnuma. "Todos os países devem considerar cuidadosamente as consequências da corrida para a exploração dessas vastas reservas, dado o que está em jogo no mundo."

Ecossistema à deriva

A perda de gelo na região também reserva efeitos nocivos para os ecossistemas marinhos e terrestres. Com a abertura de novas rotas de navegação, surge a possibilidade de que “espécies invasoras” se espalhem pela região. O degelo também pode afetar a alimentação nos animais do polo norte, como o urso polar, e diminuir suas áreas de descanso.

É bem possível que haja um boom de pesca devido à mudança para o norte de espécies como bacalhau do Pacífico e do Atlântico. Estudos prevêm um aumento de entre 30 e 70 por cento das capturas em altas latitudes até 2050. Somadas, a demanda por recursos e a rápida transformação ambiental podem atrapalhar a hidrologia, pondo em perigo os ecossistemas.

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