Cuba mantém silêncio após resultado da eleição americana
As autoridades da ilha manifestaram seu desejo que, ganhasse quem ganhasse, os dois países pudessem continuar avançando no processo de degelo
EFE
Publicado em 9 de novembro de 2016 às 18h26.
Havana - O governo de Cuba mantém silêncio após a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, enquanto na rua os cidadãos questionam até que ponto é possível retroceder no processo de normalização diplomática iniciado dois anos atrás com Barack Obama.
As autoridades da ilha manifestaram seu desejo que, ganhasse quem ganhasse, os dois países pudessem continuar avançando no processo de degelo, também conscientes que isso só ocorrerá se o novo inquilino da Casa Branca estiver disposto a seguir os passos do presidente Obama.
Por isso, e dado que Trump se pronunciou contra o giro dado por seu antecessor na política dos EUA em relação à ilha, se abre uma "incerteza grande" sobre o que fará o novo presidente, disse à Agência Efe o analista político e ex-diplomata cubano Carlos Alzugaray.
"Ao passar de democratas para republicanos há uma mudança de signo e há elementos confusos", afirmou o analista, que lembrou que a postura do magnata em relação a Cuba variou durante a campanha ao passar de pedir um "melhor acordo", mas não opor-se à aproximação, para ameaçar reverter todo o processo.
O ex-diplomata, em qualquer caso, não percebe "muito nervosismo nem preocupação" no governo de Raúl Castro, embora descarte que possam conseguir suas principais reivindicações: a suspensão do embargo, que segue dependendo do Congresso com maioria republicana, e a devolução do território ocupado pela base naval de Guantánamo.
No entanto, nas últimas semanas os dois países aceleraram o trabalho para avançar nos acordos conseguidos até agora e concretizar outros novos antes que Obama deixe o poder em janeiro.
"Trump adapta seu discurso às circunstâncias (...). Se governar como um homem de negócios e proteger os interesses econômicos de EUA, é possível que siga com a ideia de flexibilizar o bloqueio ou pelo menos não andar para trás no avançado com Obama", ponderou Alzugaray.
Além disso, governar como homem de negócios "talvez" represente também suprimir das políticas americanas os elementos "intervencionistas" que Cuba denunciou e que buscam ampliar o respeito às liberdades e direitos do povo cubano, complementou.
"Talvez Trump não se interesse por isso, mas há políticas dos EUA que vão no piloto automático e os funcionários seguem fazendo o que estavam fazendo", detalhou.
O analista lembrou ainda que ao país vizinho lhe interessa manter uma relação correta com o governo cubano em temas nos quais já se avançou, como luta contra o terrorismo, cibersegurança, meio ambiente e transporte aéreo.
A política americana em relação à ilha também "vai depender muito" da equipe da qual vai se rodear o novo presidente, acrescentou.
Nas contas oficiais da diplomacia cubana nas redes sociais não se registra movimento há horas: nem sequer na da diretora geral para os EUA da chancelaria cubana, Josefina Vidal, que foi o rosto mais visível da ilha no processo de normalização de relações.
Nas ruas de Havana se percebia nesta quarta-feira normalidade, embora várias pessoas entrevistadas pela Efe tenham manifestado sua decepção pela derrota de Hillary Clinton, a quem viam como a candidata ideal para prosseguir o caminho da reconciliação.
"É preciso esperar para ver o que (Trump) faz. Penso que diante de tudo um presidente deve ser humano (...). Reverter as medidas seria um pouco feio. Para que trazer divisão, se isso não leva a nada?", questionou Pedro Roberto, engenheiro informático.
Para o músico Herman Mendoza, "há preocupação" sobre a postura com Cuba do novo presidente americano, embora seja "possível" que suas ameaças fossem só uma "estratégia" eleitoral que depois não se materialize".
"Mas a suspensão do bloqueio parece impossível", considerou.
Silda Arana, estudante de História da Arte, se mostrou convencida que a chegada de Trump "vai afetar muito à situação de Cuba em relação ao bloqueio".
"Eu me impressionei muito, não esperava isso (...). Hillary era a melhor escolha, o que aconteceu nestes dois anos foi uma grande evolução", disse a jovem cubana, que previu um distanciamento na relação bilateral.
No meio desta decepção, os cubanos acordaram com um enorme anúncio na capa do jornal estatal "Granma" no qual se anuncia uma manobra de treinamento militar em todo o país para elevar "a preparação das tropas e a população para enfrentar as diferentes ações do inimigo".
Estes exercícios eram realizados em outras épocas como "aviso" aos EUA, mas, segundo Alzugaray, neste caso não podem ser vinculados à vitória de Trump porque "estavam planejados há muito tempo e têm a ver com o 60º aniversário do desembarque do Granma", o navio no qual Fidel Castro retornou a Cuba para iniciar a revolução.