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A dura vida da Netshoes na bolsa de Nova York

Quatro meses após estrear na bolsa de NY, a Netshoes viveu uma semana trágica, com queda de 23,8% nas ações. A estratégia continua fazendo sentido?

Netshoes: IPO na bolsa de Nova York (AlexandreYamada/Netshoes/Divulgação)

Netshoes: IPO na bolsa de Nova York (AlexandreYamada/Netshoes/Divulgação)

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Letícia Toledo

Publicado em 18 de agosto de 2017 às 17h49.

Última atualização em 21 de agosto de 2017 às 10h57.

Há exatos quatro meses o empresário Marcio Kumruian tocava a campainha da Bolsa de Valores de Nova York, marcando a abertura de capital (IPO) da empresa de e-commerce que fundou e preside, a brasileira Netshoes. Era a concretização de um plano traçado há pelo menos cinco anos.

Mas agradar o exigente mercado americano tem se mostrado um enorme desafio. Os últimos dias foram trágicos.

Após a divulgação de resultados do segundo trimestre, na terça-feira 15, as ações da Netshoes caíram 23,8%, fazendo-a perder quase 142 milhões de reais em valor de mercado. A queda aconteceu apesar de relatórios de bancos como JP Morgan e Goldman Sachs terem considerado os números “em linha com o esperado”. O que então explica a debandada de investidores?

Para executivos do setor ouvidos por EXAME a Netshoes precisa provar que pode crescer mais e adotar uma postura mais agressiva se quiser agradar o mercado. Para eles, os números divulgados recentemente mostram que os resultados da empresa seguem voláteis – como vinha acontecendo nos últimos anos.

“O mercado tinha a sensação de que eles já tinham um modelo de negócios rentável e consistente, para seguir vendendo e melhorando. Na verdade eles ainda estão estruturando as coisas, as margens são muito baixas. Isso ficou claro no balanço do segundo trimestre e é um problema quando se tem capital aberto”, diz um executivo do setor.

Considerado um indicador fundamental nas empresas de comércio eletrônico, o volume de vendas da companhia no segundo trimestre, medido pelo GMV, cresceu 26%, para 630,7 milhões de reais. O problema foi que, para conseguir esse desempenho, a Netshoes teve que gastar mais: os custos com vendas cresceram 18,8% e as despesas com marketing, 15,3%, para 119,8 milhões de reais.

Como resultado, o prejuízo subiu 4,5%, para 35,2 milhões de reais. Com esses números, a margem operacional (Ebitda) fechou mais um trimestre no negativo: -1,9%. “Eles cresceram quase 30%, mas perderam EBITDA. Estão queimando margem para expander negócios como a Zattini (o e-commerce de moda). Não dá para crescer e perder EBITDA, o mercado não entende. A essa altura do campeonato é esperado que eles consigam expandir os dois indicadores”, diz um analista.

Os resultados decepcionaram o mercado também por reverter uma tendência do primeiro trimestre, que havia mostrado melhora nos principais indicadores. O prejuízo caiu 38% de janeiro a março, para 37,7 milhões de reais, enquanto o volume de vendas totalizou 531,2 milhões de reais – alta de 20,6% na comparação anual. Após a divulgação dos números do primeiro trimestre as ações da companhia subiram e alcançaram um valor 48% maior do que o do IPO. Os números do segundo trimestre, entretanto, mostram que a situação da empresa continua volátil. Hoje a empresa vale 23% a menos que na abertura de capital, com ações cotadas a 14,66 dólares.

Otavio Lyra, diretor de relações institucionais da Netshoes afirma que a queda observada nos papéis foi influenciada por uma forte oscilação “das companhias listadas nos Estados Unidos”. “Temos a convicção que a forte aderência dos resultados à nossa estratégia de longo prazo criará valor no futuro para todos os nossos stakeholders”, disse Lyra, em entrevista por e-mail.

O sobe e desce das ações da novata, no entanto, acontece em um dos períodos de menor volatilidade na história das bolsas americanas – que estão próximas de seus patamares recordes. Além disso, o cenário é ainda melhor para as empresas de tecnologia. As gigantes Facebook, Amazon, Apple, Netflix, Alphabet e Microsoft têm sido as preferidas dos investidores, por continuarem apresentando melhora em seus números trimestre após trimestre. Segundo relatório do banco Goldman Sachs de junho, o grupo de ações conhecido como FAAMG (Facebook, Amazon, Apple, Microsoft e Google) foi responsável por 40% de toda a alta do índice americano S&P 500 neste ano.

“A empresa precisa ser mais ágil. Precisa entrar em outros segmentos do e-commerce, comprando outras empresas. O mercado está punindo porque exige mais velocidade, resultados mais rápidos”, diz Paulo Humberg, sócio da companhia de investimentos em internet A5. Partir para aquisições seria uma mudança na estratégia da empresa, que sempre focou no crescimento orgânico. A única aquisição feita em seus 17 anos foi da empresa de calçados Shoestock, que havia fechado todas as suas lojas, no início do ano passado.

Atualmente a Netshoes está negociando a compra da concorrente Dafiti, conforme noticiou a coluna Primeiro Lugar da revista EXAME. Além de artigos esportivos, a Dafiti vende roupas e utensílios para casa. Seria um complemento tanto para a marca Netshoes quanto para o seu e-commerce de moda Zattini, lançado no fim de 2014. As vendas da Zattini também desaceleraram. As vendas da marca cresceram 64% no segundo trimestre (na comparação anual), após o crescimento de 98% no primeiro trimestre. Procurada sobre a compra da Dafiti, a Netshoes afirma apenas que “não comenta rumores do mercado”.

A Netshoes tem focado em expandir seu site na Argentina e no México. No primeiro semestre do ano, essas operações representaram 11% das vendas totais do grupo, no valor de 94,52 milhões de reais. O objetivo da empresa agora é levar também sua marca Zattini para o exterior.

Em entrevista a EXAME logo após a abertura de capital, Kumruian afirmou que a tolerância dos investidores com uma empresa que ainda não dá lucro foi um motivo para ter escolhido a Bolsa de Nova York. “Temos de ter paciência”, afirmou Kumruian. O lucro continua distante no horizonte da Netshoes, mas a companhia precisa convencer os investidores que tem uma boa estratégia para chegar até ele. Haja paciência.

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