Pedro Guimarães e Camila Requena, sócios da Fiduc: empresa entra em operação nesta semana e aproveita um movimento de desbancarização. (Fiduc/Divulgação)
Marília Almeida
Publicado em 31 de outubro de 2017 às 05h00.
Última atualização em 31 de outubro de 2017 às 11h19.
São Paulo - Todo mundo sabe (ou deveria) estar cansado de saber que o gerente do banco recebe uma comissão para indicar produtos financeiros que nem sempre são os mais adequados (e rentáveis) para o cliente.
Comum nos chamados family offices, administradoras de investimento destinadas a clientes que têm milhões de reais para investir, um modelo de negócio que preza pela visão completa das finanças do cliente e com foco em produtos mais adequados conforme o objetivo da família vem se tornando mais acessível para clientes com renda mensal a partir de 5 mil reais.
Pelo menos quatro empresas já oferecem o serviço de planejamento financeiro no chamado modelo fiduciário: a LifeFP, a Gfai, a Guide Life e a Fiduc, que deve entrar em operação ainda nesta semana.
O modelo consiste em remunerar o planejador financeiro não pelos produtos que indica, mas de forma fixa, por horas de serviço prestado; por meio de um porcentual do valor investido; ou de forma fixa e também com um porcentual sobre o valor investido.
Magno Maciel, CEO da Gfai, aponta que a crise econômica, a queda da taxa básica de juros do país e o enxugamento da estrutura dos bancos, que inclui fechamento de agências e demissões de funcionários, colaboram para o crescimento do modelo. "Estamos vendo no Brasil um movimento de desbancarização que aconteceu há 20 anos nos Estados Unidos. Em um momento de instabilidade econômica e política as pessoas começam a ficar mais atentas com o dinheiro, e começam a perceber que existe vida fora do banco".
Pedro Guimarães, sócio da Fiduc, concorda. "Hoje em dia o gerente do banco não fica no cargo por muito tempo. Então é mais difícil criar laços de confiança. As pessoas estão buscando alternativas".
A crise econômica também incentivou o modelo das empresas de planejamento financeiro ao dar a oportunidade dessas empresas empregarem profissionais da área que vêm sendo demitidos por bancos e corretoras. Eles podem ser tanto profissionais que entram como sócios no projeto, como na Fiduc, como franqueados, no modelo da Guide Life. Para padronizar o atendimento, a Gfai e a Fiduc, por exemplo, criaram uma divisão educacional para treinar seus próprios profissionais. A Guide também oferece cursos para seus franqueados.
O foco dessas empresas é atender clientes de alta renda dos bancos, que fazem parte de segmentos como o Prime, do Bradesco, e Personalité, do Itaú. Eles podem ganhar de 5 mil reais a mais de 15 mil reais por mês, e ter investimentos na casa de dois ou três dígitos.
A LifeFP atende 3 mil famílias e temos pelo menos 400 clientes mais jovens do que 29 e outros 850 clientes acima de 45 anos de idade.
Tem tanto clientes com renda de 5 mil reais por mês como multimilionários.
O principal objetivo do planejamento financeiro é ter uma visão completa do orçamento e objetivos do cliente para só então oferecer uma solução. "Uma diferença gritante do nosso negócio é que a primeira pergunta que fazemos aos cliente é quanto ele gasta. Ele não vai ouvir isso de um agente de investimentos ou do gerente do banco", diz Guimarães, da Fiduc.
André Novaes, sócio da LifeFP, ressalta que o planejamento financeiro é muito mais amplo do que cuidar de investimentos. Ele passa também por soluções tributárias, sucessórias, perfil de risco adequado e produtos como previdência e seguros.
Felipe Chad, sócio da Guide Life, compara o serviço a uma dieta. "Montamos o plano financeiro de acordo com uma série de informações passadas pelo cliente. Depois, temos de acompanhar e fazer ajustes, caso seja necessário. Se a esposa do cliente foi demitida ou o salário dele aumentou, é necessário mudar as características do plano".
Já Maciel associa a figura do planejador financeiro a de um clínico geral. "Ele entende a necessidade financeira da família e faz um plano que ela pode executar sozinha, escolhendo o produto que for mais adequado para ela. Ele vai indicar classes de produtos, como títulos de renda fixa ou ações, e não um produto específico".
Por conta dessas características, o trabalho das empresas de planejamento financeiro pode atender também famílias com dívidas. "Vemos famílias de alta renda com renda de 50 mil reais, mas que gastam 60 mil reais por mês. Elas têm condições de pagar pelo nosso serviço para sanar esse problema", diz Maciel, da Gfai. Cerca de 300 famílias das mil atendidas pela Gfai têm dívidas.
Tanto a Guide Life como a Gfai cobram 3 mil reais por ano pelo serviço de planejamento financeiro. Já a Fiduc cobra taxa de 1,5% sobre o valor investido pelo cliente. Na LifeFP, a taxa pode variar de 500 reais a 5 mil reais por mês, dependendo da complexidade das finanças da família.
Mesmo o modelo fiduciário tem nuances nas recomendações de produtos que devem ser colocadas no contrato de forma clara para clientes. Caso contrário, a empresa pode ser acusada de propaganda enganosa.
Por exemplo, a Guide Life é a divisão de planejamento financeiro da corretora Guide, mas assegura não indicar diretamente nenhum produto vendido por ela, apenas recomendar o contato de analistas. Contudo, deixa claro que seus planejadores financeiros ganham comissão ao indicar seguros e planos de previdência privada,
Já Novaes, da LifeFP, afirma que recebe pagamentos apenas dos clientes, através de um valor fixo mensal, não atrelado aos investimentos deles. Novaes é crítico do modelo baseado em um porcentual sobre investimentos do cliente. "Ele pode até ser considerado como um modelo fiduciário, mas não é claro para o cliente até que ele aprenda a fazer a conta do que significa este porcentual dos investimentos no bolso dele no médio-longo prazo".
A Gfai é uma holding que abriga, além de uma empresa de planejamento financeiro, uma gestora de recursos que oferece produtos de investimento. Maciel assegura que nada é imposto, mas, caso o cliente peça, a empresa recomenda os seus produtos. "Contudo, a remuneração do planejador continua sendo fixa. Ele não recebe a mais por isso", argumenta o executivo.
Maciel diz que segue as diretrizes éticas da Planejar, associação que reúne os planejadores financeiros no país. "Segundo essas diretrizes,o planejador financeiro está impedido de indicar produtos financeiros ou recomendar que o cliente busque uma determinada instituição financeira".