Passagens aéreas: jeito de burlar a precificação pode ser visto como quebra de contrato (Bet_Noire/Thinkstock)
Marília Almeida
Publicado em 17 de maio de 2019 às 05h00.
Última atualização em 17 de maio de 2019 às 13h54.
São Paulo - Imagine que você quer voar para algum grande aeroporto, um hub concorrido que concentra voos. O voo direto está caro, então você busca voos que tenham o aeroporto como escala. Se ele for mais barato do que o voo direto, você compra a passagem para outro destino e opta por descer do avião na escala, a cidade desejada. Essa técnica para burlar o sistema de precificação das companhias aéreas é chamada de skiplagging.
Já existem até sites para facilitar o trabalho de pesquisa de voos com escalas, também chamadas de "cidades escondidas". Isso porque essa tarefa não é simples.
Nos buscadores de preços, por exemplo, os valores não são sempre determinados pelas companhias aéreas: muitos são determinados por agências de viagens, como Viajanet e Submarino Viagens. Portanto, um voo de uma companhia para São Paulo pode estar mais caro que o voo dessa mesma companhia para Belo Horizonte com escala em São Paulo, mas isso não quer dizer necessariamente que a companhia é a responsável por essa precificação.
Por conta desse e outros motivos, o Skiplagged mostra voos com "cidades escondidas", escalas que possam interessar quem está buscando economizar. O objetivo é tornar mais fácil comparar se, de fato, há uma vantagem econômica ao optar por descer na escala de um voo.
A economia pode ser significativa. Um voo entre Curitiba e Rio de Janeiro, por exemplo, sai por 254 reais, enquanto um voo entre Curitiba e Rio de Janeiro, com escala em Brasília, sai por 205 reais, segundo simulação feita no site do Viajala em uma mesma data e companhia aérea.
Contudo, o próprio Skiplagged alerta que a prática tem seus riscos e desconfortos. Por exemplo, quem opta por não percorrer todo o trajeto adquirido no bilhete não pode despachar bagagens, já que não é possível resgatá-las na escala. Também não é indicado associar a compra a uma conta de milhas. Caso faça isso, a companhia aérea pode penalizar o viajante invalidando as milhas já obtidas.
A companhia aérea também pode pedir um bilhete de retorno. Nesse caso, o site pede para comprar um bilhete com cancelamento grátis e efetivamente cancelá-lo assim que embarcar.
Além disso, é possível que uma escala seja modificada por questões climáticas ruins. Segundo o site, isso acontece raramente, (em 2% dos casos), mas pode acontecer.
Também é necessário ficar atento se o destino final exige passaporte ou um visto específico, mesmo que não pretenda descer lá. Isso porque a companhia aérea costuma exigir o visto para o destino final no embarque.
Em voos de ida e volta, conhecidos por representarem economia ao viajante, a prática não pode ser concretizada. Isso porque, na volta, não é possível embarcar na escala. Ou seja, é necessário verificar se a economia obtida supera a economia de comprar bilhetes de ida e volta.
Falta de regulamentação
Procurada a Agência Nacional de Aviação Civil diz que a prática não é regulamentada. Já a Infraero aponta que não pode impedir passageiros de descerem em um aeroporto em uma cidade de escala.
Segundo o Skiplagged. a prática é "legal". O entendimento é reforçado pelo advogado especializado em direito do consumidor, Rodrigo de Mesquita Pereira, sócio do MPMAE, também não vê por que o passageiro possa ser penalizado pela prática. "Se ele paga passagem para Manaus e desce no meio caminho, ele já pagou pelo bilhete. Não vejo como isso pode representar um prejuízo para a companhia aérea".
Contudo, aéreas estrangeiras, como a Lufthansa, já moveram processos contra viajantes que praticam o skiplagging. Tanto que um alerta do Skiplagged é não exagerar na prática, tanto usando o truque frequentemente em uma mesma rota ou com uma mesma companhia em curto período de tempo, já que isso pode despertar a atenção da empresa.
É uma precaução, portanto, verificar o que prevê o contrato e tarifa da companhia aérea, já que o skiplagging pode ser visto como uma quebra no contrato de serviço. O argumento das empresas é de que o preço varia conforme a demanda. Em rotas mais concorridas, o preço é naturalmente maior.
Eduardo Martins, diretor do buscador de preços Viajala, não recomenda a prática e diz que o artifício é mais usado por viajantes experientes, os chamados "travel hackers". "O skiplagging depende de sorte. Se algo der errado para um viajante de férias isso significa a perda de um momento único de lazer. É bem melhor economizar planejando a viagem com antecedência".