Com alta da inflação, vale a pena trocar o IGP-M pelo IPCA?
IPCA disparou nos últimos meses e está próximo dos 10%, o maior patamar desde 2016 -- preocupação para quem tem contrato de aluguel ou financiamento corrigido pelo indicador inflacionário
Bianca Alvarenga
Publicado em 13 de setembro de 2021 às 16h26.
Última atualização em 13 de setembro de 2021 às 16h27.
O Brasil vive, outra vez, um quadro de inflação em disparada . Todos os índices que acompanham o custo de vida dos brasileiros acumulam ganhos nos últimos meses, em razão de uma série de fatores: alta do dólar, encarecimento das commodities no mercado externo e demanda doméstica mais aquecida.
Para tentar se proteger da alta dos preços, muitos brasileiros pularam de galho em galho entre os índices inflacionários. Houve quem trocou o Índice Geral de Preços ao Mercado (IGP-M) pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no reajuste do aluguel. Outros escolheram o IPCA como indexador do financiamento imobiliário.
Agora, com o IPCA escalando para a casa dos 9% e o IGP-M perdendo força -- embora ainda acumule alta de mais de 30% nos 12 meses até agosto -- muitas dessas escolhas começam a ser questionadas. Para não cair na armadilha fácil de analisar o que já foi, o ideal é que o plano agora seja o de se proteger da alta dos preços, seja qual for o indicador em questão.
Inflação do aluguel
A escalada do IGP-M levou o índice para o maior patamar desde 2002. Embora seja diretamente influenciado pelos preços para o setor produtivo (como o próprio nome do IGP-M sugere), o indicador é usado para reajustar contratos de alugueis residenciais no país. Em outras palavras: é o preço do dólar e das commodities ditando o ritmo do custo de moradia de quem é inquilino.
"Nem o IGP-M e nem o IPCA são índices ideais para reajustar contratos de aluguel. O IGP-M mede a inflação 'na porta da fábrica', e o IPCA mede o custo de vida. Nenhum dos dois tem ligação forte com mercado imobiliário, que é influenciado por outros fatores", observa Braz, da FGV.
Ele pondera que, não existindo um índice específico para os alugueis, o IPCA parece ser a melhor alternativa, pois é um índice menos "dolarizado" -- ou seja, menos influenciado pelo câmbio e pelos preços praticados no mercado internacional.
Para fugir de um reajuste de mais de 30%, muitos locatários pediram a troca do IGP-M pelo IPCA nos contratos de locação. Embora a decisão tenha sido acertada na maior parte dos casos, agora que o IPCA começou a subir a ladeira, esses inquilinos voltaram a perder o sono, pensando no próximo reajuste.
A má notícia é que não há muito para onde correr, nesse caso. O professor da FGV lembra que o IPCA deve terminar 2021 na casa dos 8% e que o IGP-M deve ficar próximo dos 20%. Sendo assim, embora o reajuste pelo IPCA seja doloroso, principalmente em um contexto de desemprego alto e renda encolhendo, ele tende a ser menor do que o que seria, caso o indicador de referência fosse o IGP-M.
"Para 2022, a previsão é que o IPCA fique em 4%, acima da meta estabelecida pelo Banco Central, que é de 3,5%. Já o IGP-M deve ser de 7%, em um patamar ainda alto, mas bem diferente do que tivemos em 2020 e 2021", explica o economista da FGV.
Inflação no financiamento imobiliário
O ciclo de queda nos juros, que durou até março passado, levou os bancos a ampliarem as opções para o crédito habitacional. Uma das modalidades que surgiu no passado recente foi a de financiamento com juros calculados por uma taxa fixa + a variação da inflação (IPCA).
Com a alta do índice, os mutuários que escolheram essa modalidade já estão vendo as parcelas subirem. Atualmente, somente a Caixa e o Banco do Brasil oferecem o c rédito imobiliário com juros do IPCA para seus clientes -- no caso do Banco do Brasil, a opção só está disponível para o segmento de alta renda.
As taxas partem de 3,55% + IPCA ao ano na Caixa, e de 3,45% ao ano + IPCA no Banco do Brasil. No contexto atual, isso representa um custo de quase 14% ao ano. Para comparação, a forma mais tradicional do financiamento imobiliário, a que usa uma taxa fixa + a Taxa Referencial (que atualmente está zerada), tem custo na casa dos 7% ao ano, em média.
Se o mutuário não tem condições de amortizar e quitar o financiamento no curto prazo (em três ou quatro anos), o ideal é que ele busque a portabilidade para outra linha de crédito, que não a do IPCA.
A EXAME questionou a Caixa e o Banco do Brasil sobre alternativas dadas a clientes que financiaram suas casas com os juros indexados à inflação.
O Banco do Brasil não respondeu às perguntas da reportagem, e a Caixa afirmou o seguinte: "Sobre as possibilidades de renegociação, o banco esclarece que disponibiliza várias alternativas negociais a seus clientes, sendo uma delas a possibilidade de alteração da modalidade do indexador do financiamento. Os contratos indexados ao IPCA podem alterar para o Poupança CAIXA".
Lembrando que a modalidade Poupança Caixa nada mais é do que uma linha de crédito habitacional cujos juros são calculados por uma taxa fixa (que parte de 3,35%) somados ao rendimento da caderneta de poupança. O rendimento da poupança, por sua vez, é determinado pela taxa básica de juros, a Selic -- a caderneta rende 70% da Selic.
O problema é que juros e inflação andam de mãos dadas no Brasil. A taxa Selic voltou a subir justamente porque o IPCA acelerou. Sendo assim, o investidor que migrar da taxa IPCA para a taxa Poupança continuará exposto ao risco inflacionário da mesma forma.
É importante considerar que as projeções dos economistas para a Selic no final do ano estão na casa dos 8%, o que poderá levar a taxa Poupança para mais de 11%. O ideal é que a migração ocorra para a modalidade tradicional: a de juros fixos + a TR. O mutuário pode tentar negociar diretamente com o banco concedente de crédito.
Para quem não contratou ainda o crédito imobiliário, é importante ter cautela com as modalidades de financiamento atreladas à inflação e aos juros, dado o cenário de alta da Selic e IPCA ao longo dos próximos meses.
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