Mercados

Petrobras é exemplo de destruição de valor, diz especialista

Um dos mais respeitados especialistas em avaliação de empresas cita em artigo a Petrobras com exemplo de como destruir o valor de uma companhia


	Logo da Petrobras refletido em janela: Aswath Damodaran levanta as razões que levaram a Petrobras a perder US$ 200 bilhões em valor de mercado
 (REUTERS/Paulo Whitaker)

Logo da Petrobras refletido em janela: Aswath Damodaran levanta as razões que levaram a Petrobras a perder US$ 200 bilhões em valor de mercado (REUTERS/Paulo Whitaker)

DR

Da Redação

Publicado em 11 de fevereiro de 2015 às 16h24.

O professor da Universidade de Nova York, Aswath Damodaran , um dos mais respeitados especialistas em avaliação de empresas e finanças corporativas, cita em artigo a Petrobras com exemplo de como destruir o valor de uma companhia.

Ele levanta as razões que levaram a Petrobras a perder US$ 200 bilhões em valor de mercado, a maior parte, US$ 160 bilhões, antes mesmo de os preços do petróleo recuarem. E faz uma estimativa de quanto deveria valer a ação da estatal: quase nada no pior cenário e R$ 22,55 no mais otimista.

Damodaran ironiza a situação, afirmando que os erros da empresa são tão grosseiros que, se fosse adepto de teorias conspiratórias, ele chegaria a pensar que foram provocados por um plano diabólico para destruir a companhia perpetrado por um gênio do mal. “Mas eu aprendi com a dura experiência que você não deve atribuir à malevolência o que pode ser explicado por ganância, interesses próprios e um sistema errado de incentivos.”

Papel barato?

Para Damodaran, com a forte queda dos preços das ações, os papéis atraem o interesse dos chamados investidores contrários, que vão contra as visões gerais do mercado. E a ação parece atrativa à primeira vista, usando alguns múltiplos convencionais, como a relação preço/lucro , de 5,31 vezes, ante a média de 17,63% do mercado, e o preço/valor patrimonial, de 30%, ante 103% do setor.

Já o valor da empresa em relação à geração de caixa (EV/Ebitda, cálculo que soma a dívida ao valor de mercado da empresa e o compara com a geração de caixa, o que mostra quantos anos levaria para a companhia render o suficiente para pagar todo o negócio), é de 5,6 vezes, pior que as 4,60 vezes do mercado.

Para Damodaran, a ação da Petrobras parece barata olhando a relação preço/lucro da ação e sua relação com o valor patrimonial, mas os resultados são mistos com relação ao valor da empresa.

Ele lembra ainda que todos esses múltiplos são afetados pelo fato de que os preços do petróleo caíram dramaticamente desde o último balanço oficial e que os lucros também devem cair nos próximos trimestres. E, como os resultados já estavam caindo antes mesmo da baixa do petróleo, Damodaran teme que a queda seja ainda maior agora, com o barril perto de US$ 50.

Ação perto de zero

Usando os dados históricos da empresa e o preço atual do petróleo, Damodaran fez uma estimativa dos resultados da Petrobras. Considerando o preço atual do petróleo em US$ 51,69 o barril, a receita anualizada da Petrobras seria de US$ 61,3 bilhões, uma queda de 55% em relação aos US$ 135 bilhões dos 12 meses encerrados em setembro.

Com isso, o lucro operacional, antes de impostos, seria de US$ 6,638 bilhões. Com esse nível de lucro, o valor da Petrobras seria de US$ 62,4 bilhões, bem abaixo dos US$ 135,1 bilhões atuais, fazendo sua ação valer quase nada.

Fatores para comprar Petrobras

Mas há outros fatores que podem incentivar o investidor a comprar Petrobras, admite Damodaran, se ele for otimista. Há o fato de a Petrobras ser uma das maiores produtoras de petróleo do mundo e, se o preço do produto subir, haverá um pulo nas receitas.

O segundo fator é que os investimentos dos últimos anos tornaram a empresa dona da quinta maior reserva comprovada de petróleo do mundo, apesar de a viabilidade de exploração de algumas dessas reservas aos preços de hoje poder ser questionável.

O terceiro fator é que que se o governo brasileiro parar de interferir e a direção da companhia parar com seu comportamento autodestrutivo, lucros, margens e retorno devem melhorar. Num cenário mais otimista, a Petrobras poderia manter sua receita intacta em US$ 135,8 bilhões, melhorar sua margem operacional para os 21,1% que tinha em 2010 e seu retorno de capital de 13,36%, na média de 10 anos. Poderia ainda reduzir seu endividamento para 43,5%, média dos últimos cinco anos. Nesse caso, a ação da Petrobras poderia valer R$ 22,55, bem acima do valor atual de R$ 9,12.

Ascensão e queda da Petrobras

A ascensão da Petrobras de uma companhia petroleira de mercado emergente para uma gigante entre 2002 e 2010 se deve a três fatores, explica Damodaran.

O primeiro, a descoberta de grandes reservas no início da década passada, que catapultou a empresa para as com maiores reservas comprovadas, apesar de seu custo maior de produção, fator que foi minimizado pelo segundo, a forte alta dos preços do petróleo no mercado internacional, para mais US$ 100 o barril, o que manteve a exploração desses campos viável economicamente.

O terceiro fator foi a queda no risco-Brasil, dos estratosféricos níveis de 2001, quando o default credit spread atingiu 14,34%, para 1,43% em 2010, quando o Brasil parecia ter atingido o nível de quase desenvolvido.

Em 2010, a Petrobras marcou sua chegada aos mercados globais e sua ambição com uma captação de US$ 72,8 bilhões nos mercados de ações, diz Damodaran.

Campeã de perda de valor

O excesso de confiança da oferta pode ter sido o gatilho para a subsequente queda da companhia, que impressiona por sua magnitude e velocidade. Depois de atingir uma capitalização de US$ 244 bilhões em 2010, a empresa perdeu mais de US$ 200 bilhões em valor de mercado, tornando-se campeã em destruição de valor.

Uma grande parte do declínio pode ser atribuída à queda do petróleo, mas antes disso ela já havia destruído US$ 160 bilhões em valor.

Descrevendo a governança corporativa da Petrobras, Damodaram lembra que o governo fez uma manobra para vender bilhões em ações aos investidores sem perder o controle da companhia. Para isso, usou as ações preferenciais, sem voto, vendidas aos demais acionistas, manteve sua fatia de 50% nas ações ordinárias, com apoio de empresas estatais como BNDES, que ficaram com mais 11.

Usando essa estrutura de controle, o governo criou um perfeito conselho fantoche, cuja única missão era proteger os interesses do governo, ou melhor, os políticos que formavam o governo de então, a todo custo.

Os representantes dos minoritários foram não só ignorados como ainda sofreram retaliação por levantar questões básicas sobre governança. “Para ser honesto com Dilma, sempre houve interferência na Petrobras e seus predecessores são tão culpados quanto ela por tratar a Petrobras como um cofrinho e máquina de pressão política, como ela fez”, diz Damodaram. Lula, lembra o analista, foi tão intervencionista quanto ela, mas teve a sorte dos preços do petróleo estarem altos.

Lições de destruição

Se é preciso olhar casos de empresas que criam valor rapidamente, Petrobras se tornou um caso de estudo pela razão contrária, diz Damodaran. Ou seja, se você tiver um determinado negócio e tiver o perverso objetivo de destruí-lo completamente e rapidamente, deve replicar o que a Petrobras fez em cinco passos.

O primeiro, invista primeiro, se preocupe com retornos depois. O investimento de grandes volumes de dinheiro em novos negócios com pouca atenção ao retorno desse investimento, e normalmente com o interesse em obter vantagens políticas ou coisa pior.

Entre 2009 e 2014, Petrobras aumentou seus gastos de capital e custos de exploração para mais de 35% de suas receitas, bem acima dos 15% a 20% da média de outras empresas do setor, o que fez o retorno sobre o capital cair para 5%, mesmo com o barril de petróleo a US$ 100.

O segundo passo: cresça garoto, cresça e a rentabilidade está perdida. A Petrobras ampliou o faturamento de US$ 17,4 bilhões em 1997 para US$ 135 bilhões em 2014, superando a Exxon Mobil, tornano-se a maior produtora de petróleo do mundo no terceiro trimestre do ano passado. Ao mesmo tempo, suas margens de lucro caíram dramaticamente. O governo contribuiu para isso controlando os preços da gasolina, subsidiando os donos de carros.

O terceiro passo: pague dividendos como uma empresa de serviços públicos, mesmo que não seja uma. A estrutura de capital, com ações preferenciais, obriga a empresa a distribuir lucros regularmente, o que é caro quando se tem planos de crescer ambiciosamente.

O quarto passo: tome dinheiro emprestado para cobrir o déficit de caixa. A Petrobras levantou US$ 79 bilhões em 2010, mas continuou dependente de empréstimos para se financiar, o que levou sua dívida a subir para US$ 135 bilhões no fim de 2014, a maior entre as empresas de petróleo do mundo.

O quinto e último passo: destrua valor, missão cumprida! Se você investe demais e cresce sem se preocupar com rentabilidade, pagando dividendos que não tem condições e tomando dinheiro emprestado, você cria a tempestade perfeita que leva à destruição de valor.

Acompanhe tudo sobre:Capitalização da PetrobrasEmpresasEmpresas abertasEmpresas brasileirasEmpresas estataisEstatais brasileirasGás e combustíveisIndústria do petróleoMercado financeiroPetrobrasPetróleo

Mais de Mercados

Dólar fecha em queda de 0,84% a R$ 6,0721 com atuação do BC e pacote fiscal

Entenda como funcionam os leilões do Banco Central no mercado de câmbio

Novo Nordisk cai 20% após resultado decepcionante em teste de medicamento contra obesidade

Após vender US$ 3 bilhões, segundo leilão do Banco Central é cancelado