México é paraíso para negociar ações com informação privilegiada
Oscilações curiosas nas ações são assunto constante no mercado financeiro mexicano, que movimenta US$ 400 bilhões
Rita Azevedo
Publicado em 25 de março de 2018 às 06h00.
Última atualização em 25 de março de 2018 às 06h00.
As ações de determinada empresa desabam logo antes de sair uma má notícia ou sobem antes de aparecer uma manchete favorável. Em Wall Street, logo surgiriam suspeitas de uso indevido de informações privilegiadas. No México, faz parte da rotina.
A prática conhecida como insider trading é comum no mercado acionário mexicano e quase todo mundo sabe disso. Assim como nos EUA, lá é proibido negociar instrumentos financeiros com base em informações que não são de conhecimento público. O órgão regulador do mercado financeiro começou a divulgar as eventuais penalidades que aplica somente em 2008. Somente 28 pessoas foram punidas desde então.
Na média, demora mais de cinco anos para a Comissão Nacional Bancária e de Valores (CNBV) determinar a punição em casos de insider trading. Ninguém até agora foi preso ou sequer acusado criminalmente. Enquanto nos EUA as multas podem somar dezenas de milhões de dólares, no México a pena fica ao redor de US$ 60.000 por cabeça. O órgão afirma que age com base em sua autoridade constitucional e se negou a comentar quando questionado se faz o suficiente para coibir transações com informações privilegiadas.
Oscilações curiosas nas ações são assunto constante no mercado financeiro mexicano, que movimenta US$ 400 bilhões. Episódios recentes levaram investidores e advogados a defender a portas fechadas que as autoridades abram investigações, mas essas pessoas temem ostracismo e poucas estão dispostas a falar abertamente sobre o assunto. Afinal, corrupção e impunidade são temas centrais das campanhas para a eleição presidencial que acontecerá em 1º de julho.
Volume limitado
As ações mexicanas dificilmente flutuam quando as empresas anunciam balanços trimestrais, ressaltou John Griffin, professor da Universidade do Texas, em Austin, que estudou o timing das movimentações nos preços das ações em 56 países. “A explicação mais provável é que a negociação com informações vazadas é bastante disseminada”, ele disse. “Quando surgem notícias sobre os resultados das empresas, não tem nada de especial porque as pessoas já incorporaram os dados.”
Segundo agentes do mercado, a CNBV não tem tecnologia ou funcionários suficientes para vigiar potenciais irregularidades. Listamos abaixo alguns episódios ocorridos no ano passado que poderiam ser investigados:
* Em 1º de março, as ações da Desarrolladora Homex caíram quase 10 por cento para o menor nível histórico, sendo que há muito tempo não saiam notícias sobre a construtora. A explicação apareceu 48 horas depois, quando a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) anunciou a suspensão da negociação de papéis da empresa no mercado americano devido a uma acusação de fraude contábil da ordem de US$ 3,3 bilhões.
* As ações da OHL México chegaram a subir 5,2 por cento em 14 de junho. Depois do fechamento do mercado, a construtora comunicou às autoridades que recebeu uma oferta de aquisição. Antes do anúncio, um porta-voz da OHL disse que não comentaria a oscilação dos papéis.
* Em 27 de setembro, as ações da Alfa recuaram para o menor nível em semanas. Catorze minutos após o fechamento do mercado, o conglomerado industrial avaliado em US$ 6 bilhões anunciou a decisão de não abrir o capital da subsidiária Sigma.
* Em 4 de outubro, as ações da Ienova, unidade da Sempra Energy no México, tiveram a maior perda em um ano, caindo 3,9 por cento. Dois dias depois, a empresa anunciou que pagaria US$ 520 milhões à Pemex pela participação de 25 por cento em um gasoduto. Em seguida, as ações sofreram quedas por seis pregões consecutivos.
* As ações do Grupo Financiero Banorte chegaram a recuar 8,9 por cento em 25 de outubro, antes do anúncio da aquisição do Grupo Financiero Interacciones.