Mercados

Medidas cambiais barram Novo Mercado de renda fixa

As decisões do governo acabam afastando investidores estrangeiros

O real acumula uma baixa de 6,5% nos últimos três meses, após o governo ter triplicado a alíquota do IOF cobrada em empréstimos ou captações externas (Marcello Casal Jr/ABr)

O real acumula uma baixa de 6,5% nos últimos três meses, após o governo ter triplicado a alíquota do IOF cobrada em empréstimos ou captações externas (Marcello Casal Jr/ABr)

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Da Redação

Publicado em 20 de abril de 2012 às 11h07.

São Paulo - Cinco meses depois do lançamento das regras para o Novo Mercado de renda fixa do País, a tentativa de desenvolver o mercado secundário local para negócios com títulos de dívida corporativa esbarra nas medidas cambiais do governo, que acabam afastando investidores estrangeiros.

Duas empresas fizeram emissões de debêntures dentro do Novo Mercado desde o lançamento das novas regras, em outubro. A Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais, Anbima, exige que os papéis sejam vendidos para pelo menos 10 investidores, tenham prazo médio ponderado de quatro anos e paguem uma taxa fixa ou flutuante que seja atrelada à inflação.

As medidas adotadas pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para impedir que a indústria local continue perdendo competitividade devido à valorização do real estão afastando os investimentos de fora que são necessários para desenvolver o mercado local de dívida. O real acumula uma baixa de 6,5 por cento nos últimos três meses, após o governo ter triplicado a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras cobrada em empréstimos ou captações externas.

“O mercado de dívida corporativa em moeda local sempre teve essa vantagem cambial -- que agora está fora de questão”, disse Roberto Abad, que ajuda a administrar US$ 38 bilhões em ativos de mercados emergentes na Western Asset Management. O mercado doméstico de dívida corporativa “ficará sujeito a essa incerteza em relação a impostos, controles de capital, essas variáveis que não se sabe como afetarão o mercado”, disse ele em entrevista por telefone de Pasadena, no estado americano da Califórnia.

A parcela dos títulos soberanos emitidos no mercado local em poder dos estrangeiros tem estado ao redor de 12 por cento do total em circulação desde que o governo elevou o Imposto sobre Operações Financeiras sobre aplicações estrangeiras no mercado de renda fixa para 6 por cento em 2010, de acordo com o Tesouro. No México, a parcela de bônus prefixados em pesos em mãos estrangeiras bateu o recorde de 43,9 por cento em 3 de abril.

Gastos com infraestrutura

O governo brasileiro busca estimular as captações de longo prazo no mercado local, dentro do esforço para financiar R$ 955 bilhões em gastos com infraestrutura até 2014. O juro real mais elevado entre o Grupo dos 20 e a hiperinflação -- que atingiu 6.000 por cento em 1990 -- criaram uma cultura de investimentos no Brasil que é avessa a risco de longo prazo.

“É importante que o interesse do investidor estrangeiro por debêntures de empresas brasileiras aumente, pois eles vão ajudar a desenvolver o mercado e aumentar a liquidez”, disse Rogério Sobreira, professor da Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas no Rio de Janeiro. “Os estrangeiros ajudaram a criar grande parte da demanda por títulos do governo, especialmente os de mais longo prazo.”


Em dezembro, o governo eliminou o IOF de 6 por cento sobre as aplicações de estrangeiros em títulos corporativos com prazo acima de quatro anos e que serão usados para financiar investimentos e infraestrutura.

‘Mudança cultural’

Segundo Marcelo Giufrida, presidente da Anbima, várias ofertas de títulos estão em estudo e as regras provavelmente serão relaxadas em alguns casos.

“No início, é necessário ter um pouco de flexibilidade pois nem todos os emissores talvez consigam se enquadrar de primeira”, disse Giufrida em entrevista por telefone. “Nós temos que lembrar que esta é uma iniciativa nova, e como todos os novos arranjos no mercado, leva tempo para se estruturar. Não podemos ser tão rígidos a ponto de não conseguir atrair emissores, mas também não podemos ser tão flexíveis a ponto de descaracterizar o Novo Mercado.”

A Concessionária Rodovias do Tietê SA, que opera estradas no interior paulista, planeja vender R$ 650 milhões em debêntures com prazo de 12 anos, de acordo com pessoas a par da operação que pediram anonimato porque não têm autorização para falar publicamente. Segundo essas pessoas, o Barclays Plc, size and scope, está coordenando a colocação, que seria a primeira a oferecer a isenção do IOF para estrangeiros.

A Rodovias do Tietê não fez comentários citando o período de silêncio, segundo sua assessoria de imprensa.

O Barclays não quis comentar, de acordo com a agência de assessoria de imprensa em São Paulo.

Oferta da Cemig

A Cemig, sediada em Belo Horizonte, vendeu R$ 870 milhões em debêntures corrigidas pela inflação em uma oferta em duas séries em fevereiro. Os papéis com vencimento em 2019 pagam 600 pontos-base, ou seis pontos percentuais, a mais do que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo, que atingiu 5,24 por cento nos 12 meses até março. Os papéis com vencimento em 2022 pagam 620 pontos-base a mais do que o IPCA.

O Novo Mercado é um instrumento eficiente para ajudar as empresas no Brasil a acessar financiamento de prazo mais longo, disse Luiz Fernando Rolla, o diretor financeiro da Cemig.

“Nós testamos, nós gostamos e pretendemos usar novamente no futuro”, Rolla afirmou em entrevista em São Paulo. “É uma ótima ferramenta de financiamento de longo prazo.”

A BNDESPar, sediada no Rio de Janeiro, vendeu R$ 2 bilhões em debêntures em uma oferta de três séries, de acordo com fato relevante de 11 de abril. A operação incluiu R$ 302 milhões em papéis com prazo de quatro anos que pagam 55 pontos-base a mais do que a TJ3, a taxa de juros de referência de três meses, também conhecida como Libor brasileira.

A BNDESPar se recusou a fazer comentários para esta reportagem.

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