Marisa: de fechamento de lojas a capitalização do braço financeiro, CEO detalha plano de retomada
No quarto trimestre e no ano, a empresa registrou prejuízo; agora, diz João Nogueira Batista, o foco está na redução das despesas e volta da rentabilidade
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Marisa: diretor estatutário deixa a empresa (Marisa/Divulgação)

Publicado em 31 de março de 2023, 20h14.
Última atualização em 31 de março de 2023, 20h37.
Em meio a um processo de reestruturação financeira e operacional, a Marisa (AMAR3) tenta digerir números ainda ruins do quarto trimestre de 2022. A receita líquida caiu 1,6%, para R$ 830 milhões e o prejuízo líquido cresceu mais de sete vezes, chegando a R$ 188,6 milhões nos últimos três meses do ano. Mas olhar para esses números é olhar para o retrovissor, segundo João Nogueira Batista, que assumiu o comando da companhia em fevereiro. O balanço divulgado nesta sexta-feira, 31, porém, ainda não está auditado (leia mais abaixo).
"[O balanço] Não traz nenhuma grande novidade, todo mundo sabia que seria ruim em razão do cenário do varejo. O mais positivo é o que indica para este ano: a recuperação de margem feita pela área comercial no ano passado é alicerce importante para a redução de custos e entrar em outro patamar de rentabilidade e geração de caixa", diz ele em entrevista à EXAME Invest. Em um processo de fechamento de lojas deficitárias, redução de despesas e busca por receitas extras, a companhia também tenta encontrar mais soluções. Uma delas passa pela capitalização de R$ 90 milhões do MPagamentos, operação do Mbank.
Ex-Petrobras e conselheiro da Braskem, João Nogueira Batista tinha sido indicado para comandar o conselho da varejista. Ao assumir a direção executiva, deixou o cargo, que passou a ser ocupado por Luis Paulo Rosenberg, e seguiu como integrante. Nogueira Batista não tem intimidade com o varejo de moda, mas diz que está gostando e que "está focado na reestruturação para dar base para o crescimento". Segundo ele, se o ajuste interno sair como o planejado, a empresa pode pensar em acessar o mercardo de capitais já no primeiro semestre de 2024, com emissão de debêntures, por exemplo.
Embora a operação de varejo ainda demonstre sinais de problemas, como a queda de 0,6% na receita no trimestre (no ano, as vendas cresceram 11%), os dois maiores detratores do resultado da Marisa estão nas operações do braço financeiro e na linha de despesas financeiras — aquelas que tratam, entre outras coisas, do custo da dívida da empresa. Nos dois, a alta do juros machucou.
Sem ter controle sobre o juros, Nogueira Batista diz que a empresa vai seguir seus planos para tentar rearrumar a casa. O arcabouço fiscal apresentado na quinta-feira, 30, pelo governo foi considerado "razoável" pelo executivo, que destaca que a proposta é "mais crível que o próprio teto de gastos". Diz, no entanto, que a visão do Banco Central está "muito hermética, mirando em uma meta [de inflação] irrealista". Segundo ele, as empresas brasileiras estão acostumadas ao ambiente inflacionário ou de juros mais altos, mas o contexto está pior. "É difícil operar num país com juro real alto e pirataria tributária", diz referindo-se, por exemplo, aos e- commerces asiáticos, como a Shein, que têm aumentado suas vendas no país.
Capitalização da operação de financiamento
No Mbank, os juros mais altos aumentaram o custo de funding e também elevaram a inadimplência. Diante disso, conta Nogueira, a política de concessão de crédito já mudou e ficou mais cautelosa. "Estamos ajustando políticas de crédito e de controle de risco para não dar crédito mal dado. A operação anteriormente sofreu porque deu crédito mal dado. Então, agora, temos uma política de crédito mais cautelosa, tentando focar em crédito pessoal para aquele que é o nosso cliente e não para qualquer pessoa."
Mas a grande mudança para a operação está mesmo na reorganização, separando MCartões e MPagamentos. A MCartões vai voltar a ser exclusivamente prestadora de serviços de adquirência, sendo que a MPagamentos passará a concentrar todas as atividades de serviços financeiros.
Para isso, os controladores — integrantes da família Goldfarb — farão uma capitalização de R$ 90 milhões na MPagamentos, para que se enquadre aos índices regulatórios do Banco Central. O aumento de capital acontece via Mbank. Caso necessário, a Marisa fará até agosto deste ano um aporte adicional de R$ 26 milhões na MPagamentos.
Na radar, o fechamento de 90 lojas deficitárias
Segundo Nogueira Batista, os cerca de R$ 200 milhões em dívida a vencer no curto prazo são basicamente garantida por recebíveis, o que "não dá margem de manobra". Ou seja, não há muito o que se negociar com os bancos. Por isso, o caminho, explica ele, está em reforçar a estrutura da companhia por outros meios, como geração de caixa operacional e trazendo novos recursos, como a venda dos direitos creditários anunciada neste mês para gestora Quadra.
Com isso, paga os vencimentos mais próximos e vai alongando o perfil da dívida, explica o executivo. Por exemplo, a previsão é de que em maio já receba, após due diligence, os R$ 100,1 milhões da venda à Quadra dos direitos creditórios com valor de face R$ 380 milhões. Restam ainda aproximadamente R$ 130 milhões que vão ser compensados ao longo do ano, reforçando a estrutura financeira da companhia, conta o CEO.
Grande parte do trabalho passa pelo enxugamento da operação. "É preciso reduzir despesas gerais, administrativas e de vendas". Na mira estão 90 lojas que têm geração de caixa negativa ou muito baixa. "Ainda estamos no início da execução do plano o fechamento das lojas deficitárias. O plano é exatamente ir atacando os custos." Até o momento, já está equacionado o fechamento de 20 lojas, mas a ideia é chegar às 90 lojas em três meses.
A empresa calcula que o fechamento dos 90 pontos de venda tem custo de R$ 50 milhões e capacidade de geração de caixa positivo de R$ 70 milhões por ano já em 2024. A redução proporcional de SG&A (despesas de vendas, gerais e administrativas) deverá viabilizar uma geração extra de caixa da ordem de R$ 30 milhões ano.
O executivo conta que não há um perfil padrão para as lojas que estão operando no negativo: podem ser em shopping centers ou lojas de rua, por exemplo. O que se observa, conta ele, é que as lojas das capitais dos Estados e de grandes cidades de interior costumam se sair melhor. Ainda assim, ele conta que a composição geral não deve sofrer grandes mudanças de perfil. Seguirá com cerca de 50% de lojas em shopping centers e 50% de lojas de rua, bem como manterá a capilaridade geográfica, permanecendo com lojas em todos os Estados. Hoje a empresa tem 334 lojas e já havia fechado dez em dezembro.
Balanço não auditado e sugestões de melhoria após auditoria externa
No ano, a Marisa contabilizou uma perda líquida de R$ 391,0 milhões, 444% mais do que um ano antes. Grande parte do impacto na última linha feito da perda financeira que dobrou, ficando num resultado negativo R$ 220,7 milhões. A receita líquida do consolidado, que inclui varejo e Mbank, cresceu 9,9%, para R$ 2,78 bilhões.
A companhia até conseguiu um lucro bruto 22,5% maior no varejo no ano, mas o negócio do Mbank realmente se deteriorou, com o lucro bruto ficando negativo em R$ 67 milhões no quarto trimestre e caindo 94% no ano, para R$ 16,91 milhões. A varejista encerrou o ano com dívida bruta 8,4% maior, a R$ 874,6 milhões, e dívida líquida de R$ 560 milhões, 12,4% mais do que um ano antes.
A nova gestão coordenou um processo de revisão e auditoria interno e contratou uma comissão externa para análise de alçadas e práticas contábeis, composta pelo Lefosse Advogados e pela Deloitte Brasil. Algumas sugestões de melhoria que ainda não haviam sido implementadas em suas práticas contábeis e demonstrações financeiras foram feitas:
- baixa de receitas registradas de forma equivocada no valor de aproximadamente R$ 50 milhões;
- reclassificação de despesas operacionais (Opex) como despesas de capital (Capex) no valor de aproximadamente R$ 48 milhões; e
- revisão de provisão para contingências no valor de aproximadamente R$ 34 milhões
Com isso, a EY, que faz a auditoria externa dos resultados da Marisa, não conseguiu concluir os trabalhos a tempo. O que a companhia prevê que aconteça dias antes de 30 de abril, quando realiza sua assembleia geral ordinária.
Créditos

Raquel Brandão
Repórter de InvestJornalista há mais de uma década, foi repórter do Estadão, passando pela coluna do comentarista Celso Ming. Também foi repórter de empresas e bens de consumo no Valor Econômico. Na Exame desde 2022, cobre companhias abertasÚltimas Notícias
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