Inflação volta à pauta do mercado. Como ela afeta a bolsa e o dólar?
Índices de preços acima das projeções aumentam expectativa de alta de juros em 2021
Guilherme Guilherme
Publicado em 11 de setembro de 2020 às 07h00.
Última atualização em 11 de setembro de 2020 às 08h00.
Inflação e juros altos são um mal bem conhecido que vinha sendo deixado para trás. Mas agora que o Brasil estava se acostumando com o novo normal, esta realidade pode estar começando a entrar em xeque, com alguns índices de preços voltando a ganhar tração.
Divulgado no começo desta semana, o Índice Geral de Preços -- Disponibilidade Interna (IGP-DI) de agosto teve alta mensal de 3,87% e foi recebido com surpresa no mercado financeiro, que esperava algo por volta de 2,2%. Nesta quinta-feira, 10, foi a vez de a prévia do Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M) de setembro, também conhecida como inflação do aluguel, assustar ao ficar em 4,41%.
Nesse cenário, Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset, reforça que os dados de vendas no varejo desta quinta-feira, 10, que apontaram para crescimento anual de 5,2% em julho, merece atenção. “Tem componente que pode entrar no escopo inflacionário do próprio consumo. Já há alguns produtos que por redução da oferta já impactam o preço. O produtor tem uma escolha entre vender no mercado interno ou exportar [com o dólar a 5,30 reais]”, comenta.
Segundo Vieira, além da menor oferta de alimentos para o mercado interno, a alta do dólar resulta em inflação na ponta importadora. “Isso tem um peso considerável na indústria brasileira, que usa muito insumo importado na base de seus produtos.”
Quando a inflação começa a subir, bem como as expectativas de alta dos preços, o remédio amargo é a alta das taxas de juros. O mercado se antecipa, tanto que as curvas de juros futuras já começaram a subir. O contrato DI com vencimento em 2022 passou para 3,28% na semana. “O mercado está parando de falar de queda da curva curta e já começa a falar de quando os juros vão começar a subir de novo”, afirma Rodrigo Franchini, sócio da Monte Bravo.
Há um mês, a expectativa do mercado era a de que a taxa de juros Selic encerrasse 2021 mais próxima de 2,5% ao ano do que de 3% ao ano. Hoje, o cenário é o inverso.
Na bolsa, a taxa de juros é instrumento fundamental na análise uma ação, já que, na busca pelo valor justo, é usada como desconto dos fluxos de caixa. Ou seja, sua elevação poderia tornar as empresas menos valiosas. A alta da taxa de juros também pode resultar na migração de recursos hoje alocados em renda variável de volta para a renda fixa, o que diminuiria a demanda pelo papel. Já o real poderia se fortalecer, caso o aumento do rendimento dos títulos públicos atraia capital estrangeiro.
Mas ainda não há sinais de que o Banco Central irá apertar o botão de elevar os juros tão cedo. Na última semana, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Fabio Kanczuk, não descartou a possibilidade de mais um corte de juros residual até o final do ano. Mas o mercado não comprou a ideia. Desde terça, o contrato DI com vencimento em janeiro de 2021 subiu para 1,9% e precifica uma taxa de juros muito mais próxima dos atuais 2% ao ano do que em 1,75%.
“A baixa probabilidade de novos cortes não está tão relacionada com a inflação do alimento, mas com os riscos de problemas fiscais. O olho do BC está nas expectativas de inflação do final de 2021. Se chegando à metade do ano que vem essa inflação ainda estiver muito distante da meta de 3,75%, ele pode se sentir até mais motivado em permanecer nos 2% por mais tempo”, diz Arthur Mota, economista da Exame Research.