The Elders, grupo de anciões criado por Nelson Mandela, quer o Brasil na liderança climática global
Grupo reúne cinco prêmios Nobel da Paz e ex-presidentes de Estados Unidos, Noruega, Irlanda, Chile, Colômbia, Moçambique, entre outros
Editor ESG
Publicado em 29 de maio de 2024 às 13h25.
Ellen Johnson Sirleaf, economista nascida em Monrovia, na Libéria, fugiu para o exílio duas vezes. Na primeira, enfrentava a ditadura militar de Samuel Doe, um regime violento que levou o país a uma guerra civil de sete anos, entre 1989 e 1996. Num breve intervalo de estabilidade, Sirleaf voltou à Liberaia e se candidatou a presidente, mas foi derrotada por Charles Taylor, líder guerrilheiro responsável pela morte de Doe em batalha.
Acusada de traição, voltou a se exilar. Taylor seguiu sua saga destruidora e promoveu um conflito sangrento que se espalhou para a vizinha Serra Leoa, até ser destituído em 2003. Com apoio internacional, Sirleaf retornou e venceu as eleições subsequentes, se tornando a primeira mulher a assumir como chefe de estado em uma nação africana. Entre seu primeiro exílio e sua eleição, 250 mil pessoas morreram nas duas guerras civis.
Sirleaf, agraciada com o Prêmio Nobel da Paz, em 2011, enxerga o mundo, neste momento, em uma crise existencial. “Nos afastamos de princípios formadores da sociedade”, disse a ex-presidente em evento realizado pela Laclima, mobilização global de juristas para o combate às mudanças climáticas, e pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri). “Seremos cobrados pelas novas gerações.”
Na plateia, líderes políticos inclinavam levemente a cabeça em sinal positivo. Estavam presentes as ex-presidentes da Irlanda, Mary Robinson, e da Noruega, Gro Harlen Brundtland; o ex-presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos; o médico congolês Denis Mukwege, Prêmio Nobel da Paz em 2018; que são membros do The Elders, grupo de líderes globais em defesa da paz, justiça e de um planeta sustentável criado por Nelson Mandela, em 2007. Aniele Franco, ministra da Igualdade Racial no Brasil, também acompanhava a palestra, mas precisou se ausentar antes do encerramento do evento para não perder um voo.
O tema do encontro em São Paulo, “Liderança com Visão de Longo Prazo e Justiça Climática: Como o Brasil pode liderar o mundo”, talvez merecesse mais atenção do governo. Sirleaf seguiu Brundtland e antecedeu Robinson em apontar o Brasil como líder nato da nova ordem mundial sendo formada a partir dos esforços de transição para uma economia de baixo carbono. Na visão dos anciões de Mandela, o país tem os requisitos para comandar o mundo em direção a um modelo econômico mais justo e respeitoso com o meio ambiente: uma grande população, uma economia relevante e a maior biodiversidade do mundo, um ativo da Amazônia.
Assumir esse lugar depende da vontade da liderança política e da conscientização da sociedade, dizem os anciões. A elogiada diplomacia brasileira tem condições técnicas de unir o chamado sul global, bloco geopolítico formado pelos países emergentes, em torno da causa climática com ênfase na justiça social. Promover as mudanças necessárias para chegar ao ideal de liberdade, justiça e sustentabilidade, no entanto, depende de um componente extra, o poder econômico, atualmente concentrado nos países desenvolvidos.
Juan Manuel Santos, outro Prêmio Nobel da Paz, o presidente colombiano que negociou o acordo de paz com as Forças Armadas Revolucionárias (FARC) e encerrou uma guerra de seis décadas, entende ser possível convencer os países ricos a financiar as transformações econômicas para se chegar ao novo modelo econômico, um esforço de alguns trilhões de dólares e que depende da substituição do petróleo como a principal matriz energética global. “Precisamos ter muito poder de persuasão para convencê-los de que é do interesse deles ser mais generoso”, disse Santos. “Eles vão compreender”. É sempre um conforto ouvir a voz da experiência.