Exame Logo

Para analistas, Petrobras ignora transição energética em plano estratégico

Empresa divulgou nesta semana qual será o foco do negócio nos próximos anos: mais investimento no pré-sal e olhar tímido para a agenda verde

Petrobras: quase 70% do petróleo produzido pela empresa vem do pré-sal. Em 2026, esse valor deve ser 79% (André Motta de Souza/Agência Petrobras/Divulgação)

Victor Sena

Publicado em 26 de novembro de 2021 às 15h56.

Última atualização em 26 de novembro de 2021 às 17h17.

Nos próximos cinco anos. a Petrobras pretende investir 55 bilhões de dólares em projetos. Desse total, 1,8 bilhão é para a agenda verde e de transição energética. Na visão de analistas ouvidos pela EXAME, o novo plano estratégico da empresa divulgado nesta semana tem acertos, mas tá ignorando o futuro em que o petróleo será menos relevante.

Petroleiras como a British Petroleum (BP), Equinor e Chevron têm apostado em uma mudança de modelo de negócios. A ideia delas é abandonar aos poucos a exploração e a depedência do petróleo. A mudança inclusive já alterou a forma como elas se comunicam. Agora, a ideia é passar a mensagem de que são empresas de energia. A BP, por exemplo, adotou a cor verde na marca.

Veja também

Na Petrobras, porém, a agenda divulgada nesta semana se resume em reduzir as emissões de carbono na exploração do petróleo e zerá-las até 2050. A empresa já tem até investido nisso nos últimos anos, principalmente na reinjeção de gás nos poços, que antes eram queimados nas plataformas. Hoje, a extração de cada barril de petróleo gera 15,7 quilos de carbono. Em 2010, eram 30 quilos. Essa emissão acontece porque ao retirar petróleo de um poço, não é só óleo que sobe, mas também gases.

Os mais de 40 bilhões restantes que a empresa pretende investir nos próximos anos são focados em aumentar a exploração no pré-sal. A região tem alta produtividade, volumes de reservas altos — o que diminui o custo de extração — e forte expertise nessa exploração de águas profundas. Quase 70% do petróleo produzido pela empresa vem de lá. Em 2026, esse valor deve ser 79%.

Apesar de criticar a falta de indicativos para a transição verde, o investimento no pré-sal é elogiado pelo analista Ilan Albertman, da Ativa Investimentos:

"Eles têm uma oportunidade fantástica com o pré-sal, que tem o custo de exploração de 3 dólares o barril. Com o brent a 80, é um negócio muito lucrativo. Então é um acerto priorizar o que faz a companhia girar mais rápido. No Ebitda do terceiro trimestre, 70% veio do pré-sal. Ainda assim, em um plano de investimento de mais de 50 bilhões de dólares, só 1,8 bilhão para compensação de carbono é tímido. Há poucos projetos de aumentar a oferta de petróleo no mundo. No médio prazo o preço vai ficar fortalecido, mas e depois? Eu acho que é fundamental ter outros caminhos. Vai ter demanda de petróleo, mas tem de diversificar o portfólio com uma agenda verde".

Suzana Kahn, professora da Coppe-UFRJ, concorda que a empresa deveria diversificar. Para ela, a opção de geração de energia eólica em alto-mar poderia ser uma boa opção para a empresa, já que a Petrobras domina a tecnologia offshore. Outra tecnologia possível seria aproveitar o movimento das marés.

"Eu acho que esse planejamento da Petrobras de explorar ao máximo o pré-sal é muito arriscado porque um olhar míope e extrativista. Extrai tudo o que dá. É claro que a gente ainda vai precisar de petróleo, mas estamos chegando num ponto em que a demanda vai começar a cair. Ela pode extrair tudo agora, mas e depois? Todas as outras petroleiras estão investindo muito em energias renováveis. Não só as empresas como os países. A China investiu 800 bilhões nisso nos últimos quatro anos e os Estados Unidos 400 bilhões. Faz sentido ignorar isso?", questiona Suzana.

Mesmo que ainda exista um consumo de petróleo residual nas próximas décadas, principalmente para a indústria petroquímica e produção de plástico, a visão dos analistas é que esse mercado seria muito pequeno para sustentar a exploração de petróleo a todo vapor. Com isso, o tamanho da Petrobras será muito menor no futuro se ela não diversificar e apostar na transição.

Ilan reconhece que a diretoria da empresa quer focar no produto que domina, zelando pelo capital da empresa, mas ele cita também que em algum momento no futuro a demanda pelo petróleo vai começar a cair em meio à transição energética do mundo — e assim também o preço.

Existem diversas tentativas de prever quando a demanda de petróleo vai atingir um pico, para depois cair. A Agência Internacional de Energia prevê que isso ocorra em 2025, um perspectiva de queda considerada rápida. As previsões, no entanto, concordam que isso deve acontecer até 2040.

No relatório do novo plano estratégico, a Petrobras afirma que é possível explorar petróleo do pré-sal com algum lucro mesmo que o barril chegue a custar apenas 20 dólares. A empresa ja prevê uma queda para os próximos cinco anos: em 2026, o barril custará 55 dólares.

"No curto e médio prazo, a trajetória do setor de óleo e gás é positivo. Os últimos balanços não deixam dúvida. Há uma grande capacidade de criação de valor, mas quando você pensa na viabilidade de uma companhia seu espectro de tempo é maior", eplica Ilan Albertman.

Para o analista, o tempo de investir sozinha em energia eólica e solar passou, e agora valeria a pena contar com parcerias, principalmente quanto à energia eólica que hoje é competitiva.

Em relatório sobre a empresa, o banco BTG Pactual elogiou os compromissos financeiros e de foco no pré-sal, apesar de ainda considerar que oscilações políticas — como cobranças para baixar preços dos combustíveis — têm peso negativo.

O banco também não trouxe críticas sobre a necessidade de se apontar projetos mais concretos de transição energética e elogiou o que foi abordado no plano sobre a agenda verde. "ESG ocupou uma parte mais forte do que nunca na apresentação e nas diretrizes da empresa para o plano estratégico", cita o relatório.

Outros anúncios do plano estratégico da Petrobras foram mudanças no dividendos e investimentos para a finalização da refinaria de Abreu e Lima. Eles serão pagos trimestralmente e somarão pelo menos 4 bilhões de dólares em anos em que o Brent médio registrado for de pelo menos de 40 dólares e no caso da dívida bruta estar abaixo de 65 bilhões de dólares.

 

 

Acompanhe tudo sobre:EnergiaMeio ambientePetrobrasPetróleo

Mais lidas

exame no whatsapp

Receba as noticias da Exame no seu WhatsApp

Inscreva-se

Mais de ESG

Mais na Exame