JBS e BRF correm atrás de novo padrão de bem-estar animal para os suínos
Relatório mostra que os produtores nacionais aumentaram a preocupação, mas estão atrasados na implementação de medidas para reduzir o sofrimento dos porcos
Rodrigo Caetano
Publicado em 29 de dezembro de 2020 às 10h07.
Última atualização em 29 de dezembro de 2020 às 15h55.
As principais produtoras de carne suína brasileiras buscam se adaptar a novos padrões de bem-estar animal. O atual estágio das mudanças no tratamento dos porcos, visando reduzir seu sofrimento, foi analisado e divulgado pela organização de proteção animal Alianima, que produz o relatório Observatório Suíno. O cenário é de maior conscientização entre as empresas, porém, há um longo caminho a percorrer.
Os frigoríficos mais avançados na implementação das medidas de bem-estar são Pamplona, com 75% da produção adaptada, e JBS , com 58%. Em seguida, aparecem BRF e BFFC, com 35%, e Alegra Foods e Frimesa, com 30%. Essa é a primeira edição do relatório, que será divulgado anualmente. Serão monitoradas 10 empresas, as já citadas e Aurora, Burger King, McDonald’s e Subway. Todas assinaram compromissos públicos de banir as chamadas células de gestação na indústria de carne suína.
Essas células são o principal problema apontado por especialistas em bem-estar animal. O dispositivo é adotado para impedir que a porca se mova durante a amamentação dos filhotes. É uma medida cruel, que ignora todas as necessidades naturais dos animais. Também é ineficiente, pois mascara problemas mais sérios de produção, como a má alimentação das porcas. Com as mães presas, os filhotes ficam tentando obter leite mesmo quando não há, o que acaba machucando a porca. Para remediar esse problema, a indústria avança na crueldade: com o uso de uma esmerilhadeira, ferramenta elétrica usada para o desbaste de metais, serram os dentes dos porquinhos.
A alternativa é utilizar baias coletivas, em que as porcas entram e saem quando quiserem. Esse sistema é mais moderno e produtivo. Com uso de sensores e automatização, é possível controlar todo o processo de gestação e verificar a qualidade das matrizes (como são chamadas as porcas reprodutoras). “O alojamento das porcas em baias coletivas proporciona produtividade e saúde igual ou superior quando comparada às celas individuais. Além disso, o exercício físico durante a gestação melhora o desempenho no parto”, afirmou Patrycia Sato, presidente da Alianima.
Criada no Brasil, a ONG defende a produção de alimentos sem sofrimento, o fim do uso de animais como entretenimento, a redução do consumo de carne, entre outras pautas ambientais. Este ano, ela recebeu um aporte de 130 mil dólares da organização americana Open Philanthropy.
O movimento pelo fim das celas de gestação começou a ganhar corpo nos últimos cinco anos no Brasil. Lá fora, o estágio está mais avançado. A prática já foi banida em, pelo menos, dez Estados americanos, no Canadá, na Nova Zelândia e é condenada, também, pela União Europeia. O grupo Smithfield, maior processador de carne suína dos Estados Unidos, aboliu as celas em sua operação americana há dois anos. No resto do mundo, deve fazer o mesmo em 2022.
Para Sato, a pressão dos consumidores tem forçado as empresas a se mexer. “Temos um consumidor mais consciente e exigente, uma indústria mais atenta e preocupada com o sofrimento animal, e mais organizações oferecendo esclarecimento e suporte para que a transformação ocorra da forma mais justa e consistente possível”, afirma.
As maiores produtoras brasileiras, de fato, não estão paradas. Em nota, a BRF afirmou que implantou o programa interno Bem-Estar Animal Feito pela BRF, “que rege compromissos, normas, processos, indicadores e treinamentos para toda a empresa, desde transportadores, produtores integrados, parceiros e colaboradores, para que atuem de forma correta e compassiva em todos os estágios do processo de produção de aves e suínos.”
A empresa aboliu totalmente o corte ou desgaste dos dentes dos suínos, ressaltando que o “procedimento é realizado apenas em casos extremos, onde há comprometimento do bem-estar da fêmea”. O planejamento é de adotar baias coletivas em 100% da produção até 2026.
Já a JBS disse que o relatório da Alianima “demonstra que a empresa está avançando, e bem, no cumprimento das melhores práticas de bem-estar animal e, também, dando transparência ao assunto em seus materiais públicos”.
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Mundo vegetariano
Ao mesmo tempo em que correm atrás de se adequar ao padrão internacional de bem-estar animal, as processadoras de carne suína enfrentam a ameaça da proteína vegetal, carne feita de plantas e que não depende do abate de animais. Estima-se que em cinco anos os hambúrgueres sintéticos vão custar o mesmo que os feitos com carne de verdade. Com isso, o mercado de carne vegetal pode chegar a 140 bilhões de dólares por ano em 2029 (10% do mercado de carnes convencionais), segundo estudo do banco de investimento Barclays.
A startup precursora desse movimento é a americana Beyond Meat, fundada em 2009, e que abriu capital na Nasdaq no ano passado. Neste ano, em julho, a companhia trouxe seus produtos ao mercado brasileiro.
Por aqui, a pioneira é a Fazenda do Futuro, criada pelos ex-donos da fabricante de bebidas Do Bem, de sucos e chás, vendida à Ambev em 2016. Em setembro deste ano, a startup recebeu um aporte de 115 milhões de reais liderado pelo BTG Pactual (do mesmo grupo que controla a Exame), ENFINI Investments (Grupo PWR Capital) e os investidores da primeira rodada Monashees e Go4it Capital.
A JBS também está investindo em proteína vegetal. A marca Seara, que pertence à empresa, possui 12 produtos com sabor e textura de carne, mas feitos a partir de plantas. Os primeiros produtos foram lançados em 2019.
Outra food tech capitalizada é a chilena NotCo, que recebeu também em setembro um aporte de 85 milhões de dólares para impulsionar sua expansão internacional. A companhia ficou conhecida por suas versões veganas de produtos como maionese e leite. Neste ano, a startup trouxe seu hambúrguer feito de planta ao Brasil.