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Espírito de dono e Conselho de Administração: o exemplo de grandes grupos familiares brasileiros

Replicar o modelo de governança focada no futuro, de conselheiros mais perenes e próximos à operação, em companhias que possuam apenas instâncias de governança protocolares, representa mudança cultural significativa

*Juliana Buchaim, foi gestora e estrategista de fundos no Brasil por 20 anos, é co-chair da WCD Brasil – Women Corporate Directors e conselheira de administração (//Reprodução)
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Publicado em 10 de junho de 2024 às 13h56.

Por Juliana Buchaim*

A governança corporativa de empresas familiares no Brasil não se limita a episódios de desalinhamentos e controvérsias. Esses casos hoje são a exceção, não a regra.

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Em contraste com o fim dos anos 90, período em que a governança corporativa global enfrentava desafios significativos e as empresas familiares brasileiras eram vistas com ceticismo, o modelo de gestão familiar passou por uma evolução notável. Grupos que anteriormente recebiam severas críticas, hoje se tornaram exemplos de excelência corporativa. A profissionalização das empresas familiares e ressignificação do papel do Conselho de Administração foram cruciais para essa mudança.

A função primordial do Conselho sempre foi assegurar a continuidade da empresa. No entanto, essa responsabilidade, que historicamente se limitava a um papel de supervisão e fiscalização, em geral, se encontrava nas mãos de membros com limitada participação e pouco engajados na criação de um legado duradouro.

As estratégias de longo prazo, essenciais para o futuro da companhia, não eram priorizadas nas discussões – em muitos casos, independentemente do tipo de controle, ainda hoje, não são. Esse desafio se devia, em grande parte, a um desequilíbrio entre a governança familiar e corporativa, à ausência de mecanismos profissionais e meritocráticos dentro da companhia e à falta de clareza do papel do Conselho como um verdadeiro guardião do futuro da organização.

Não é à toa que as empresas brasileiras de grande destaque hoje pertencem a grupos familiares que acompanharam a evolução da governança, em muitos casos ascendendo seus acionistas conhecedores do negócio ao Conselho e formando assim um grupo misto e complementar com membros engajados que se responsabilizam verdadeiramente pelo rumo da empresa.

Igualmente, nessas “novas” empresas de controle familiar, encontramos os melhores exemplos de ambidestria corporativa. Elas são fortalecidas por um conselho que não apenas garante maior clareza sobre o lugar da organização no futuro, mas também facilita a execução diária de suas operações, constituindo um colegiado que apoia o trabalho do executivo. São acionistas e conselheiros que entendem, por exemplo, que os resultados trimestrais são o produto de uma série de mecanismos, estruturas e incentivos cuidadosamente planejados para uma execução precisa com foco no longo prazo. Sutilezas que ajudam, inclusive, na necessária gestão das prioridades.

Esses grupos familiares também se apresentam hoje mais ágeis e inovadores do que muitas empresas de controle difuso. O espírito de dono faz a diferença. Fácil falar...

Construir essa relação em um Conselho Administrativo, porém, não é trivial: o sistema está configurado para priorizar relações de curto prazo, com mandatos breves e uma estrutura de risco e retorno não equitativa e desbalanceada. Isso resulta, quase intencionalmente, em um distanciamento prejudicial entre o negócio e os órgãos de governança, dificultando o envolvimento mais profundo entre conselheiro e empresa. Adicione-se a isso a difícil gestão do tempo das interações em ambientes excessivamente formais, que oferece pouco espaço para trocas abertas e genuínas.

Replicar o modelo de governança focada no futuro, de conselheiros mais perenes e próximos à operação, em companhias que possuam apenas instâncias de governança protocolares, representa mudança cultural significativa. Essa conciliação entre acionistas, o Conselho de Administração e a equipe executiva — ancorada numa visão de futuro sustentável — tem alto nível de complexidade.  Deve estar alicerçada no compromisso e responsabilidade indelével dos conselheiros com a essência e perenidade do negócio, independentemente de relações familiares ou não – promovendo uma cultura que apoia a inovação e a eficiência, simultaneamente, assegurando a continuidade do legado corporativo.

A redefinição dos papéis, a estruturação consciente dos mandatos, e, principalmente, a revitalização da dinâmica dos Conselhos de Administração, incorporando o espírito de dono por meio da governança corporativa, revelam-se como as chaves para desencadear uma evolução que cultive valor de longo prazo para todos os stakeholders. Nesse contexto, muitos grupos familiares no Brasil emergem como exemplos notáveis, demonstrando como uma governança familiar ativa e comprometida pode ser um motor de sucesso empresarial.

*Juliana Buchaim, foi gestora e estrategista de fundos no Brasil por 20 anos, é co-chair da WCD Brasil – Women Corporate Directors e conselheira de administração.

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