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Mercado de carbono tem potencial para atrair até US$ 120 bi e gerar 8 milhões de empregos

Segundo ex-ministra Kátia Abreu, projeto que está em tramitação no Congresso pode projetar País no cenário internacional

Ex-ministra nota a criação do órgão gestor do Sistema Brasileiro do Comércio de Emissões como um dos entraves (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Esfera Brasil

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Publicado em 23 de agosto de 2024 às 15h59.

Apontado como um dos eixos para uma transição energética justa, o projeto de lei que prevê a regulamentação do mercado do carbono está em tramitação no Congresso Nacional e depende de aprovação da Câmara dos Deputados. Nas palavras da ex-ministra da Agricultura, Kátia Abreu, a matéria projeta o País no cenário internacional e pode atrair entre US$ 50 bilhões e US$ 120 bilhões em investimentos até o ano de 2030, além da geração de oito milhões de empregos nas próximas duas décadas.

Entre os principais desafios para a regulamentação, a ex-ministra nota a criação do órgão gestor do Sistema Brasileiro do Comércio de Emissões como um dos entraves atuais.

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Confira abaixo a íntegra da entrevista de Kátia Abreu à Esfera Brasil sobre a regulamentação do mercado de carbono no Brasil.

É possível projetar um volume de investimentos que podem ser destravados a partir da regulamentação do mercado de crédito de carbono?

A área com cobertura de vegetação nativa no Brasil corresponde a mais de 60% de seu
território, o que faz com que o País concentre cerca de 15% do potencial global de captura de carbono por meios naturais, com possibilidade de atender 50% da demanda global por créditos, segundo estudo da consultoria McKinsey. O mesmo estudo indica que o mercado regulado de carbono poderá render ao Brasil, até 2030, cerca de US$ 50 bilhões. Já o cálculo da Câmara de Comércio Internacional [ICC Brasil] demonstra que uma regulação efetiva do mercado de carbono nacional permitirá que atuemos mais fortemente no mercado internacional, rendendo ao País até US$ 120 bilhões no mesmo período.

Considerando o significativo aumento da demanda por créditos de carbono – o Brasil movimentou entre 2015 e 2020 cerca de US$ 200 milhões e viu o montante saltar para mais de US$ 1 bilhão entre 2021 e 2023 –, podemos arriscar que superaremos o horizonte indicado pela McKinsey nos próximos 5, 6 anos.

Qual o principal entrave para a regulamentação do mercado de carbono atualmente?

Avalio que a principal barreira para a regulamentação do mercado de carbono no Brasil é uma combinação de desafios técnicos, políticos e econômicos que precisam ser tratados de forma coordenada. Entre os desafios técnicos, destaco a criação do órgão gestor do SBCE [Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões], que será responsável pelo estabelecimento dos critérios para o credenciamento de metodologias necessárias à geração de Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões [CRVE], fundamentais para a estrutura do mercado. Há também o impasse entre Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e as securitizadoras, uma vez que o texto do PL considera que os ativos integrantes dos SBCE – CBE, CRVE, CRAM e os créditos de carbono –, quando negociados no mercado financeiro e de capitais, serão considerados valores mobiliários sujeitos ao regime da Lei 6.385/1976 e sob responsabilidade da CVM, mas abrem espaço para que os CRAMs [Certificados de Recebíveis Ambientais] sejam também emitidos por companhias securitizadoras. De forma que defendo que todos os ativos relacionados ao SBCE estejam sob responsabilidade da CVM, que por meio da unicidade poderá garantir maior confiabilidade e transparência ao processo.

Na esfera política, temos a discussão no Legislativo Federal do projeto de lei que trata do SBCE. Nesse caso, penso que o texto traz definições importantes para o cumprimento dos contratos que serão estabelecidos, mas que deve ser considerada a observação colocada anteriormente sobre a situação envolvendo CVM e securitizadoras.

Sob o ponto de vista econômico, penso que trata-se de oportunidade singular para o Brasil gerar mais de 8 milhões de empregos nos próximos 25 anos, enquanto se destaca como protagonista no mercado verde, atraindo novos investimentos.

O projeto de lei que está em tramitação atende plenamente às demandas do setor?

Estamos otimistas em relação ao PL 182/2024, para criação do SBCE, pois o mesmo representa um esforço conjunto para atendimento de interesses de diversos setores da economia nacional, embora ainda não os atenda plenamente.

É exatamente a mesma situação que vivemos na discussão do Código Florestal: poderá não ser o mercado de carbono ideal para cada setor, mas certamente será uma ferramenta obtida por consenso e importante para o desenvolvimento do País, abrindo espaço para uma participação mais ampla da sociedade nos mercados de carbono, garantindo, inclusive, mais segurança jurídica.

No caso do agro, a Comissão de Meio Ambiente do Senado excluiu o setor agropecuário primário – da porteira para dentro – por entender que o produtor rural não é obrigado a mitigar as suas emissões via mercado de carbono, o que assemelha-se ao praticado na Europa por meio do European Emission Trading System, que também exclui atividades agropecuárias e é obrigatório para atividades industriais.

É importante destacar que, embora haja movimento contrário, o PL propõe tornar Áreas de Preservação Permanente [APP] e de Reserva Legal [RL] elegíveis para emissão de crédito de carbono, estando alinhadas com o Código Florestal e com a Lei de Pagamentos por Serviços Ambientais.

Existe algum modelo de regulamentação do mercado de carbono que esteja em vigor em outro país e que possa servir de exemplo?

Sim, vários. Neste tema, estamos alinhados com um grande número de países. O SBCE tem como objetivo limitar as emissões de gases de efeito estufa e permitir a negociação de ativos que representam emissões, reduções ou remoções desses gases no País. Para isso, adota o sistema cap and trade, que tem como objetivo limitar as emissões de gases do efeito estufa por meio da precificação e está baseado nas metas de corte de emissões estabelecidas pelo Protocolo de Kyoto.

É o modelo mais utilizado no mercado Europeu e adotado por países como Austrália, Nova Zelândia, México e Estados Unidos. Entretanto, reforço que diante das características do Brasil, devemos trabalhar para a aceitação dos créditos de carbono gerados pelo desmatamento evitado, não apenas das APPs e RLs, mas também das Unidades de Conservação [UCs], assim entendendo que as florestas são ativos nacionais, quer seja de propriedade pública ou privada, necessitando de remuneração para manutenção de sua preservação.

No fim do ano passado, a Comissão do Meio Ambiente do Senado aprovou de maneira terminativa uma proposta de regulamentação do setor. Mas na Câmara o texto foi apensado a outro, que voltou para a análise do Senado. A que se deve esse impasse, na sua opinião?

Considero que o impasse entre as casas relaciona-se justamente à terminação do PL, visto tratar-se de matéria com grande visibilidade e com impactos importantes. Como citei anteriormente, o agora PL 182/2024 representa a união de esforços para atendimento de diversos interesses de variados setores da economia nacional e consequentemente da população. E, por tratar-se de tema complexo e fundamental para o desenvolvimento do País, está exposto ao amplo debate. Por conta do rito normal de tramitação de um projeto de lei, que envolve análises, discussões e alterações, e considerando que os deputados alteraram o texto do Senado, o PL do SBCE retornou para a casa iniciadora, o Senado, para avaliação dos senadores, que na sequência poderão dar parecer definitivo.

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