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Será que decola?

O programa espacial brasileiro após a tragédia de Alcântara

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h48.

Em meio às várias hipóteses sobre o que provocou a explosão do Veículo Lançador de Satélites (VLS) e a morte de 21 técnicos e engenheiros do Centro Técnico Aeroespacial (CTA), em Alcântara, no Maranhão, surge uma dúvida de outra natureza. Vale a pena manter o programa espacial de pé? O que o país ganha com um projeto que consumiu 2,3 bilhões de reais nos últimos 22 anos? Um jeito de responder à pergunta é olhar para o mercado de lançamento de satélites. A cada ano, cerca de 40 deles são lançados em todo o mundo. Em 2008, deverão movimentar 4 bilhões de dólares.

Como fazer um lançamento a partir da linha do Equador é 27% mais barato que a partir de outras latitudes nos Estados Unidos ou na Europa, é razoável supor que o Brasil tenha uma boa chance de prestar serviços nessa área -- no mínimo, alugando local e infra-estrutura para lançamentos. É por isso que o governo vem discutindo a criação de uma empresa em parceria com a Ucrânia, país que domina a tecnologia de lançamento.

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Para que a empreitada tenha sucesso, é preciso, antes, enfrentar uma questão. Passadas mais de três décadas desde o desenvolvimento do primeiro foguete Sonda, ainda não está claro o que o país pretende com seu programa espacial. Numa época prolongada de ajuste das contas públicas, ele é apenas uma das muitas áreas da pesquisa nacional que vêm sofrendo com a escassez de recursos. "É uma temeridade o governo continuar desenvolvendo o programa espacial desse jeito", diz o presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Luiz Bevilacqua. "Ou o Brasil aposta nesse programa, ou desiste." O orçamento da AEB para este ano é de 35 milhões de reais, quando o ideal seria algo em torno de 120 milhões. Países como a China e a Índia, por exemplo, gastam o equivalente a 1,2 bilhão de reais por ano em atividades espaciais.

Criado na segunda metade da década de 60, em pleno regime militar, o programa espacial contou com recursos abundantes até o começo dos anos 80. De lá para cá, ele deixou de ser tratado como prioridade e os recursos minguaram. "A falta de uma política consistente foi nociva em muitos aspectos", diz o engenheiro Jaime Boscov, de 71 anos, gerente técnico do VLS até se aposentar, em 1995. Pelo cronograma original, o programa do VLS, lançado em 1989, deveria estar concluído em dez anos. Catorze anos mais tarde, a tragédia de Alcântara deve atrasar ainda mais o seu final.

Um dos dois satélites perdidos no fogo foi desenvolvido pelo engenheiro paranaense Fernando Stancato. Ao longo de dois anos, juntamente com 15 estudantes de engenharia e computação da Universidade do Norte do Paraná (Unopar), Stancato desenvolveu soluções criativas nas áreas de energia solar, controle remoto e transmissão de voz e dados. Ele e sua turma conseguiram, por exemplo, aumentar 12 vezes a vida útil de baterias solares. Ao todo, 51 empresas foram mobilizadas no projeto e na construção do VLS, muitas delas com encomendas que desafiaram padrões de qualidade anteriores. Entre outras coisas, desenvolveram competência para fabricar ligas mais resistentes de aço e alumínio, tintas, colas, fibra de vidro, fibra de carbono e centenas de produtos hoje usados na indústria automobilística, aeronáutica e em outras. "Programas avançados assim são essenciais para darmos saltos na educação, na formação e na inovação", diz o major-brigadeiro Hugo Piva, que dirigiu o programa espacial de 1969 a 1987. O que teria acontecido se o programa tivesse sido cumprido à risca? "Teríamos hoje uma Embraer do setor espacial", afirma Pedro John Meinrath, consultor da área de tecnologia.

* Colaborou Marcos Coronato

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