Após 9 horas de sessão, reforma da Previdência passa na CCJ por 48x18
Em sessão tumultuada, deputados aprova reforma na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara após acordo para retirada de 4 pontos polêmicos
Ligia Tuon
Publicado em 23 de abril de 2019 às 23h51.
Última atualização em 24 de abril de 2019 às 13h23.
São Paulo - A reforma da Previdência proposta pelo governo Bolsonaro teve sua admissibilidade aprovada na Comissão de Constituição, Cidadania e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, na noite desta terça-feira (23), por 48 votos a favor e 18 contra.
A sessão tumultuada em que foi votado o relatório do deputado Marcelo Freitas (PSL-MG), com parecer favorável à proposta, foi marcada por questionamentos e requerimentos da oposição.
No total, a sessão durou 9 horas (começou por volta das 15 horas e só foi concluída por volta das 23h50) sendo que a proposta estava na CCJ há 62 dias.
A votação de hoje é uma vitória para o governo mas só foi possível após um um acordo com as lideranças da Casa, no qual foram aceitas alterações em quatro pontos do texto.
O primeiro é o fim do pagamento da multa de 40% do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do recolhimento do fundo do trabalhador já aposentado que voltar ao mercado de trabalho.
O segundo ponto é a concentração, na Justiça Federal em Brasília, de ações judiciais contra a reforma da Previdência.
Os outros pontos são a exclusividade do Poder Executivo de propor mudanças na reforma da Previdência e a possibilidade de que a idade de aposentadoria compulsória dos servidores públicos (atualmente aos 75 anos) seja alterada por lei complementar, em vez de ser definida pela Constituição, como atualmente.
A expectativa inicial era que a votação ocorresse na semana passada, mas houve adiamento, gerando tensão no mercado financeiro e mais dúvidas sobre a capacidade de articulação política do governo.
Quando a proposta da reforma foi apresentada inicialmente, em 22 de fevereiro, havia previsão de que essa fase poderia estar concluída ainda em março.
Mesmo com as mudanças anunciadas hoje, a previsão de economia com a reforma continua em 1 trilhão de reais em uma década, segundo o governo.
A expectativa é que já na próxima quinta-feira seja instalada a Comissão Especial, próxima fase do processo de tramitação e no qual será analisado o mérito da proposta.
Para virar lei, a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) precisa ser aprovada por dois terços da Câmara (308 dos 513 deputados) em dois turnos e então segue para o Senado, onde precisa ser aprovada por dois terços dos senadores (49 dos 81) também em dois turnos.
Sigilo e confusão
No fim de semana, um pedido da Folha de S. Paulo de acesso aos dados que embasam a proposta da reforma foi negado pelo Ministério da Economia, que decretou sigilo sobre os documentos.
O decreto irritou parlamentares e levou a oposição a entrar com um mandado de segurança no STF (Supremo Tribunal Federal), negado pelo ministro Gilmar Mendes, pedindo a suspensão da tramitação na comissão.
Os partidos de oposição conseguiram as assinaturas necessárias --mais de um quinto dos 513 deputados da Câmara-- para um requerimento com o objetivo de suspender a tramitação da reforma por 20 dias, para que os números sejam divulgados pelo governo.
Segundo a líder da Minoria, Jandira Feghali (PCdoB-RJ), o requerimento em si já seria suficiente para a suspensão da tramitação. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que acompanhou parte dos trabalhos na CCJ, afirmou, no entanto, que não existe essa previsão.
A partir do anúncio de Jandira, Maia e o presidente da CCJ, Felipe Francischini (PSL-PR), reuniram-se na secretaria da comissão. Francischini deixou a reunião argumentando que o requerimento não contava com as assinaturas necessárias --eram exigidas 103 assinaturas. Segundo ele, apenas 99 deputados subscreviam o documento.
A assessoria da líder da Minoria explicou que 10, das 113 assinaturas obtidas, não foram reconhecidas pela Secretaria Geral da Mesa, e outras quatro foram descartadas por estarem repetidas. Ainda segundo o gabinete da deputada, os deputados da oposição estavam sendo mobilizados na noite desta terça-feira para comparecerem à Mesa para validarem suas assinaturas.
O vice-líder da Minoria, José Guimarães (PT-CE), assim como outros integrantes da oposição, alertou que o tema pode ser judicializado.
Na segunda-feira, Maia afirmou que os números tomados como referência para a elaboração da reforma da Previdência serão divulgados na quinta-feira desta semana.
Tensão na base
Também houve atritos na sessão mesmo entre grupos de deputados favoráveis à proposta.
O DEM ameaçou deixar a sessão depois que a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), fez um discurso inflamado contra a tentativa da oposição de obstruir a tramitação.
"Mais uma fala do governo e o DEM se retira da votação", avisou o deputado Arthur Oliveira Maia (DEM-BA). Ele ficou irritado porque não é primeira vez que Joice quebra acordo da base para que os deputados não usem tempo de fala na sessão para agilizar os trabalhos.
Aos gritos, Joice criticou a procrastinação da votação da reforma na CCJ. "Já deu essa discussão. Não podemos mais empurrar com a barriga", disse Joice.
Segundo ela, não há sigilo dos dados da Previdência e o debate do impacto da reforma precisa ser feito na comissão especial.
"Será que tenho que dar aula? Aqui se discute constitucionalidade", ironizou. "Senhores, está ficando feio. População quer que essa comissão trabalhe", acrescentou.
A líder do governo acusou a oposição de fazer conversa fiada e de serem "paladinos da calculadora previdenciária".
"A oposição que vote contra, mas que deixe a gente fazer trabalho", disse ela, avisando que na próxima semana já há um novo feriado a atrapalhar o calendário reforma.
"A oposição não está preocupada com o País. Oposição parece jardim de infância. É um show de irresponsabilidade", gritou ela no momento em que a oposição ensaiava novo tumulto.