Pai do risco-país, do J.P. Morgan, recomenda títulos da dívida brasileira
Graham Stock. Grave bem este nome. Ele é o chefe do departamento de análises e estratégias do J.P. Morgan para a América Latina. O banco norte-americano é o responsável pelas avaliações de risco dos mercados emergentes, Brasil obviamente incluído nessa lista, para o bem ou para o mal. Nesta sexta-feira, por exemplo, o banco apontou […]
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h25.
Graham Stock. Grave bem este nome. Ele é o chefe do departamento de análises e estratégias do J.P. Morgan para a América Latina. O banco norte-americano é o responsável pelas avaliações de risco dos mercados emergentes, Brasil obviamente incluído nessa lista, para o bem ou para o mal.
Nesta sexta-feira, por exemplo, o banco apontou que o risco-país brasileiro está perto de 1.700 pontos, ficando atrás apenas da Argentina (6.062 pontos até o final da quinta-feira) e na frente até da Nigéria (1.584 pontos).
A pontuação do índice representa o prêmio pago pelos papéis de cada país sobre o rendimento dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos. No caso do Brasil, esse ágio é de quase 17 pontos percentuais.
Na semana passada, Stock concedeu entrevista à EXAME, em Nova York, antes de mais uma viagem ao Brasil. E foi categórico: "Recomendo aos meus clientes comprar os títulos da dívida brasileira neste momento".
Stock afirma que os spreads dos bônus brasileiros estão muito altos. "Acreditamos que o mercado está precificando para um risco maior com vistas ao futuro governo, que pode não honrar esses compromissos", afirmou.
O melhor momento recente para o mercado brasileiro verificou-se entre meados de março e a segunda semana de abril. Nesse período, o índice Bovespa andou na casa dos 14 000 pontos, o risco Brasil medido pelo spread do C-Bond variou em torno dos 700 pontos, o dólar girou perto de 2,30 reais. Antes em cerca de 7% acima dos bônus americanos, esse valor chega hoje a 17%.
O índice de risco-país para os mercados emergentes, chamado de EMBI+ criado pelo banco J.P. Morgan, é um referencial que traduz a percepção de risco dos investidores. E Stock é o homem atualmente que o ratifica. O indicador compara o risco-país dessas economias com os treasuries, considerados de risco zero. Quanto menor a diferença em relação aos treasuries, menor a percepção de risco.
O principal fator de preocupação, conforme o mercado e também na visão de Stock, é o processo eleitoral, visto como um fator de incertezas sobre o compromisso com a dívida.
Da parcela da dívida interna atrelada ao câmbio, 76,5 bilhões de reais vencem nos próximos 12 meses. Em cenários traçados internamente pela equipe econômica, esse montante também é considerado administrável, mesmo com o avanço do dólar.
Segundo os cálculos da equipe econômica, mesmo que no pior cenário o dólar chegasse a 3 reais, a parcela da dívida cambial de curto prazo seria elevada em aproximadamente 7 bilhões de reais, valor que "não fugiria ao controle" do governo. Leia a seguir a entrevista com Stock:
EXAME - O spread dos títulos brasileiros (C-Bond) não está injustamente alto?
Graham Stock - Os bônus brasileiros (C-bonds) estavam sendo negociados a 68. Isso traduz para uma rentabilidade de 17,5% que é 12,5% maior que os bônus do Tesouro americano. O mercado vê que há uma prossibilidade de o governo brasileiro continuar honrando seus compromissos externos. E acredita que há um risco significativo de o governo não honrar seus compromissos mesmo num curto prazo ou mesmo antes dos vencimentos dos bônus. É por isso que eles demandam os prêmios maiores. O mercado negocia os títulos da dívida brasileira (bônus) com a percepção de que o governo continuará a honrar ou não seus débitos. Eu acredito que os spreads dos bônus brasileiros estão muito altos. No momento, nós acreditamos que o mercado está precificando para um risco maior com vistas ao futuro governo, que pode não honrar esses compromissos. Por isso, estamos recomendando aos nossos clientes que comprem os títulos da dívida.
EXAME - Isso não significa que o governo brasileiro está sendo enganado pelo mercado?
Stock - O governo tem um volume significativo de dívida interna que precisa rolar, mas se isso significa que o mercado está demandando muito alto, então é preciso responder ajustando a política em um rumo que faz o mercado se sentir mais confortável mantendo o débito do governo a um prêmio mais baixo. No mercado externo, o governo está sob menos pressão para entrar no mercado várias vezes como quando o risco-país está alto. Então, não é preciso validar o spread alto observado nos mercados secundários.
EXAME - Mas a economia brasileira não está, em ambos os setores público e privado, sendo injustamente penalizada pelo mercado internacional?
Stock - Infelizmente, exatamente agora, os índices dos spreads brasileiros e a desvalorização do câmbio estão refletindo uma realidade muito importante: as eleições de outubro e as preocupações sobre o que poderá aconter com os resultados dessa eleição. Investidores dos dois lados, do Brasil e de fora, estão preocupados com a possibilidade de a nova equipe econômica que sairá da próxima eleição ser menos amigável ao mercado financeiro. É importante observar que a recente liquidação dos títulos da dívida e a recente fraqueza do real foram gerados por investidores brasileiros e não por estrangeiros. Os bancos brasileiros e os fundos mútuos foram os primeiros a vender os títulos da dívida brasileira e trazer dólares.
EXAME - Então Wall Street não é responsável por isso?
Stock - Eu não acho que há alguém para culpar. Eu só acho que a questão que leva ao destino. Mas, certamente, os investidores brasileiros parecem estar mais nervosos do que os estrangeiros sobre o futuro do Brasil.
EXAME - Wall Street realmente conhece a realidade brasileira? O risco-país é rigorosamente medido? E o J.P. Morgan? Quão grande e capacitado é a equipe de pesquisas de mercado brasileiro?
Stock - Nós temos um grande escritório em São Paulo e trabalhamos muito próximos deles em todos os aspectos de pesquisa do mercado brasileiro. Mas, novamente, eu volto ao ponto anterior: o julgamento de que os compromissos externos do Brasil podem não ser honrados não vêm só de Wall Street e dos investidores internacionais.
EXAME - Wall Street tem a visão exata sobre todos os aspectos da economia brasileira?
Stock - Eu acho que, como em qualquer mercado, algumas pessoas estão certas; e outras, erradas. Mas as pessoas que estão fazendo nossas análises sabem muito sobre a economia brasileira e fazem tudo possível para ter a visão mais exata.
EXAME - E o que você particularmente sabe sobre a economia brasileira?
Stock - Eu estudo essa área há sete anos como analista cobrindo a economia brasileira. Eu trabalho com uma equipe que tem ainda mais experiência e cobre o Brasil há muito mais tempo e tem inclusive analistas brasileiros. Eu acredito que nós temos informação e bagagem necessária para fazer as análises. Nós fazemos um bom trabalho, com quatro analistas em São Paulo e três em Nova York que são responsáveis pela economia brasileira, além de duas pessoas que gastam muito tempo em aspectos técnicos do mercado. Meu último trabalho foi na Unidade de Inteligência Econômica, em Londres. É uma empresa-irmã da revista The Economist. Lá, fui economista-sênior para a América Latina e tenho MBA em economia pela Universidade de Manchester, na Inglaterra, além da especialização da faculdade de Sheffield em economia e estudos hispânicos e latino-americanos.
EXAME - Você já esteve no Brasil?
Stock - Entre 25 e 30 vezes. Eu viajo ao Brasil entre cinco e seis vezes por ano (a entrevista foi concedida no último dia 17, véspera de mais uma visita de Stock ao Brasil).